Com esta reportagem, o HP dá continuidade à divulgação de uma série de documentos e depoimentos sobre o escândalo da venda de Embraer, empresa aeronáutica de alta tecnologia e campeã de vendas no mundo, à norte-americana Boeing.
SÉRGIO CRUZ
COM O QUE RESTARÁ, A EMBRAER S.A. NÃO CONSEGUIRÁ SOBREVIVER
Uma vez consumada, a venda da Embraer, isto resultará num retrocesso histórico na engenharia aeronáutica brasileira. A mesma engenharia que desenvolveu uma empresa altamente competente e que conseguiu alcançar o topo do comércio internacional de aeronaves.
Segundo o engenheiro e professor do ITA, especialista na área, Wagner Rocha, já entrevistado por nós, esse processo significará, “do ponto de vista tecnológico, que o Brasil vai retroceder à década de 1950”.
DESTRUIÇÃO DA EMBRAER
Os administradores da Embraer e o governo estão fazendo um grande esforço para passar a ideia que está ocorrendo uma parceria positiva para a Embraer e o país. O que está ocorrendo na verdade é o fatiamento da empresa aeronáutica brasileira para que as suas partes mais nobres e rentáveis sejam entregues livres para a norte-americana Boeing.
A negociata culminará com a entrega do setor de produção e comercialização de aeronaves comerciais e de toda a área de engenharia da companhia brasileira, à Boeing, através da criação de uma terceira empresa, a Newco, com sede nos EUA, que terá 80% de ações da Boeing e 20% da Embraer. Não haverá condições para o desenvolvimento no país de novas aeronaves.
“De fato estão sendo transferidos para a Boeing os recursos centrais de engenharia aeronáutica, aplicáveis a todos os produtos; a unidade EDE (Embraer Divisão Equipamentos) especializada em projeto e produção de trens de pouso, incluindo aqueles aplicáveis a aeronaves executivas e militares; a unidade de Évora onde são produzidos componentes de material composto de alta tecnologia, aplicáveis a aeronaves executivas”, denunciou Wagner Rocha, em depoimento na Audiência Pública, realizada pelo Supremo Tribunal Federal. (V. Venda da Embraer à Boeing é crime contra o Brasil, alerta engenheiro do ITA)
KC 390 SERÁ COMERCIALIZADO PELOS EUA
O setor de defesa, que recebeu verbas públicas, e que desenvolveu o moderno cargueiro KC 390, será simplesmente incorporado à Boeing numa joint venture com 51% de ações da Embraer e 49% da Boeing.
O que não se disse claramente é que após a conclusão do processo, a produção do avião KC 390 será concluída fora do Brasil e a aeronave passará a ser comercializada pelos Estados Unidos.
AFRONTA ÀS LEIS
A venda da Embraer vem sendo conduzida com manobras que afrontam a legislação brasileira. A cisão da Embraer e a incorporação da área comercial e da engenharia a uma empresa de capital fechado – de prateleira e com capital ínfimo – chamada Yaborã Indústria Aeronáutica, para depois incorporá-la à Newco, empresa criada para ter 80% das ações nas mãos da Boeing, é uma operação de burla à legislação das Sociedades Anônimas.
A ação judicial apresentada pela Associação Brasileira de Investimentos (Abradin), da qual publicamos alguns trechos nesta reportagem, revela a gravidade das manobras que estão sendo conduzidas pela direção da Embraer e pelo governo, que poderia ter impedido a transação e não o fez.
Segundo o presidente da entidade, Aurélio Valporto, que nos forneceu todo o material contendo detalhes da contestação feita pela entidade, “interesses inconfessáveis estão por trás desa transação”. “Esta ação judicial visa paralisar o processo criminoso de venda da Embraer”, destacou. (v. Venda da Embraer atende a interesses incofessáveis)
Diz a peça inicial:
“Os fatos aqui descritos e os documentos que acompanham esta inicial, além das várias notícias veiculadas pela mídia, não deixam dúvidas de que, por meio da operação em discussão, disfarçadamente denominada ora de parceria estratégia e ora de joint venture, está ocorrendo, na realidade:
(i) uma cisão parcial da Embraer S/A por meio da segregação de sua aviação comercial em outra sociedade (abstratamente denominada Newco no memorando entabulado);
(ii) aquisição de controle na Newco, que conterá a aviação comercial da Embraer S/A, em sua integralidade, por empresa estrangeira (The Boeing Co);
(iii) infringência à obrigatoriedade de realização de uma OPA (Oferta Pública de Ações) por aquisição de participação substancial”.
EMBRAER EM ASCENSÃO E A BOEING EM CRISE
O olho grande da Boeing e do governo Trump sobre a Embraer, ao contrário do que disseram os administradores da empresa, é resultado do sucesso obtido pela empresa brasileira no mercado internacional e da crise vivida pela empresa norte-americana.
A Embraer estava vendendo mais os seus aviões do que a Boeing
A apresentação do negócio como uma parceria estratégica é mentirosa. O que vai haver, se o processo não for interrompido, é o fatiamento e a aquisição da fatia rentável da Embraer pela Boeing. Nas categorias de aeronaves até 150 lugares (setor em franca expansão), a Boeing vem tendo muitas dificuldades no mercado internacional, enquanto a Embraer vem ampliando significativamente as suas vendas.
NÃO É JOINT VENTURE. É CISÃO
Esta é o primeira farsa na transação envolvendo Embraer e Boeing.
A apresentação do negócio como sendo uma joint ventute quando na verdade não passa de uma cisão e venda da parte lucrativa da Embraer.
Vamos aos fatos:
“(…) Em 05 de julho de 2018, a Embraer S/A divulgou ao mercado, por meio de fato relevante, que o seu Conselho de Administração, em reunião virtual, havia autorizado a assinatura de um Memorando de Entendimento entre EMBRAER S.A. e THE BOEING CO, (empresa de aviação norte americana), visando a uma parceria estratégica entre as empresas.
Eles apresentaram a decisão aprovada pelo Conselho de Administração da empresa de 5 de julho de 2018 como uma parceria estratégica da Embraer com a Boeing.
Esta mentira veio para confundir integrantes da Aeronáutica
Mais adiante, em 17 de dezembro de 2018, às vésperas de Natal, ocorre nova reunião do Conselho, no apagar das luzes do governo Temer e início do governo Bolsonaro, e é apresentado, através de outro fato relevante, uma nova versão da “parceria”.
A BOEING ASSUMIRÁ A OPERAÇÃO COMERCIAL DA EMBRAER
“Em continuação ao processo iniciado pelas empresas, na manhã do dia 17/12/18, fora publicado outro fato relevante pela Embraer S/A, informando que o Conselho de Administração da Companhia, em outra reunião virtual decidiu pela:
(…) a parceria estratégica entre a Embraer e The Boeing Co. (“Boeing”), que compreende:
(a) a segregação e transferência, pela Embraer, dos ativos, passivos, bens, direitos e obrigações referentes à unidade de negócio de aviação comercial para uma companhia fechada brasileira, a qual passará a desenvolver os negócios e serviços de aviação comercial, atualmente desenvolvidos pela Embraer”.
Haveria então uma cisão da Embraer. Com partes da empresa sendo transferidas para uma companhia fechada e depois essa companhia fechada (e de fachada) faria a “parceria estratégica” com a Boeing, com o objetivo de criar a NewCo, empresa que terá 80% da Boeing e 20% da Embraer. A brasileira parte poderá vender sua parte para a Boeing a qualquer momento.
Sendo que o representante da Embraer no Conselho de Administração da nova empresa (NewCo) será apenas um observador, sem direito a voto. Não haverá, portanto, nenhum ganho para a Embraer. Sua parte mais lucrativa -setor de produção de aeronaves comerciais – passará a pertencer à Boeing
Note-se que a aviação comercial da Embraer, que é responsável por mais de 70% do faturamento da empresa, será totalmente transferida para a empresa americana.
TODA A ÁREA DE PRODUÇÃO SERÁ ABSORVIDA PELA EMPRESA AMERICANA
GOLDEN SHARE
Uma cisão parcial como esta não pode ser decidida sem o aval do governo.
Pelo estatuto da Embraer, a União, detentora de ação de classe especial (golden share), tem 30 dias para se manifestar, depois de provocada para tal, sendo a manifestação binária: a União veta ou não veta o que lhe é apresentado.
Sabedor disso, o Conselho de Administração da Embraer adiou ao máximo a consulta e deixou para provocar a manifestação governamental apenas em 17 de dezembro de 2018, ou seja, deixou para o governo Temer o prazo exíguo de 13 dias e, para o governo Bolsonaro, mal empossado, apenas 16 dias para avaliação e decisão sobre assunto tão complexo.
A decisão do governo de não interferir na cisão da Embraer e na sua criminosa venda para a americana Boeing, apesar de ter direito e a obrigação de fazê-lo, foi tomada diretamente por Paulo Guedes, que, por coincidência tem ligações com o vice-presidente do Conselho de Administração da Embraer.
Sérgio Eraldo de Salles Pinto, vice-presidente do conselho de administração da fabricante de jatos brasileira trabalhou em diversas empresas do grupo Bozano desde 1988, chegando a ocupar os cargos de diretor-presidente e diretor-executivo.
A companhia de investimento teve como um dos sócios fundadores Paulo Guedes, que saiu do negócio para assumir o cargo de ministro no governo Jair Bolsonaro.
JUSTIÇA IDENTIFICA A FARSA
Os fatos revelaram que, diferente do que foi apresentado nos documentos iniciais, não está sendo criada uma parceria, uma joint venture, o que ocorre é uma cisão parcial da Embraer S/A.
Esta condição de cisão da Embraer, e não a formação de uma joint venture, foi reconhecida pelo Poder Judiciário, como se pode observar no trecho abaixo da petição.
“A decisão proferida pelo Des Fausto De Sanctis, em 22/12/18 , nos autos no agravo interposto pela União, decisão que produziu efeitos, vige e não colidiu com a proferida pela Presidente do mesmo Tribunal Federal consigna que:
(i) resta clara a ocorrência de cisão parcial da Cia, devendo o negócio, portanto, ser tratado sob este parâmetro;
(ii) há várias autoridades públicas intervenientes além do Governo Federal, entre elas a CVM, ora requerida, devendo a questão ser apreciada por todas elas e não somente tendo como base os interesses econômicos, mas também sob o que se traduz na visão moderna da função social da sociedade”.
“Todavia, como não cabe ao Poder Judiciário substituir a Administração Pública na deliberação da conveniência e da oportunidade a menos que haja ilegalidade ou violação do interesse público, notadamente no presente recurso, devem as autoridades públicas intervenientes (Governo Federal, Comissão de Valores Mobiliários – CVM e Órgãos de Controle) apreciar a questão tendo como base não somente nos interesses econômicos (representados pela eventual indispensabilidade para a sobrevivência da EMBRAER, o que justificaria a entabulação do negócio excogitado), mas também os fins sociais precípuos (manutenção do desenvolvimento da indústria de ponta brasileira por meio de empresa símbolo do orgulho nacional)”.
“Tanto quanto à Administração Pública, as corporações se converteram em atividades com missão histórica e por isso devem conduzir seus negócios nos valores universais para manterem suas posições. Os reguladores, por sua vez, devem encorajá-los para que, criticamente, auto avaliem e conduzam seus negócios no interesse de todos. O risco do negócio, hoje, não é mais o risco econômico, mas também o risco de responsabilidades normativas e sociais. Isto implica num atuar segundo as margens socialmente toleradas para preservação do desenvolvimento econômico e social da comunidade.”
AUTORIDADES ENGANADAS
O judiciário reconhece que as operações perpetradas pelas Cias se traduzem, inexoravelmente, em cisão parcial da Embraer S/A, conforme citado anteriormente.
A dinâmica comercial proposta, contida no Memorando de Entendimento assinado pelas partes em 05/07/18, descrita no fato relevante publicado em dez/18, endossada pelo fato relevante do dia 11/01/19 e pelo documento publicado no dia 16/01/19, propõe a criação de uma nova empresa e constituição uma segunda joint venture, entre outras deliberações, nos seguintes termos:
a) Uma empresa para a área de aviação comercial (filão do mercado), da qual a Boeing estadunidense terá uma participação de 80% (controle operacional e gestão da nova empresa) do capital e a Embraer 20%;
b) Uma Joint Venture para promoção comercial, para promoção e desenvolvimento de produtos e serviços na área de defesa.
“Analisando detidamente o Memorando de Entendimento, bem como as demais informações publicadas pelas Cias envolvidas por meio dos fatos relevantes, pode-se verificar que, sob o manto do que a diretoria e os conselheiros da Embraer chamam de “parceria estratégica e joint venture” descortinam-se atos e negócios jurídicos que têm o condão de lesar os investidores da Embraer S/A, bem como a própria Cia, o que já está sendo confirmado pelo mercado em geral, diante da vertiginosa queda das ações da Cia na bolsa de valores e pela perspectiva de rebaixamento do rating da Embraer S/A, anunciado pelas empresas de classificação de risco Fitch e Standard & Poor’s”.
Documento da Aeronáutica revela a importância da Embraer para o país e para os militares. “Mostra-se claro que a EMBRAER não é, para o Brasil, somente uma indústria aeronáutica, mas sim uma empresa que representa, no século do conhecimento, a oportunidade e a possibilidade de desenvolver soluções tecnológicas inovadoras, não somente na área de aviação, mas também em outras áreas de atuação”, diz o texto do militares.
“PARCERIA” EM QUE SÓ A BOEING GANHA
“Ora, em uma parceria, todos ganham, mas nessa, ao que parece, somente a Boeing ganha. É, portanto, estranha a defesa que diretores e conselheiros da Embraer insistem fazer desta “joint venture”, nos moldes que estão apresentados aos investidores”.
“A questão pontual não é questionar a aliança estratégica entre as companhias, que alegam ter sido precipitada pela recente aproximação entre Bombardier e Airbus. Infelizmente, isto pode ser apenas uma desculpa para o momento, uma vez que as investidas da Boeing sobre a Embraer tiveram início em datas anteriores.
Basta lembrar que já existem joint ventures e parcerias entre Embraer e Boeing com o fim de potencializar a comercialização do KC 390, parcerias formalizada em 2012, 2013 e 2016.
Há, claramente, uma sinergia positiva entre ambas as empresas, duas das três maiores fabricantes de aeronaves do planeta, e, portanto, uma “parceria estratégica” (e não a operação em curso) parece a todos benéfica.
Esta parceria poderia mirar, por exemplo, a cadeia logística de fornecedores, a de manutenção e mesmo acordos na área de projetos visando, por exemplo, aumentar a comunalidade entre as aeronaves produzidas pela Boeing e Embraer, bem como a troca de tecnologias.
O fundamento da presente ação, portanto, é o fato de o Memorando assinado em 05/07/18 e os anúncios dos dias 17/12/18, 11/01/19 e 16/01/19, verdadeiramente confirmarem a ocorrência de CISÃO PARCIAL da Cia, por meio da segregação de todos os negócios, bens, direitos e atividades correlatas da aviação comercial, que respondem pela maior parte da receita da Companhia, valendo-se da denominação de Parceria Estratégica e Joint Venture.
Trata-se, portanto, de um disfarce para encobrir as reais intenções do negócio, que chega a alcançar, inclusive, situação de aquisição de controle da Embraer S/A por empresa estrangeira, aviltando, com isto, duas prerrogativas contidas no Estatuto da Cia: a) imposição de pulverização das ações e ausência de controlador e b) restrição da ingerência nos negócios da Embraer S/a de acionista estrangeiro.
Não há nenhuma justificativa para que uma proposta tão lesiva aos interesses da empresa, dos funcionários, aos interesses da Aeronáutica, dos acionistas, da engenharia nacional, da economia do país, enfim, uma proposta tão contrária ao Brasil, seja condizida impunemente.
Setores entreguistas, ligados ao ministro Paulo Guedes, conhecido trapaceiro do submundo dos negócios, estão ganhando muito dinheiro com essas tenebrosas transações e prometendo US$ 1,6 bilhão de dividendos aos acionistas desavisados que apoiarem a transação. Mais detalhes sobre essas negociatas anti-Brasil estarão disponíveis nas reportagens seguintes. (Continua)
O Bolsonaro no dia 31.07.2019, disse está imensamente apaixanado pelo Donalt Trump, portanto, muito cuidado com essa paixão desmedida, exacerbada por alguém e dê apenas o que é seu ou de seus famíliares o que é do povo brasileiro não lhe pertence, você age como um jagunço e não como presidetne, mas com a cara de pau que você tem constantemente repete que o governo mudou porém pra pior em todos os aspectos.
Acho tudo o que vcs publicam muito legal , mas observem mais a ortografia.
Estamos de pleno acordo. O cuidado com a língua nacional faz parte do amor à Nação. Por isso é que os bolsonaristas escrevem como trogloditas (que, aliás, eram analfabetos). Às vezes (mais frequentemente do que gostaríamos de admitir), nossos redatores são descuidados em relação a isso. Estamos, no momento, em meio a um processo autocrítico sobre essa questão. Agora, leitor, se encontrar erros ortográficos, pode apontá-los, que nós agradecemos. Não que seja sua obrigação, pois é nossa – e não vossa.
Mas a pergunta certa é, como a boing teve acesso a essas informações