O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou “intolerável” e “inaceitável” a revelação, feita pelo general Eduardo Villas Bôas que, em livro recentemente publicado, relatou ter articulado com a cúpula do Exército brasileiro postagem, feita ainda em 2018, no período pré-eleitoral, em que questionou se as instituições estavam pensando no bem do país, com o objetivo de promover uma pressão sobre o Poder Judiciário, na véspera do julgamento de um pedido de habeas corpus de Lula ao Supremo Tribunal Federal.
Na noite de 3 de abril de 2018, o general Villas Bôas, então comandante do Exército, emitiu duas declarações no Twitter.
Na primeira delas, dizia: “Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?”.
Na segunda, o general declarava: “Asseguro à nação que o Exército brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”.
No dia seguinte, seria o julgamento do habeas corpus de Lula, que tentava evitar a cadeia, a que tinha sido condenado no processo do triplex de Guarujá, pela 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
No livro, Villas Bôas conta que o texto publicado na rede social “teve um ‘rascunho’ elaborado pelo meu staff e pelos integrantes do Alto Comando residentes em Brasília”. Disse também que “tratava-se de um alerta, muito antes que uma ameaça”.
A nota do ministro Fachin, do STF, relator da Operação Lava Jato, repudiando a confissão do general Villas Bôas, foi emitida na segunda-feira (15/02).
“Diante de afirmações publicadas e atribuídas à autoridade militar”, escreveu Fachin, “e na condição de relator no STF do HC 152.752 [o Habeas Corpus de Lula], anoto ser intolerável e inaceitável qualquer forma ou modo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário. A declaração de tal intuito, se confirmado, é gravíssima e atenta contra a ordem constitucional. E ao Supremo Tribunal Federal compete a guarda da Constituição”.
Lembrando o artigo 142 da Constituição, prosseguiu o ministro do STF: “as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Fachin, em sua nota, lembra, ainda, a tentativa de golpe de Estado de Trump, nos EUA:
“Frustrou-se o golpe desferido nos Estados Unidos da América do Norte contra o Capitólio pela postura exemplar das Forças Armadas dentro da legalidade constitucional.”
As mensagens de Villas Bôas, pressionando o Supremo na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula – e já em meio à campanha eleitoral bolsonarista -, voltaram a ser debatidas publicamente em razão das revelações no livro “General Villas Bôas: Conversa Com o Comandante”, longa entrevista do historiador Celso Castro com o ex-comandante do Exército.
Em 2018, a defesa de Lula tentava evitar a prisão após condenação em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do triplex do Guarujá (SP). Na ocasião, o STF, por 6 votos a 5, recusou o pedido.
Três dias depois, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região determinou a prisão de Lula.