Publicamos a seguir os principais trechos do artigo com o título “O bombardeio do teatro de Mariupol foi encenado por ucranianos extremistas do Azov para tentar intervenção da Otan?”, do premiado jornalista Max Blumenthal. A matéria foi originalmente publicada nos portais Greyzone e Monthly Review
MAX BLUMENTHAL*
A mídia ocidental tem feito reportagens para dizer que os militares da Rússia, deliberadamente atacaram o teatro da Academia Regional de Drama de Mariupol, Ucrânia, afirmando que o local estava cheio de civis e marcado com placas onde se lia “crianças”, no chão a sua volta.
O suposto bombardeio aconteceu exatamente quando o presidente Volodymyr Zelensky apelava ao Congresso dos EUA por uma zona de exclusão aérea, colocando lenha na fogueira ao coro a favor de uma confrontação direta com a Rússia e aparentemente inspirando o presidente Joe Biden a brandir que o presidente Russo seria um “criminoso de guerra”.
Um olhar mais de perto revela que os residentes locais em Mariupol já haviam alertado três dias antes do incidente de 16 de março de que o teatro seria o cenário de um ataque de bandeira trocada lançado pelo abertamente neonazi Batalhão Azov, que controlava o prédio e o território à sua volta.
Civis que escaparam da cidade através de corredores humanitários testemunharam que estavam sendo impedidos de sair pelo Azov para servirem de escudo humano e que os soldados do Azov detonaram partes do teatro no momento em que batiam em retirada. Apesar das afirmações de que um massivo bombardeio aéreo russo que teria reduzido o prédio a cinzas, parece que todos os civis escaparam vivos.
Um vídeo do ataque ao teatro segue inacessível até o momento dessa publicação, só fotos da estrutura danificada podem ser vistas. O Ministério de Defesa da Rússia nega ter realizado um bombardeio aéreo contra o teatro, asseverando que o sítio não tinha qualquer valor do ponto de vista militar e que não houve voos militares aéreos na área no dia 16 de março.
Enquanto que a operação militar da Rússia na Ucrânia acabou gerando uma crise humanitária em Mariupol, fica claro que a Rússia não tinha nada a ganhar com alvejar o teatro, e só garantiria contra si mais um ponto negativo em termos de relações públicas ao atingir um prédio cheio de civis incluindo russos étnicos.
Azov, por outro lado, seria o beneficiado destacado de um ataque dramático e sombrio a ser denunciado contra a Rússia. Em retirada em todo o perímetro de Mariupol e encarando a possibilidade de duro tratamento nas mãos dos militares russos em processo de “desnazificação”, seus integrantes só tinham aparentemente uma esperança, desencadear uma intervenção da Otan.
O mesmo senso de desespero foi demonstrado pelo pronunciamento cuidadosamente escrito de Zelensky diante do Congresso norte-americano, no qual invocou até o discurso de Martin Luther King, “I Have A Dream”. E fez passer um video produzido mostrando o sofrimento de civis para defender uma zona de exclusão aérea.
Ao instigar o ultraje no público ocidental sobre os cinzentos crimes de guerra russos, o governo da Ucrânia claramente busca gerar pressão suficiente para vencer qualquer relutância da parte do governo de Joe Biden e assim levá-lo ao confronto militar direto com a Rússia.
Porém, a mais potente denúncia – do ponto de vista emocional até aqui – de que a Rússia deliberadamente bombardeou crianças inocentes que se abrigavam no interior de um teatro, tem sido questionado por residentes de Mariupol e uma mensagem amplamente divulgada na rede Telegram explicitamente prevendo um ataque de bandeira trocada ao prédio.
Os integrantes do Batalhão Azov estão cada vez mais desesperados e imploram por intervenção militar do Ocidente.
Mariupol, a cidade portuária estratégica a sudeste, tem estado nas mãos do Batalhão Azov desde 2014. Desde que tomou conta da cidade, ela serviu de base política e militar para os paramilitares ultra-nacionalistas, assim como foi daí que lançaram ataques contra os separatistas pró-Rússia desde o momento em que se ergueu a República de Donetsk.
Reunindo elementos das fileiras dos ativistas de extrema-direita que forneceram manifestantes de rua durante o golpe da Praça Maidan (o golpe Euromaidan), o Batalhão Azov foi formalmente incorporado à Guarda Nacional do Ministério do Interior da Ucrânia. Foi fundado pelo organizador abertamente fascista Andrey Biletsky, que tem se proposto a “liderar as raças brancas do mundo à sua cruzada final…contra os untermenchen [subhumanos] submetidos aos semitas”.
Com seu símbolo – inspirado no nazista “Wolfsangel”, em seus uniformes e bandeiras, os integrantes do Azov não escondem seus objetivos ideológicos. Apesar de terem sido identificados pelo FBI, pelo Congresso dos EUA e por seus próprios membros como uma unidade neonazi e implicados em uma série de sórdidas violações de direitos humanos, o Azov tem tido a aberta colaboração de treinadores militares dos Estados Unidos e do Canadá.
Tendo acusado o Azov de decididos a exterminar os russos do Donbass, Putin marcou sua base em Mariupol como a linha de frente de sua campanha declaradamente de “desnazificação” da Ucrânia. Desde a entrada russa de 24 de fevereiro na Ucrânia, a cidade se tornou o local de um duro combate urbano com as forças especiais russas junto com as forças populares de República de Donetsk, travando um combate de quarteirão a quarteirão pelo controle da cidade com a artilharia russa bombardeando posições do Azov.
No dia 7 de março, o comandante do Batalhão Azov, Denis Prokopenko surgiu nas câmeras de Mariupol com uma mensagem urgente. Divulgada no canal oficial do Azov no Youtube, ao som de salvas ocasionais de artilharia, Prokopenko declarou que os militares russos estariam levando a cabo um “genocídio” contra a população de Mariupol, que é de 40% de etnia russa.
Prokopenko então demandou das nações do Ocidente que “criassem uma zona de exclusão aérea com base em armamento moderno”. Ficou claro a partir do apelo de Prokopenko que as posições do Azov se tornavam mais insustentáveis a cada dia.
Enquanto os militares russos rapidamente degradavam as posições do Azov, na segunda semana de março, soldados do Azov aparecem direcionando civis idosos assim como mulheres e crianças para o hall de entrada do teatro de Mariupol.
Desde que a Rússia lançou sua campanha, soldados do Batalhão Azov tem sido filmados barrando a passagem de civis tentando sair de Mariupol. De acordo com diversos testemunhos muitos dos civis foram usados como escudos humanos.
No vídeo no link abaixo, em língua ucraniana, se pode ver uma jovem que, impedida de passar pelo corredor humanitário por um soldado ucraniano começa a chorar:
https://twitter.com/i/status/1500163671619743745
*Max Blumentahal é destacado correspondente com atuação em zonas de conflito e com vários livros e artigos publicados, desnudando as diversas intervenções norte-americanas. Entre suas obras, “A Administração da Selvageria”.