300 mil pessoas participaram de protestos em todo o país na terça-feira contra o arrocho de Macron, que pretende reduzir pensões e seguro-desemprego e restringir o acesso às universidades
Cerca de 50 mil pessoas foram às ruas de Paris, e 300 mil por toda a França, atendendo à convocação das centrais sindicais CGT, Solidaires e Force Ovriére, dos estudantes e dos aposentados, na terça-feira (9) para repudiar o ‘presidente dos ricos’ Emmanuel Macros e a “regressão social” sob seu governo. A manifestação ocorreu na véspera da apresentação, pelo regime, de sua deletéria ‘reforma da previdência’, que penalizará ainda mais os trabalhadores e arrochará o seguro-desemprego.
Aos brados de “não estamos reclamando, estamos nos revoltando”, uma multidão percorreu o centro de Paris, partindo de Montparnasse para encerrar na Place d’Italie. Como de costume, a polícia e alguns black blocs tentaram atrapalhar o protesto que, nas palavras do secretário geral da CGT, Philippe Martinez, expressa a “cólera do povo francês” contra o desmonte de direitos e a concentração desmedida de riqueza. As centrais exigem o aumento dos salários, das pensões e dos gastos sociais, como única saída para efetivamente fazer a economia deslanchar. Os atos ocorreram em uma centena de cidades.
A mobilização também foi convocada pelas entidades estudantis Unel (ensino médio) e Unef (universitários), responsáveis por semanas seguidas de ocupações nas escolas, em repúdio à elitização do acesso às universidades cometida com o malsinado ‘Parcoursup’. Partidos de oposição, como os comunistas, a França Insubmissa, verdes e outros, apoiaram o ato, reforçando a conclamação a “deter Macron”.
Sobre o ex-banqueiro Macron – e sua notória arrogância -, o secretário geral da FO, Pascal Pavageau, respondeu que este vai acabar descobrindo que “não pode ficar sozinho, o tempo todo, contra todos”. “300 anos de república e 120 anos de modelo social são mais fortes que uma decisão jupiteriana” daquele que acha que recebeu um “mandato de cinco anos para aniquilar e destruir 120 anos de modelo social”, advertiu. Pavageau convocou ainda a restaurar o direito de negociação coletiva, rasgado por Hollande e Macron.
A convocatória das centrais sindicais também denunciou a desigualdade social e imensa concentração de renda que a política pró-bancos está acarretando. “Em uma década, as dez maiores fortunas francesas viram sua riqueza quadruplicar, enquanto são necessárias seis gerações para que uma família pobre alcance a renda média”. Os sindicatos acusaram o governo Macron de estar a serviço exclusivo dos interesses das corporações e conclamaram os manifestantes a expressarem “a recusa a essa política, que está destruindo tijolo por tijolo o modelo social [francês]”.
Assim, passadas as férias de verão, a França volta a ferver com as manifestações. Passado um ano de governo, a popularidade de Macron – e o ministério – vem definhando, e já há quem considere suicídio político manter-se no seu avariado barco. A mais recente demissão foi de seu ministro de Interior, Gerard Collomb, que considerou que é mais negócio ir tentar a sorte na candidatura a prefeito de Lyon. A debandada – meia dúzia de ministros já se foi – forçou Macron a anunciar uma “remodelação” do governo.
Pesquisas sinalizaram que só 6% dos entrevistados acreditam que a política de Macron irá melhorar sua situação econômica e que o apoio a ele desabou para 31%. Grandes manifestações não cessaram desde a posse de contestar sua política pró-bancos – “a França não está à venda” – e os ferroviários empreenderam durante meses uma enorme resistência à privatização da estatal SNCF.
A tal postura ‘jupiteriana” de Macron foi amplamente debochada nas “Festas para Macron”, muito diferente do ronronar dele diante de Trump na Casa Branca ou do deleite com Ângela Merkel. Recentemente, sua resposta a um desempregado, dizendo que “se atravessasse a rua” conseguiria um emprego, causou grande indignação no país inteiro.
O crescimento da economia francesa continua anêmico, na rabeira da União Europeia, e este ano, até setembro, só haviam sido criados 137 mil empregos, contra 320 mil durante todo o ano passado. As centrais sindicais – menos a CFDT, vagamente ‘socialista’ à moda Mitterrand no passado e agora entusiasta do neoliberalismo – denunciaram que a política de arrocho salarial e concentração de renda, ao reduzir o consumo, bloqueia o desenvolvimento.
Na quarta-feira, a CGT se mostrou contrária ao plano de desmanche da previdência -apresentado pelo governo de Macron, que pretende levá-lo à votação no ano que vem -, posição respaldada na manifestação que exigiu “direito à aposentadoria integral para todos os assalariados a partir dos 60 anos”, idade mínima que foi aumentada para 62 anos em 2010 pelo governo Sarkozy. Macron quer 62 anos de idade mínima para se aposentar, e mais anos ainda se alguém quiser receber aposentadoria integral: 65 anos. Conforme Catherine Perret, “a CGT não é favorável a este projeto que reduzirá as pensões futuras a um nível próximo da linha de pobreza para muitos”.
ANTONIO PIMENTA