O secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, esclareceu em coletiva que “nunca pensou em demissão” e reafirmou apoio a Trump, que por sua vez, lhe declarou “total confiança”. Sobre ter chamado Trump de “imbecil”, não confirmou nem negou. Muito pelo contrário.
“Nunca passou pela minha cabeça renunciar”, asseverou o secretário de Estado norte-americano, Rex Tillerson, em entrevista coletiva na quarta-feira (4) convocada após ter-se tornado público, pela rede de TV NBC News, de que, numa reunião em 20 julho, ele teria chamado o presidente Donald Trump de “imbecil” [“moron”] durante uma reunião no Pentágono com assessores de segurança nacional. Perguntado diretamente se havia chamado Trump de “imbecil”, o ex-executivo-chefe da Exxon não confirmou nem negou, limitando-se a dizer que “não iria lidar com coisas insignificantes como essa”.
Pensando bem, não deixa de fazer sentido chamar o imbecil Trump de imbecil, provavelmente depois de alguma tuitada desvairada, mas quanto a ser “insignificante” … Conforme a Reuters, “quando ficou a impressão de que era verdade” [ter chamado de imbecil], uma porta-voz do Departamento de Estado “apareceu horas depois diante dos repórteres para negar”, dizendo que Tillerson “não disse isso”.
Após o sonoro “imbecil” ter repercutido no mundo inteiro, e com Trump se apressando a dizer tratar-se de outra “fake news” e que a NBC era “pior que a CNN”, o New York Times descreveu a situação como “outro dia, outro embaraçoso circo de política externa na capital do país”.
O extenso relato da NBC News assevera que Tillerson esteve prestes a se demitir no verão passado e cita outros episódios desgastantes. Também diz que coube ao vice-presidente Mike Pence cumprir o papel da turma do deixa-disso, procurando mediar a situação.
Talvez a notícia não tivesse toda a repercussão que alcançou se o bilionário presidente, após Tillerson anunciar desde Pequim na sexta-feira, aonde fora negociar com o governo chinês, a existência de “três canais” de contato exploratório com Pyongyang, não o admoestasse em público “para não perder seu tempo” com negociações diplomáticas com o “rocket man” e acrescentando a ameaça “não desperdice sua energia, faremos o que tem que ser feito”.
Na entrevista, Tillerson afirmou que o vice Pense jamais o persuadira a permanecer como secretário de Estado “porque nunca considerei deixar este cargo”. Mas de acordo com os relatos, “várias pessoas próximas de Tillerson disseram que ele teve de ser dissuadido de redigir uma carta de demissão em mais de uma ocasião pelos seus aliados mais próximos, o secretário de Defesa Jim Mattis e o chefe de gabinete da Casa Branca John Kelly”. Segundo outra fonte, “imploraram a ele para ficar”.
Ainda na entrevista, quanto à polêmica acerca do termo “imbecil”, Tillerson considerou ser parte de um “esforço para dividir o país” e que não queria ser parte “deste esforço para dividir o governo”. Depois, em uma declaração na Casa Branca, asseverou que Trump “é inteligente, exige resultados, e ama o nosso país”.
Disse ainda que foi nomeado por Trump “e estou aqui enquanto o presidente sentir que posso ser útil para alcançar seus objetivos”. Pelo seu lado, Trump voltou à tese da “fake news”, da “história mentirosa”, jurando ter “total confiança em Rex”. “Categoricamente falsa”, manifestou-se o gabinete do vice Pence sobre sua suposta mediação.
Mas o que a Reuters descreve são corredores quase desertos do Departamento de Estado, com os diplomatas em volta de televisores querendo saber se Tillerson se juntaria ao já numeroso rol dos demitidos do governo Trump, que não cessa de aumentar, e cuja última baixa havia sido o secretário de Saúde Tom Price. Havia, ainda rumores de que ele poderia ser substituído pela espalha-brasas de Trump na ONU, Nikki Haley. Também não faltam ao registro da NBC News detalhes das desavenças entre Trump e Tillerson, a quem o presidente dos EUA costuma chamar nas reuniões, conforme testemunhas, de “Mr. Exxon”.
Um dos maiores choques entre os dois, de acordo com as agências de notícias, foi quando Mr. Exxon, aliás, o secretário de Estado Tillerson, buscou “mediar a disputa entre o Qatar e seus vizinhos do Golfo”. “O secretário havia dito aos parceiros que os relacionamentos que criara durante décadas no negócio [do petróleo] o tornavam excepcionalmente qualificado para negociar um acordo”.
Após Tillerson ter pedido um “diálogo calmo e reflexivo”, menos de uma hora depois Trump atacou o Qatar como financiador do terrorismo, jogando lenha na fogueira acendida por Riad – o que o secretário de Estado atribuiu à interferência do genro – e conhecido sionista – Jared Kushner.
RE-CERTIFICAÇÃO DO IRÃ
Também não deve ser mera coincidência que o auge das tensões de Trump com Tillerson ocorra a poucos dias da data limite da re-certificação do acordo nuclear com o Irã (que ocorre a cada três meses por determinação do Congresso dos EUA), que é o dia 15 de outubro. Como se sabe, o Irã é um país conhecido, não por suas ‘plantações de brócolis’, mas pelas torres de petróleo. Trump tem insistido em ameaçar romper o acordo, que diz ser “um dos piores” já feitos pelos EUA, enquanto Tillerson vem se manifestando favorável à sua continuação, conforme o cumprimento do acordo pelo Irã vem sendo atestado pela Agência Internacional de energia Atômica (AIEA) e pelos demais signatários, França, Alemanha, Inglaterra e Rússia. Segundo a NBC, foi Tillerson que em julho “empurrou Trump” para certificar o Irã.
A NBC também assevera que, em junho, quando Trump se excedeu no encontro anual de Escoteiros da América – instituição que Tillerson presidiu -, em discurso considerado atípico para esse tipo de evento, o secretário de Estado foi para o casamento do filho no Texas e quase não volta. Idiossincrasias à parte, assim como a chicana de que “Putin interferiu nas eleições nos EUA para eleger Putin” e o clima histérico decorrente nos EUA em última instância refletem a disputa interna nos altos círculos do império, sobre quem é o inimigo principal a ser batido, agora, Rússia ou China, para deter o declínio dos EUA, as reações – e encenações – de Trump têm muito a ver com o cerco que sofre do establishment: inclusive seu gatilho ligeiro nas tuitadas.
ANTONIO PIMENTA