O espanhol Luis Novoa, dono da Enviawhatsapps, admitiu que sua empresa foi contratada por empresários brasileiros para fazer disparos em massa, via WhatsApp, de mensagens políticas pró-Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018.
A Enviawhatsapps é uma agência de marketing da Espanha. Ela é especializada em envios automáticos de mensagens para milhares de números de telefone.
O envio de mensagens em massa por empresários e empresas em campanha eleitorais é ilegal no Brasil. Configura doação de empresas para campanha eleitoral. Doações não declaradas de pessoas físicas também são ilegais.
A revelação do espanhol está em áudios obtidos pelo jornal Folha de S. Paulo. Nos áudios, Novoa diz que “empresas, açougues, lavadoras de carros e fábricas” brasileiros compraram seu software para mandar mensagens em massa a favor de Bolsonaro. O jornal confirmou depois os detalhes da conversa.
A gravação foi feita em um encontro de empresários com Novoa, na Espanha. As informações citadas na gravação foram confirmadas.
“Eles contratavam o software pelo nosso site, fazíamos a instalação e pronto […] Como eram empresas, achamos normal, temos muitas empresas [que fazem marketing comercial por WhatsApp]”, diz o espanhol, na gravação.
“Mas aí começaram a cortar nossas linhas, fomos olhar e nos demos conta de que todas essas contratações, 80%, 90%, estavam fazendo campanha política”, completa o empresário espanhol. “Estávamos tendo muitíssimos cortes, fomos olhar os IPs, era tudo do Brasil, olhamos as campanhas, eram campanhas brasileiras”, informa Novoa, ainda no áudio.
Na mesma gravação, outra pessoa pergunta para ele: “Era campanha para algum partido”? Novoa responde: “Eram campanhas para Bolsonaro”.
Ao saber que tinha sido gravado, Novoa, evidentemente, negou que tenha sido contratado por empresas brasileiras para fazer o disparo em massa a favor de Bolsonaro. “Tanto faz se gravaram sem permissão uma conversa informal. Repito pela enésima vez: não trabalhamos com campanhas políticas no Brasil”, disse o espanhol.
Conforme o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), apenas as campanhas oficiais podem fazer contratação de impulsionamento de conteúdo eleitoral nas redes sociais. “A contratação do serviço de impulsionamento deve ser realizada exclusivamente por partidos, coligações, candidatos ou seus representantes e diretamente por meio da ferramenta responsável pelo serviço, cujo provedor deve ter sede e foro no Brasil, ou com filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecido no país”, segundo lei de outubro de 2017.
Além disso, está proibido o uso de ferramentas de automatização, como os softwares de disparo em massa. A contratação de empresas estrangeiras (como a Enviawhatsapps ) para enviar mensagens de WhatsApp evidencia a ilegalidade, com o objetivo de dificultar a contabilização pela Justiça Eleitoral dos gastos de campanhas realizados por terceiros em favor de candidatos.
As empresas brasileiras compraram cerca de 40 licenças de software na agência espanhola. Cada linha pode disparar até 500 mensagens por hora — portanto, o pacote permitiu até 20 mil disparos políticos por hora nas últimas eleições. Alguns usavam números da Colômbia para enviar mensagens a números do Brasil, também por meio do software comprado de Novoa.
Os pagamentos foram realizados pela plataforma PayPal. As contas ficaram ativas durante alguns dias durante a campanha. Os brasileiros contratavam o software por meio dos seis diferentes websites que pertencem à empresa.
A assessoria de imprensa do Palácio do Planalto não quis comentar o assunto.
Em outubro foi revelado que empresários impulsionaram disparos em massa por WhatsApp na campanha eleitoral a favor de Bolsonaro. O serviço foi vendido pelas agências Quickmobile, CrocServices e Yacows. Uma ação foi aberta no TSE para apurar o caso. O PT também fez disparos em massa. A agência responsável pela campanha de Bolsonaro teve registros de uso do sistema da Yacows apagados após a reportagem da Folha.
Em novembro de 2018, o Twitter e o Facebook informaram oficialmente ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que a campanha de Jair Bolsonaro não pagou pelos impulsionamentos de mensagens durante a disputa eleitoral. Isso deixou claro que os disparos em massa de mensagens foram bancadas por empresas privadas em apoio ao candidato do PSL, configurando caixa 2. Uma das empresas privadas foi a Havan, de Luciano Hang, bolsonarista declarado.
Em dezembro, um ex-funcionário relatou em detalhes como funcionou um esquema nas últimas eleições, apresentando fotos e documentos à Justiça do Trabalho. Uma rede de empresas recorreu ao uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e garantir o envio em massa de mensagens em benefício de políticos.
Por sua vez, em março, o TSE multou a campanha de Fernando Haddad (PT) por ter impulsionando um site com ataques a Bolsonaro no mecanismo de busca do Google. Na decisão, o ministro Edson Fachin considerou que o impulsionamento feriu a lei eleitoral e causou desequilíbrio na disputa.
A ação no TSE que apura os disparos pró-Bolsonaro na eleição de 2018 não tem evoluído, até agora ninguém foi ouvido sobre o assunto. O processo é relatado pelo corregedor-geral eleitoral, ministro Jorge Mussi.
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