Biden se apresentou abatido, sem olhar para a câmera, dizendo frases incompletas ou sem nexo. Trump – o que incitou a invasão do Capitólio – desfilou mentiras, a exemplo de imigrantes que provocam terrorismo em Nova Iorque, mas o candidato democrata não conseguiu rebater
O desempenho pífio do democrata Joe Biden no primeiro debate presidencial com o republicano Donald Trump na noite passada e o pânico entre os democratas foi assinalado pelos principais jornais norte-americanos nesta sexta-feira (28), com o The New York Times estampando que “Dificuldades de Biden em debate alarmam democratas”; “Democratas entram em pânico com Biden, duvidando de seu futuro” (Washington Post) e “Democratas discutem substituição de Biden na chapa presidencial” (Wall Street Journal).
Diante de um Trump que mentia descaradamente sobre tudo, do assalto ao Capitólio até às suas condenações pela justiça, que não se comprometeu a aceitar o resultado das eleições e vomitou xenofobia contra imigrantes, em um debate recheado de insultos pessoais, Biden se mostrou “instável”, “congelou” em certos momentos, tropeçou nas palavras, começou uma resposta por um assunto e acabou em outro, na prática deixando sem resposta a principal questão em jogo nesse debate, se o octagenário presidente estaria apto para encabeçar o país por mais quatro anos no quadro de enorme divisão interna e o mundo rumando para a multipolaridade.
“Uma coisa estava clara no final do primeiro confronto presidencial de 2024: os democratas estavam em pânico após o desempenho de Biden no debate à noite. Sua consternação abrangeu os corredores do Congresso, as cidades costeiras de doadores endinheirados, os redutos do partido em todo o país e os bares e salas de estar onde os democratas se reuniam para torcer por seu cara”, descreveu o Post.
O debate foi realizado pela CNN, em Atlanta, de 90 minutos sem plateia, com normas rígidas e microfone fechado para o candidato que não estava falando. Curiosamente, foi a primeira vez em que houve um debate presidencial nos EUA antes que os candidatos estivessem formalizados pelas respectivas convenções. Está previsto um segundo debate.
No primeiro debate das eleições de 2020, Biden venceu falando diretamente para as câmeras e ignorando as intermináveis interrupções do frenético Trump. Neste debate, Trump encenou ser mais comedido, embora, como frisou o Times, “os ataques do ex-presidente Trump eram frequentemente falsos, sem contexto ou vagos o suficiente para serem enganosos”.
Comentários à parte, a questão de fundo é o beco sem saída ao qual os EUA estão sendo empurrados, quando os dois candidatos são, respectivamente, Genocide Joe – quem entope Israel de bombas para o extermínio em Gaza – e Trump da invasão do Capitólio.
ALARMANTE
Para o Post, o mais alarmante para os democratas, foi que ele se enquadrou “na caricatura que Trump faz dele – de um homem enfraquecido após seu auge”.
Continua o Post: “Sua voz era suave e rouca, e ele repetidamente tentou, e não conseguiu, limpar sua garganta. Suas respostas, às vezes, eram divagantes, e em certo momento ele congelou. Em outro, ele começou uma resposta sobre o aborto, antes de subitamente entrar na imigração. Quando Trump falava, Biden muitas vezes observava com a boca ágape e os olhos arregalados – uma tela dividida que dava a impressão do avô envelhecido que ele é, não o líder resoluto que ele esperava projetar.”
O jornal também transcreveu uma postagem na plataforma X, feita por Maria Shriver, ex-primeira-dama da Califórnia e membro da extensa família democrata Kennedy. “Eu amo Joe Biden. Sei que ele é dedicado ao nosso país e está cercado de boas pessoas. Esta noite foi de partir o coração em muitos aspectos. Este é um grande momento político. Há pânico no Partido Democrata. Vai ser uma longa noite.”
Fontes ligadas a Biden alegaram que ele estava resfriado, o que tornou sua voz mais rouca e o prejudicou no debate. Já Trump aproveitou um erro de Biden com troca de palavras, em um certo momento, para dizer: “Não entendi o que Biden quis dizer, aliás nem ele deve saber”.
Em socorro do octagenário candidato, a presidente da sua campanha, Jen O’Malley Dillon, asseverou que “esta noite, o presidente Biden apresentou uma visão positiva e vencedora para o futuro da América – uma visão em que cada americano tem uma oportunidade justa de concretizar o sonho americano, onde todos os nossos direitos são protegidos e onde o nosso presidente luta para fortalecer a nossa democracia – não derrubá-la”.
Ao que parece, não foi exatamente isso que foi percebido pela imensa maioria dos espectadores. Mesmo com todos os tropeços e atrapalhações de Biden, não faltaram no debate ataques pessoais e trocas agressivas.
“CRIMINOSO CONDENADO”
Biden chamou Trump de criminoso condenado,disse que o ex-presidente “tinha a moral de um gato de rua” e o acusou de ter um caso com uma atriz pornô quando a mulher dele estava grávida. Acusou-o ainda chamar os veteranos de guerra de “otários e perdedores”.
Já Trump, como de costume, despejou uma enxurrada de mentiras e meias verdades. Como quando acusou Biden de apenas favorecer economicamente os imigrantes ilegais. “Os únicos empregos que ele criou foram para imigrantes ilegais”, disse o ex-presidente, que repetiu também o discurso de que imigrantes que entram nos EUA de forma ilegal são “terroristas que estão vivendo em hotéis de luxo de Nova York” e acusou Biden de “simplesmente deixá-los entrar”. Na verdade, os imigrantes que estão em hoteizinhos em NY foram tangidos para lá em ônibus, à força, por governadores republicanos na fronteira.
Ele também defendeu sua gestão da pandemia, o corte de impostos para os magnatas e asseverou ter entregado a economia a Biden em perfeito estado.
Sobre a invasão do Capitólio – que o próprio Trump convocou – e contrariamente a tudo que foi presenciado pelo mundo inteiro, ele cinicamente jogou a culpa sobre a presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, e a prefeita da capital Washington, também democrata, que teriam recusado seu oferecimento prévio de enviar 10 mil soldados da Guarda Nacional.
UCRÂNIA E GAZA
Trump disse ainda que os EUA se tornaram “uma nação de Terceiro Mundo” sob o governo Biden, acrescentando que “ele destruiu nosso país”. Ele assinalou que, sob seu comando, o país “não estava em guerra”, uma referência aos conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza e acusou Biden de enfraquecer os EUA na retirada do Afeganistão.
Sobre o conflito na Ucrânia, Trump disse que “essa é uma guerra que nunca deveria ter começado”. “Isso nunca teria começado comigo… Ele [Biden] nos colocou em uma posição tão ruim agora com a Ucrânia e a Rússia. Porque a Ucrânia não está vencendo aquela guerra… eles estão ficando sem pessoas, estão ficando sem soldados. Eles perderam tantas pessoas.”
Putin “não tirou nenhuma terra, nada, de Trump”, disse o ex-presidente sobre as relações com a Rússia durante seu mandato. Se eleito, Trump prometeu terminar a guerra na Ucrânia antes mesmo de tomar posse.
Trump, que patrocinou os Acordos de Abraão, para rifar o Estado Palestino na normalização entre Israel e os árabes, jogando gasolina no Oriente Médio, agora responsabiliza Biden pelo conflito atual em Gaza. Ele chamou o presidente Biden de “palestino ruim” por não ter pulso firme na guerra entre Israel e Hamas. Já segundo Biden, “nós salvamos Israel” e seu plano de paz seria apoiado por grande parte da comunidade internacional.
“JANELA ESCURA E INVERTIDA”
Como a eleição nos EUA, a para valer, é no colégio eleitoral, ou seja, é decidida nos estados-Pêndulo, e Trump, segundo a CNN, lidera em Nevada, Arizona, Michigan, Pensilvânia e Carolina do Norte e está empatado em Wisconsin, o debate certamente não alterou essa tendência.
O que torna mais grave a descrição feita pela chefe da campanha de Biden sobre o que representa Trump. “Do outro lado do palco estava Donald Trump, que ofereceu uma janela escura e invertida sobre como será a América se ele voltar à Casa Branca: um país onde as mulheres são forçadas a implorar pelos cuidados de saúde que necessitam para ficar vivas. Um país que coloca os interesses dos bilionários acima dos trabalhadores. E um ex-presidente que não uma, nem duas, mas três vezes, não prometeu que aceitaria os resultados de uma eleição livre e justa em novembro”
Ao portal progressista Common Dreams, um analista advertiu que “não está parecendo bem. E o que estou dizendo é que você está iludido se acredita que Joe Biden, nesta fase de sua vida, é a melhor pessoa que os democratas têm a oferecer contra Donald Trump, contra um fascista.”