“A gente sustentou por 28 anos esse monstro como político? Eu fiz passeata, fiz campanha, e hoje me envergonho disso”, diz Wagner Coelho, revoltado com a reforma da Previdência dos militares
O suboficial da reserva da Marinha, Wagner Coelho, organizador da manifestação que chamou Jair Bolsonaro de “traidor”, disse que já fez “passeata e campanha” a favor de Bolsonaro “e hoje me envergonho disso. Fomos traídos”.
A manifestação era contra a reforma da Previdência dos militares (lei 13.954/19), que melhorou a situação dos postos mais altos a despeito dos militares de baixa patente.
“A gente começa a observar isso aí, juntando com a traição que ele fez com a gente, começamos a pensar: esse cara era aquilo que a gente pensava mesmo? A gente sustentou por 28 anos esse monstro como político? Eu fiz passeata, fiz campanha, e hoje me envergonho disso. Fomos traídos”, relatou.
Na quinta-feira (10), Wagner reuniu cerca de 30 pessoas, entre pensionistas e militares da reserva, para se manifestar do lado de fora do Centro de Instrução Almirante Alexandrino, onde Jair Bolsonaro participava de uma formatura.
“Existem pensionistas que não têm dinheiro para comprar remédio e temos que fazer campanhas para o pessoal abastecer as geladeiras. Principalmente o pessoal de escalões inferiores”, disse Coelho em entrevista para a coluna de Chico Alves, do UOL.
Segundo ele, o governo fez a propaganda de que a reforma seria boa para eles, mas não foi. “O topo da pirâmide, que são os generais, foi beneficiado. O pessoal da parte de baixo, os cabos, os soldados e sargentos, vai ter decréscimo nos salários. Isso atinge os salários do pessoal da reserva e da ativa”, afirmou.
“Eles [o governo] vieram com uma conversa de reestruturação de carreira. Deveriam acertar os quadros de acesso, as promoções dos praças, já que a carreira dos oficiais flui tranquilamente”.
“Mas eles mexeram com os adicionais, botaram percentual para quem tem curso de altos estudos acima de 70%. Quem não tem esse curso, que é a grande maioria dos graduados, fica com 15%, 20%. Tentaram consertar, mas reservaram vagas para uma pequena parte da tropa. Isso não resolve”, contou.
“O Brasil está atravessando uma fase muito difícil com relação à economia e temos a pandemia, o povo passando necessidade. Eu disse para os deputados governistas: se não poderia dar melhorias para todos, que não dessem para ninguém. Nem para os generais e nem para os praças”, assinalou.
“Dizem que estou chateado com Bolsonaro porque não deu aumento. Não. Isso ajudou a alertar algumas pessoas em relação ao que está acontecendo”, expressou.
Wagner também está organizando uma manifestação em Brasília para os dias 20, 21 e 22. “A mobilização está indo muito bem”, contou.
PERSEGUIÇÃO
Wagner Coelho disse que os militares, tanto da ativa quanto da reserva, estão sendo perseguidos por denunciar a falcatrua de Bolsonaro.
“Estão fazendo sindicâncias, indiciando militares. Eu mesmo fui indiciado em março. Eles chamam para abrir sindicâncias, Inquérito Policial Militar, mas o pessoal está se lixando para isso. Não está dando em nada”, relatou o militar.
“O pessoal da ativa é cerceado na caserna. De acordo com nosso estatuto, o militar da ativa não pode falar. Nós da reserva temos liberdade de expressão. Mas até isso estão tentando tirar”, continuou.
“Na verdade, os militares da ativa não podem falar nem contra e nem a favor. Mas quando o Ministério da Defesa fez propaganda do PL 1645, que depois virou essa lei, botaram militares da ativa para fazer propaganda. Tinha major, sargento, cabo. Quando é do interesse deles, o pessoal da ativa pode falar, quando não é do interesse deles, não pode”.
O organizador da manifestação disse que eles deixaram para divulgar que estariam na porta do Centro de Instrução para o próprio dia “porque nós estamos sendo monitorados. Estão tentando fazer de tudo para que a gente pare de reivindicar”.
“Tenho sido taxado por colegas como comunista, como esquerdista. Não é nada disso”.
APOIO E TRAIÇÃO
Wagner Coelho disse que Bolsonaro, em seus 28 anos no Congresso Nacional, era apoiado pelos militares de baixa patente, mas rejeitado pelos de cargo mais alto.
“Fora da caserna a impressão é de que nos quartéis o apoio a Bolsonaro é maciço. Não é. Nós sempre sustentamos a base do presidente Bolsonaro. Se ele chegou onde chegou agradeça aos graduados e praças. Nós correspondemos a 82% da tropa. Pelos oficiais generais, ele não entrava nos quartéis. Era proibido, tinha que ficar na porta”.
“No Distrito Naval, tinha que panfletar lá fora, nas campanhas para vereador e deputado. Agora, estamos decepcionados. Os militares da ativa se comunicam conosco e dizem que há reuniões periódicas para botar na cabeça deles que está tudo bem, porque se disserem o contrário, serão punidos”, informou.