Pupilos de Augusto Heleno, ainda no GSI, não montaram o “Plano Escudo”, Segurança do DF estava bichada e o militar afastado insistiu que acampamento era “pacífico”. Não fosse a maioria das Forças Armadas contrária ao golpe, grupo fascista de Bolsonaro poderia ter tido êxito
O depoimento do ex-chefe do Comando Militar do Planalto (CMP), o general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, na “CPMI do Golpe”, nesta quinta-feira (14), confirma que militares do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ligados ao general Augusto Heleno, que ainda permaneciam no órgão, sabotaram a defesa do Palácio do Planalto nos atos terroristas do dia 8 de janeiro.
De acordo com Dutra, o GSI acionou o Comando Militar do Planalto às 11h54 do dia 8 de janeiro solicitando apoio para proteger o Palácio do Planalto. Segundo ele, às 12h30, um pelotão designado pelo então comandante teria chegado à sede do Poder Executivo federal.
No entanto, o “Plano Escudo” de defesa do Planalto já havia sido decretado, segundo o depoimento do titular do órgão, general Gonçalves Dias, desde a sexta-feira (6). O plano previa não só a participação das tropas da Polícia Militar do Distrito Federal na proteção do Planalto – o que não aconteceu, como de tropas do Exército acantonadas do Comando Militar do Planalto.
O secretário-executivo do GSI, general Carlos José Russo Assumpção Penteado, então responsável pelo acionamento das tropas do Exército no Plano Escudo, não o fez e foi cobrado pelo general Gonçalves Dias, quando este chegou ao local já invadido pelos terroristas. Dias cobrou, de imediato, do general Penteado o motivo de não estarem montados os pelotões de defesa.
Em seu depoimento à CPI da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o general Penteado, que não acionou o “Plano Escudo”, tentou tirar o corpo fora alegando que o general Gonçalves Dias teria “sonegado informações”.
Destaca-se que a alegação mentirosa de que o general Dias sonegou informações é a “versão” arranjada pelos bolsonaristas e repetida até hoje, após o fracasso do golpe. Ou seja, as hordas bolsonaristas fabricaram uma versão ridícula de que Lula, vencedor na eleições, tentou um golpe contra o seu próprio governo e que G. Dias e Flávio Dino – no caso deste último uma injustiça gritante – não agiram porque estariam mancomunados com o “golpe de Lula”.
É importante destacar que o golpe de Estado real fracassou porque não contou com a anuência dos altos escalões das ForçasArmadas. Nas inquirições feitas ao general nesta quinta-feira este fato não ficou muito evidente e só ocorreu como fruto da demagogia histérica dos golpistas, e também por uma certa imprecisão por parte de alguns parlamentares sobre a ação das Forças Armadas como instituição no episódio.
Pelos dados conhecidos até aqui, fica claro que grupos fascistas se infiltraram nas tropas, participaram ativamente da sabotagem e se envolveram na trama golpista mas, pela ação contrária dos altos mandos das Forças Armadas, o golpe acabou fracassando.
O próprio general Dutra, ao responder a um bolsonarista, sobre se houve ou não um golpe, disse que os golpistas não conseguiram seu intento porque não tiveram apoio das Forças Armadas. É verdade que ele disse isso tentando tirar o seu corpo fora. Mas essa é a realidade.
O golpe efetivamente não contou com apoio das Forças Armadas como instituição. Entretanto, alguns fascistas infiltrados – que estão sendo paulatinamente afastados – tentaram arrastá-la para o golpe e fracassaram. Não foi à toa que a milícia digital de Bolsonaro atacou violentamente a cúpula das Forças Armadas e segue denegrindo a imagem dos militares brasileiros até hoje.
As decisões tomadas pelo general depoente, em relação ao acampamento de golpistas em frente ao Quartel General do Exército em Brasília, por exemplo, assim como as de outros comandos, reforçaram a avaliação de que havia uma parte da tropa que se deixou arrastar pelos planos antidemocráticos de Bolsonaro e seus asseclas.
O general Dutra tentou minimizar a sua “complacência” com os acampados em frente ao QG do Exército com a alegação de que eram “manifestantes pacíficos”, depois do país inteiro já saber que partiu de lá o planejamento da tentativa de invasão da sede da PF no dia da diplomação de Lula. Seu depoimento também não levou em conta que de lá partiram os terroristas que planejaram explodir o Aeroporto de Brasília, no dia 24 de dezembro. Sem falar que foi de lá também que os terroristas saíram para invadir os Três Poderes.
Não colou a afirmação do general de que ele não tinha autoridade para exigir o desmonte do acampamento. Assim como também não colou a explicação para ter proibido a ação da PM na noite dos atos golpistas. Segundo ele, a proibição foi para “evitar danos colaterais ou risco à integridade física ou à vida das pessoas”.
“O CMP prestou o apoio necessário à secretaria de segurança pública na desocupação do acampamento na manhã do dia 9, conforme a determinação da decisão judicial, e contribuiu decisivamente para que não houvesse danos colaterais ou risco à integridade física ou à vida das pessoas”, disse o general.
“A ordem judicial foi integralmente cumprida no prazo de 24 horas estabelecido pelo STF”, seguiu alegando Dutra. Segundo ele, “mais de 1 mil pessoas foram retiradas no dia 9 sem nenhum incidente”.
Ele também afirmou que antes de uma ordem judicial não podia retirar as pessoas da frente do quartel, mas foi desmentido no ato por um parlamentar. O senador Rogério Carvalho desmentiu o militar e lembrou que essas áreas são áreas de segurança nacional e que são proibidas manifestações de qualquer tipo nestas localidades em qualquer região do país.
É certo que a Secretaria de Segurança do DF, sob o comando de Anderson Torres, também estava na trama. O “Plano Escudo” deveria contar, como se sabe, com várias fileiras de soldados da PM-DF para se somar à defesa do Planalto. Entretanto, a Secretaria de Segurança Pública de Brasília, que deveria garantir o efetivo policial acordado, não só para o Plano Escudo, mas para toda a segurança dos Três Poderes, não designou as tropas acertadas com o governo federal dois dias antes dos atentados.
Coincidentemente, o bolsonarista Anderson Torres, que tinha sido Ministro da Justiça de Bolsonaro, e que foi pego com uma minuta do golpe, desarticulou, junto com alguns comandantes da PM-DF, as tropas responsáveis pela Praça dos Três Poderes e embarcou para Miami. Ele e esses militares golpistas foram presos por determinação do STF. O governador à época do DF também foi afastado
Como ficou demonstrado com a “minuta do golpe”, descoberta na casa e no telefone de Anderson Torres, o plano dos golpistas era criar o caos no país para permitir a instauração do “Estado de Defesa” e, com isso, a decretação de uma “intervenção” no Supremo Tribunal Federal (STF). Assim eles afastariam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral e seria anulado o resultado das eleições.
A tentativa de invasão da PF com a quebradeira no centro de Brasília, a bomba no aeroporto, o fechamento de estradas em todo o país e o 8 de janeiro faziam parte deste esquema.
O que se depreende da oitiva é que o fracasso do golpe bolsonarista se deu realmente pela falta de apoio das Forças Armadas aos golpistas e pela ação enérgica e imediata do novo governo. O repúdio nacional e internacional também ajudaram bastante.
A decretação da intervenção na Segurança Pública do DF e as medidas tomadas pelo Supremo Tribunal Federal, de punição exemplar aos fascistas que planejaram, financiaram e executaram o plano fracassado, foram e estão sendo decisivas para enterrar o fascismo bolsonarista no Brasil.
SÉRGIO CRUZ