Após Trump ter rancorosamente postado em resposta ao discurso do presidente francês Macron que “eles estavam aprendendo alemão em Paris antes da chegada dos EUA”, o site do exército francês deu o troco, com uma foto de um soldado, rastejando no chão durante os treinamentos, e com os dizeres: “está chovendo, mas não é sério. Estamos ficando motivados”, acompanhado do hashtag #MondayMotivation.
É que Trump deixou de visitar o cemitério onde estão sepultados os soldados americanos mortos na I Guerra, onde deveria prestar uma homenagem, alegando que chovia muito, e enquanto os demais líderes do mundo estavam debaixo do maior toró diante do túmulo do soldado desconhecido no Arco do Triunfo, o presidente bilionário americano só se juntou depois.
A postagem causou uma enxurrada de gozações com Trump nas redes sociais, mostrando outros chefes de Estado de guarda-chuva em eventos, ou, como Putin, sem guarda-chuva e impassível debaixo do maior aguaceiro. Para cutucar Trump, até aquela foto de Obama com um lacaio segurando o guarda-chuva serviu.
A bronca de Trump com Macron foi que este, nas vésperas do ato em Paris pelo centenário da assinatura do armistício que encerrou a I Guerra Mundial, defendeu a necessidade de um “exército europeu” independente dos EUA.
Pior ainda, Macron, quem diria, depois de todo aquele clima de bromance na sua visita à Casa Branca, disse na lata de Trump que “quando dizemos ‘nossos interesses vêm em primeiro lugar, os dos outros não importam’, nós apagamos a própria coisa que uma nação detém de mais preciosa, aquilo que lhe dá vida e a faz ótima: seus valores morais.”
Não deixa de ser um tanto cômico que dois diletos representantes do imperialismo se digladiem sobre os “valores morais”, ainda mais nos 100 anos da I Grande Guerra, que é amplamente sabida como uma guerra entre bandidos, o bando anglo-francês e o bando alemão, pelo reparto do mundo, colônias, mercados e esferas de influência, que matou 10 milhões de soldados e 7 milhões de civis e mutilou 30 milhões. E na qual os ianques entraram, no final, decisivamente pelo lado anglo-francês.
Mas, setenta anos após a ocupação da Europa pelas tropas americanas na II Guerra e após mais de duas décadas de unilateralismo ianque, compreende-se que até mesmo Macron conteste a lei da selva de Trump. Aliás, com De Gaulle, a França tinha uma postura bastante independente em relação a Washington.
A postagem de Trump dizia: “Emmanuel Macron sugere construir seu próprio exército para proteger a Europa dos EUA, China e Rússia. Mas foi a Alemanha nas Guerras Mundiais 1 e 2.” E, provocativamente, acrescentava: “como isso funcionou para a França? Eles estavam começando a aprender alemão em Paris antes de os EUA aparecerem. Pague pela NATO ou não …!”
Trump não parou aí e uma hora depois tuitou reclamando das tarifas do vinho francês e zombando dos índices de aprovação de Macron. E culminou com um “Make France Great Again”. Na semana passada, Trump já havia chamado as declarações de Macron de “muito insultantes” e convocou a Europa a “primeiro pagar sua parte da Otan, que os EUA subsidiam muito”.
Como Trump nada disse sobre o Tratado INF, de repente vai acabar disparando outra tuitada. É que Macron disse antes que “quando vejo o presidente Trump anunciando que está abandonando um grande tratado de desarmamento que foi formado após a crise dos mísseis euroamericanos que atingiu a Europa, quem é a principal vítima? A Europa e sua segurança.”
Em tempo: alguém podia contar a Trump como o apoio dos combatentes franceses foi decisivo para a vitória americana na guerra da independência, contra as tropas britânicas – e que foi a França que doou a Estátua da Liberdade. Talvez ele não conheça essa história por ser neto de imigrante, e nas rodas de família as conversas eram só sobre golpes no mercado imobiliário.
A.P.