O ministro da Defesa da Rússia, general Konashenkov, disse que Washington quer “abafar as evidências dos bombardeios bárbaros dos seus aviões” contra a cidade de Raqqa, no leste da Síria
O ministro da Defesa da Rússia, major-general Igor Konashenkov, acusou no domingo (22) os Estados Unidos de terem a “intenção de abafar rapidamente as evidências dos bombardeios bárbaros dos aviões norte-americanos e da coalizão que enterraram milhares de civis sob as ruínas de Raqqa”.
A cidade de Raqqa, na região leste da Síria, foi tomada pelo bando que se autoproclamou Estado Islâmico, e se tornou um dos principais bastiões destes terroristas.
A pretexto de combatê-los os EUA desferiram inúmeros ataques aéreos sobre Raqqa, sem qualquer autorização do governo sírio ou mesmo sem solicitar sua participação na árdua luta que a Síria, com amplo apoio internacional, vem empreendendo para debelar o ataque terrorista que – após financiar e treinar dezenas de milhares de mercenários – dizia combater na região.
Konashenkov destaca que, após a cidade ser inteiramente arrasada e, só nestas condições haver sido ‘libertada’ do EI, com milhares de civis mortos pela explosão de bombas e mísseis lançados a esmo, “enquanto Raqqa ainda não conseguiu esfriar após os bombardeios da coalizão internacional, já os altos funcionários de Washington, Paris e Berlim começaram a fazer declarações sobre a alocação urgente de dezenas de milhões de dólares e euros para Raqqa. Esses milhões deveriam alegadamente ajudar a restaurar a vida pacífica na cidade”. Mas, o general ironiza esta “generosidade” e a questiona: “Deveríamos saudar tal generosidade, mas temos dúvidas”.
Em primeiro, lugar, conforme aponta Konashenkov, a Rússia tem insistentemente pedido ajuda humanitária e apontado as regiões onde essa ajuda é mais urgente e necessária, sem que nada tenha sido providenciado, “nem pelos EUA, nem pelas nações europeias”.
O jornalista norte-americano, Roy Gutman, em sua matéria “Os Estados Unidos dizem estar destruindo Raqqa para salvá-la dos terroristas, enquanto os civis que se danem”, publicada no portal The Daily Beast, em 22 de junho alertava que os bombardeios atingiam os residentes ou os que tentavam fugir para salvar suas vidas: “Bairros inteiros estão sendo aplainados pelos bombardeios, com pouca ou nenhuma consideração pelos civis que não conseguiram fugir do interior. É como lançar uma bomba nuclear por etapas”.
Já em junho, um grupo de pesquisadores da ONU sobre a guerra na Síria denunciou o “alarmante” número de civis mortos pela força aérea norte-americana. Eles declararam que a derrota do EI não pode vir “a expensas das vidas de civis sob cerco” na cidade controlada pelo bando.
Além do bombardeio indiscriminado, a ONU destacou que a força aérea que atacava Raqqa, usou armas banidas, a exemplo de bombas incendiárias e de fósforo branco.
Até mesmo Paulo Pinheiro, que preside a Comissão de Inquérito sobre a Síria e que, em relatórios anteriores chegou a culpar o governo sírio pelos ataques com mortes de civis que o país sofreu, não conseguiu calar diante da barbárie que aconteceu em Raqqa. Em depoimento ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, em junho, declarou que a Comissão estava, já então, “gravemente preocupada com o crescente número de civis que morrem durante as investidas aéreas”.
Ele também declarou que além dos mortos, centenas de milhares de civis empreenderam fuga diante do bombardeio crescente “deixando para trás seus lares e tornando-se deslocados dentro de seu próprio país”.
A fuga desesperada também elevou o número de mortes entre civis, pois segundo a equipe da ONU, “famílias que tentavam escapar de Raqqa, foram pegas sob fogo cruzado dos dois lados, com o Estado Islâmico usando megafones para ordenar a que ninguém deixasse a cidade e quando os fugitivos eram pegos em fuga, tornavam-se alvos de tiros e seus carros eram incendiados”.
Hassan Kirfou, um dos mais de 10.000 residentes que chegaram a um campo para pessoas deslocadas, na cidade vizinha de Ain Issa, declarou que um ataque aéreo atingiu a mesquita onde ele trabalhava e que ele escapou por pouco, uma vez que acabara de fechar os portões de mesquita ao anoitecer.
Mas nem todos tiveram a mesma sorte, “Eu vi três adolescentes mortos, empilhados, ao lado da mesquita Nour”.
“Eu não sei por que eles atiram com mísseis nestas áreas onde restaram apenas poucos franco-atiradores”.
Abu Hamoud, outro que escapou de Raqqa denunciou que “os bombardeios destruíram um prédio de quatro andares. Pessoas ficaram presas ou morreram sob os escombros. No ataque usaram também fósforo branco”.
Diante das denúncias da ONU e de inúmeras organizações humanitárias, o Comando Central dos Estados Unidos (USCentCom) declarou que os crimes eram inevitáveis. “Custa um esforço extraordinário atingir alvos militares de uma forma que minimize o risco de baixas civis” e acrescentou: “Em alguns incidentes as baixas civis são inevitáveis”.
Em Raqqa, o número de civis mortos chegou a mais de 3 mil, inclusive com dados do insuspeito Observatório de Direitos Humanos na Síria, com sede em Londres.
NATANIEL BRAIA