“Eu vetarei”, diz Lula sobre o PL da Impunidade

Quem cometeu crime contra a democracia tem que pagar, disse o presidente (Foto: Ricardo Stuckert - PR)

Congresso ficará com a batata quente para fazer valer a lei da impunidade. Presidente, ao negar qualquer acordo com a oposição em torno da matéria, assegurou que vetará o projeto também conhecido como “da bandidagem”, aquele que resolveu aliviar as penas dos golpistas do 8 de janeiro, entre os quais Bolsonaro

Em entrevista coletiva concedida hoje(18), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assegurou que vai vetar o projeto de lei que alivia a pena dos condenados pela trama golpista, conhecido popularmente como “PL da blindagem” ou “da bandidagem”, ou, ainda, “da impunidade”.

Trata-se do Projeto de Lei aprovado nas duas casas do Congresso Nacional, cuja aprovação ontem (17) pela maioria dos senadores, resultará, agora, no encaminhamento para sanção do presidente da República, o que não acontecerá, segundo Lula.

Isso significa que o Congresso Nacional, pela sua maioria, pressionada pelo bolsonarismo, terá que pagar o ônus da derrubada do veto presidencial, com o objetivo de impor ao país uma lei que alivia os crimes contra a democracia e o estado democrático de direito praticados pelos golpistas de 8 de janeiro, muitos dos quais já condenados, entre os quais o chefe deles, Jair Bolsonaro, ex-ministros e integrantes do alto escalão do desgoverno passado.

Veja a entrevista na íntegra aqui:

“As pessoas que cometeram crime contra a democracia brasileira terão que pagar pelos atos cometidos contra esse país. Nem terminou o julgamento, ainda tem gente sendo condenada, e o pessoal já resolve diminuir as penas. Eu quero dizer para vocês que, com todo o respeito que eu tenho ao Congresso Nacional, a hora que chegar na minha mesa, eu vetarei. Isso não é segredo para ninguém”, afirmou Lula.

“O Congresso tem o direito de fazer as coisas, eu tenho o meu direito de vetar, depois eles têm o direito de derrubar o meu veto ou não. É assim que é o jogo”, acrescentou.

Lula já vinha indicando que iria vetar trechos que beneficiem Jair Bolsonaro (PL). O presidente tem dito que considera inadmissível que haja redução da pena por meio de um “tapetão” no Congresso.

NEGATIVA DE QUALQUER ACORDO COM A OPOSIÇÃO

O presidente negou, ainda, que tenha havido um acordo da base governista com a oposição para a aprovação do PL. Durante a votação no plenário do Senado, o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), disse não se arrepender de ter feito um acordo para votação. A articulação feita por Jaques tinha o objetivo de viabilizar a aprovação de texto que reduzia benefícios fiscais federais e aumentava a tributação de bets e fintechs.

“Se houve acordo com o governo, eu não fui informado. Então, se eu não fui informado, não houve acordo. Nem terminou o julgamento ainda, tem gente sendo condenado e o pessoal já resolve diminuir as penas”, disse Lula.

Presidente durante a entrevista nesta quinta-feira (18) (Foto: Ricardos Stuckert – PR)

Lula também argumentou que é preciso “terminar esse processo” e investigar também os financiadores dos atos golpistas.

“Nós precisamos levar muito a sério o que aconteceu no dia 8 de janeiro de 2023 e tem gente que quer que a gente esqueça, mas a gente não pode esquecer. Porque se a democracia esquecer da importância que ela tem para uma nação, a gente termina perdendo o jogo”, afirmou.

No texto aprovado pelos senadores, diante do alerta feito por juristas e especialistas em direito penal, foi feita uma mudança para que outros criminosos, como, por exemplo, os integrantes de facções do crime organizado, não fossem também beneficiados pela mudança na lei, conforme o que foi votado na Câmara dos Deputados, mas os que atentaram contra a democracia, vandalizaram as sedes dos 3 poderes republicanos, planejaram a morte e a prisão de altas autoridades da República, entre outras barbaridades, serão beneficiados no texto que vai à sanção presidencial.

PL DA DOSIMETRIA, TAMBÉM CONHECIDO COMO “DA BLINDAGEM”

O PL da Dosimetria determina que os crimes de tentativa contra o Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado, quando praticados no mesmo contexto, implica no uso da pena mais grave em vez da soma de ambas as penas.

O foco do projeto é uma mudança no cálculo das penas, “calibrando a pena mínima e a pena máxima de cada tipo penal, bem como a forma geral de cálculo das penas, reduzindo também o tempo para progressão do regime de prisão fechado para semiaberto ou aberto”.

As mudanças poderão beneficiar réus como Jair Bolsonaro, além dos militares Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil; e Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

PARTIDOS VÃO AO SUPREMO. PL TERIA QUE RETORNAR À CD

Nesta quinta-feira, quatro bancadas do PT, PSB, PCdoB e PSOL da Câmara dos Deputados impetraram mandado de segurança junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da tramitação do projeto.

Além disso, o professor e jurista Gustavo Sampaio, da Universidade Federal Fluminense, em entrevista ao UOL, afirmou que há um casuísmo e erro processual na tramitação do projeto no Senado Federal.

Segundo ele, a proposta, ao restringir mudanças para condenados pelos atos de 8 de janeiro, fere princípios constitucionais e pode ser questionada no STF.

O texto aprovado altera regras para progressão de regime em crimes contra o Estado Democrático de Direito, mas, segundo Sampaio, direciona a legislação para um grupo específico, desrespeitando o princípio da generalidade das leis. Ele criticou ainda o tratamento dado às emendas durante a tramitação no Senado.

“É um pleno casuísmo e equivocado em todo sentido. Isso pode gerar uma ação direta de inconstitucionalidade. Até achei graça no discurso do senador Espiridião Amin. Ele é um excelente orador, um homem loquaz e preparado, e fazia um esforço imenso para justificar que a emenda era de redação”, argumentou.

E continuou: “eu posso chamar um elefante de cabrito, mas não por isso o elefante se torna um cabrito. Se ele quer chamar emenda de redação, que o faça quando de fato se trata de correção textual. As emendas de redação se destinam a corrigir meros equívocos que não interferem em absoluto no mérito”.

Sampaio explicou que até pequenas mudanças, como inserir uma crase, podem alterar o sentido de uma lei e não podem ser tratadas apenas como ajustes de redação. Para ele, ao alterar o mérito do texto, o projeto deveria ter voltado para a Câmara dos Deputados.

“Colocar uma crase pode ser uma mera emenda de redação? Pode não ser. Se ela mudar o sentido da oração, não é mais uma emenda de redação, mas sim de mérito. E aqui no caso não há a mais remota dúvida”, sustentou.

Sampaio acrescentou ainda que, “quando a Câmara aprovou o PL, teve o cuidado de excluir crimes hediondos, mas simplesmente se esqueceu de fazer outras exclusões. O legislador legisla genérica e abstratamente. Ele não deve legislar em concreto, salvo em casos excepcionais.

O jurista detalhou que a inconstitucionalidade pode ser formal, relacionada ao procedimento, ou material, quando o texto viola princípios constitucionais. No caso do PL da Dosimetria, ele vê uma clara inconstitucionalidade formal, pois o projeto não respeitou o devido processo legislativo ao alterar o mérito sem retorno à Câmara… –

“Se o Senado realmente entende que esses outros crimes esquecidos tinham que ser inseridos no projeto para não se permitir a progressão de regime, evidentemente teria que ter voltado para a Câmara”, concluiu.

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