Para ex-ministros da Saúde, secretário de Saúde Pernambuco, André Longo, e o pesquisador da Fiocruz, Carlos Gadelha, a pandemia não explodiu no Brasil graças à quarentena. Primeiro evento do ciclo de debates promovido pelo Observatório da Democracia aconteceu na segunda-feira (4)
Ex-ministros e secretários da Saúde e pesquisadores participaram, na segunda-feira (4), da conferência “Coronavírus, isolamento social e saúde pública” em evento virtual promovido pelo Observatório da Democracia.
Coordenado pelo ex-ministro da Educação e presidente da Fundação Perseu Abramo, Aloizio Mercadante, o seminário sobre a situação da Saúde durante o coronavírus contou com a presença do secretário da Saúde de Pernambuco André Longo, dos ex-ministros da Saúde, Arthur Chioro e André Temporão e o pesquisador da Fiocruz Carlos A. Grabois Gadelha.
Assista o debate na íntegra:
#AOVIVO | Coronavírus, isolamento social e políticas públicas | Diálogos, Vida e Democracia"Coronavírus, isolamento social e políticas públicas" é a primeira das 19 webconferências do ciclo "Diálogos, Vida e Democracia", iniciativa do Observatório da Democracia. Participam desta webconferência Aloizio Mercadante, André Longo, Artur Chioro, Carlos Augusto Grabois Gadelha e José Gomes Temporão.
Posted by Fundação Perseu Abramo on Monday, May 4, 2020
André Longo, que abriu as falas, comentou sobre as dificuldades encontradas pelo governo do Estado para combater o coronavírus e a sabotagem de Jair Bolsonaro à quarentena.
“A gente chegou a atingir o nível de 70% de isolamento social, mas quando a liderança negativa do presidente Bolsonaro passou a ocupar os espaços de mídia para combater a quarentena, nós tivemos uma perda da adesão, que fragilizou uma série de controles”, disse o secretário.
“Hoje temos um isolamento social menor do que poderíamos ter. Por isso, o governo está estudando como evoluir e fazer um lockdown sem unidade nacional”, por conta da postura do governo Bolsonaro.
Segundo André Longo, não houve clareza na política do governo federal “nem mesmo do novo ministro da Saúde [Nelson Teich]que chegou dizendo que iria estabelecer diretrizes claras. Do presidente não poderíamos esperar nada”.
Para ele, “uma das grandes lições dessa crise é que precisamos fazer um grande investimento em nosso parque tecnológico para sair da dependência internacional dos insumos de saúde. Isso ficou a desejar nos últimos anos e agora pagamos esse preço”.
Uma prova disso é que “tivemos uma dificuldade enorme, desde o início, de fazer a testagem, o que limitou bastante a nossa resposta”, relatou.
Arthur Chioro, que chefiou o Ministério da Saúde entre 2014 e 2015, acredita que, ao lado dos problemas sanitários e socioeconômicos, um problema grave a ser enfrentado é a “crise política no meio de uma hecatombe sanitária e socioeconômica”, dada “pela deliberada oposição que o presidente da República e seus seguidores fazem do ponto de vista das diretrizes”.
“Sem unidade nacional é muito difícil produzir os efeitos desejados”, disse. Segundo ele, o isolamento já se provou importante. “Se a epidemia ainda não explodiu, tem muito a ver com o isolamento inicialmente feito”.
“Garantir e aprofundar o isolamento é essencial para a garantia da vida. O custo que terá sobre a vida de milhares de brasileiros será altíssimo se nós não investirmos no isolamento social amplo, radical e dando condições para que as pessoas de baixa renda possam, efetivamente, cumpri-la”, afirmou.
O ex-ministro enfatizou a falta de testes já levantada por André Longo. “Estamos olhando pelo retrovisor”, disse. Por só serem testados os “casos graves e moderados, mas que precisam de internação”, ao invés dos pouco mais de 100 mil casos que temos, é provável que “estejamos muito próximos de um milhão e meio de brasileiros infectados”.
“Isso não nos dá capacidade de análise para ação imediata e, muito menos, para o monitoramento necessário para poder identificar quando chegaremos ao pico da incidência máxima da curva e quando poderemos, com segurança, começar a desarmar o processo de isolamento”.
“Um aspecto fundamental foi a incapacidade do governo brasileiro de articular a nossa capacidade de aquisição e garantia de Equipamentos de Proteção Individual [EPI] para os nossos trabalhadores da saúde” e “a incompetência de fazer a conversão de nossa indústria” para “produzir aqui o mínimo necessário para a operação segura”. Além dos EPIs, o ex-ministro criticou a falta de produção de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI).
O ex-ministro da Saúde, José Gomes Temporão, afirmou que “se nós tivéssemos, de fato, um governo que defendesse a vida, que preservasse a saúde, teríamos uma política econômica radicalmente distinta [da de Jair Bolsonaro]”.
“A política econômica não está a serviço da política de saúde. Há uma evidente lentificação do processo de tomada de decisão. A ajuda não chega, e quando chega é insuficiente, o que faz com que as pessoas busquem desesperadamente meios de sobrevivência”, disse.
Da “postura irresponsável do presidente da República, quando ele faz questão de enfrentar a lógica, a ciência e as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), constatou-se uma redução do percentual da população que vinha fazendo o isolamento social”.
Temporão também disse que “nós estamos sem ministério e sem ministro há três semanas”, que começou com a demissão de Luiz Henrique Mandetta e a admissão de Nelson Teich.
O último debatedor, Carlos Gadelha, que é líder do grupo de pesquisa “Desenvolvimento, Complexo Econômico-Industrial e Inovação”, da Fiocruz, acredita que a “questão econômica, hoje, é um problema de saúde pública”.
“Como está o acesso aos produtos [contra o coronavírus]? No mercado de vacinas, 80% estão concentrados na mão de quatro empresas que dominam o mercado global. Isso é um problema de saúde pública, não é apenas questão econômica”.
“Felizmente, temos a Fundação Oswaldo Cruz e o Instituto Butantan para corrigir essa distorção do monopólio na área da saúde em termos globais”.
O pesquisador criticou a dependência do Brasil aos países estrangeiros, que ficou mais em evidência por conta da crise do coronavírus. “A nossa importação em saúde quadruplicou nos últimos 20 anos”, lembrou. No caso dos ventiladores, necessários para tratar dos pacientes com Síndrome Respiratória Aguda Grave, “nos últimos três anos, aumentou em 20% a dependência externa”.
“Não é à toa que a promessa de importação de ventiladores está dando errado”. “94% da produção de fármacos é de conteúdo importado”.
“Estamos em uma vulnerabilidade extrema”, avaliou. “Nessa pandemia, não estamos falando de um setor, estamos falando de saúde. Isso envolve o serviço na UTI, a busca por medicamento, a produção de teste para diagnóstico, o que mobiliza o sistema produtivo. Se nesse sistema produtivo uma dessas partes não funciona, o paciente lá na ponta morre”.
Gadelha também acredita que “a institucionalidade de Estado para atuar nessa crise foi desmontada”.
O ciclo de debates online “Diálogos, Vida e Democracia”, está sendo organizado pelo Observatório da Democracia, composto por sete entidades partidárias. São elas. a Fundação Astrojildo Pereira (Cidadania23), João Mangabeira (PSB), Lauro Campos e Marielle Franco (PSOL), Leonel Brizola – Alberto Pasqualini (PDT), Maurício Grabois (PCdoB), Ordem Social (PROS) e Perseu Abramo (PT). A Fundação Cláudio Campos também participa do Observatório.
O evento terá 19 debates, acontecendo a cada quatro dias, e contará com a presença de especialistas e políticos de grande amplitude política.
Veja os demais debates de maio:
08/05 Mesa 2 – Pandemia e saídas para a crise econômica
Coordenação: Osvaldo Maneschy (PLB-AP)
Debatedores confirmados: Luiz Gonzaga Belluzzo, professor titular do IE da Unicamp; Ricardo Carneiro, ex-presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e professor da Unicamp; Guilherme Mello, professor da Unicamp; Mônica de Bolle, pesquisadora-sênior do Peterson Institute for International Economics e diretora do Programa de Estudos Latino Americanos da Johns Hopkins University
Convidado: Pérsio Arida, ex-presidente do BNDES e do Banco Central.
12/05 Mesa 3 – O Brasil na crise mundial
Coordenação: Renato Rabelo (FMG)
Debatedores confirmados: Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores; Rubens Ricupero, ex-Ministro da Fazenda; Luís Fernandes, ex-secretário executivo de Ciência e Tecnologia, ex-presidente do FINEP e professor de Relações Internacionais PUC/RJ e UFRJ; Luiz Fiori, titular de Economia Política Internacional da UFRJ.
16/05 – Mesa 4 – Pandemia, crise e Pacto Federativo
Coordenação: Manoel Dias (FLB-AP)
Debatedores confirmados: Rui Costa (PT), governador da Bahia; Flávio Dino (PCdoB), governador do Maranhão; Renato Casagrande (PSB), governador do Espírito Santo.
Convidados: João Doria (PSDB), governador de São Paulo; Bruno Covas (PSDB), prefeito de São Paulo; Arthur Virgílio Neto (PSDB), prefeito de Manaus.
18/05 – Mesa 5 – Coronavírus, isolamento social e Saúde Pública 2
Coordenação: Maria Célia Vasconcellos, secretária de Saúde de Niterói
Debatedores confirmados: Glória Teixeira, professora de Epidemiologia do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA; Rosa Maria Marques, professora titular do departamento de Economia da PUC-SP e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP) e ex-presidente da Associação Brasileira de Economia de Saúde (ABRES); Lígia Bahia, médica sanitarista e professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/UFRJ)
22/05 Mesa 6 – Congresso, momento e opções políticas
Abertura: Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados
Bloco 1 – 14h30:
Debatedores: Acácio Favacho, líder do PROS; Alessandro Molon, líder do PSB; Arnaldo Jardim, líder do Cidadania23; Carlos Sampaio, líder do PSDB; Enio Verri, líder do PT;
Bloco 2 – 16h30:
Debatedores: Fernanda Melchionna, líder do PSOL; Joênia Wapichana, deputada da Rede; Perpétua Almeida, líder do PCdoB; Wolney Queiroz, líder do PDT.
25/05 – Mesa 7 – Crise, Comunicação e democracia
Coordenação: Henrique Matthiesen (FLB-AP)
Debatedores: Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), ex-deputada federal e presidente do Instituto E Se Fosse Você?; Humberto Costa (PT-PE), senador; Natália Bonavides (PT-RN), deputada federal; Túlio Gadelha (PDT-PE), deputado federal; David Miranda (Psol-RJ), deputado federal; Lídice da Mata (PSB-BA), senadora.
28/05 – Mesa 8 – Redes Sociais e Novas Formas de Comunicar
Coordenação: Renata Mielli (FMG – Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé)
Debatedores: Renato Rovai, jornalista e diretor de redação da Revista Fórum; Leonardo Attuch, jornalista e diretor do portal Brasil 247; Glenn Greenwald, jornalista e advogado, um dos fundadores do The Intercept Brasil.
PEDRO BIANCO
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