Na época da criação, pelos propineiros, do fundo eleitoral bilionário, de no mínimo R$ 1,75 bi, eles juravam de pés juntos que não tocariam nas verbas da saúde e da educação. Pura balela, típica da atual matilha que comanda o governo e o Congresso Nacional.
Cálculos preliminares [envolvendo apenas três estados] – feitos pelo jornal “O Estado de S. Paulo” – apontam um desvio para a farra de pelo menos R$ 70,3 milhões originalmente destinados para a saúde. O fundo retira 30% das emendas coletivas impositivas que eram destinadas, em grande parte, para despesas com a saúde. Outros setores sociais também serão prejudicados, mas o ônus maior acabou recaindo mesmo sobre o setor de saúde.
Pela lei que substituiu a propina privada por dinheiro sacado do Tesouro, cada uma das 27 bancadas estaduais vai ter que retirar R$ 48,7 milhões do valor originalmente destinado em emendas ao Orçamento que haviam sido assinadas por deputados e senadores e cuja execução pelo governo era obrigatória. Antes da lei, cada uma dessas emendas dispunha de um total de R$ 162,4 milhões que seriam usados em obras e programas sociais. Agora, 30% desse valor será obrigatoriamente destinado ao fundão bilionário.
Como Temer está empenhadíssimo em proteger seus comparsas do Congresso Nacional – boa parte deles investigados pela Lava Jato – com a manutenção de seu foro privilegiado, o governo fingiu desconhecer as perdas já constatadas da saúde, em defesa que a Advocacia-Geral da União (AGU) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última quinta-feira (9). A ação chegou ao Supremo questionando a constitucionalidade do escandaloso fundo. No documento, o governo repete cinicamente a mentira de que investimentos do governo em áreas sociais, como a saúde, não serão prejudicados.
Este valor que será subtraído da saúde para financiar as campanhas não só existe, como está claramente subestimado. Ele deverá ser muito maior quando todos os estados fizerem a redistribuição dos recursos das emendas impositivas. Só no caso do Ceará, por exemplo, os parlamentares alocaram toda a verba impositiva (R$ 162,4 milhões) em apenas uma emenda do FNS, para manutenção de unidades de saúde. Ou seja, neste estado o corte de R$ 48,7 milhões vai recair obrigatoriamente sobre a área da saúde.
Realmente não será somente a saúde a prejudicada pela criação do fundo. Obras de saneamento, de infraestrutura e outras também serão afetadas. A definição mais precisa do valor e de quais setores serão atingidos pelo desvio de verbas para abastecer o fundão será conhecida somente nas próximas semanas, na Comissão Mista de Orçamento (CMO). Esta comissão é que vai alocar as verbas destinadas pelas bancadas.
Os parlamentares da Paraíba, por exemplo, também enviaram R$ 129 milhões para manutenção dos equipamentos de saúde e R$ 33,4 milhões para a construção do sistema adutor do ramal do Piancó pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs). A obra, relacionada à transposição do Rio São Francisco, é tida pelos políticos como fundamental para garantir o abastecimento de água no interior paraibano. Ainda que retirassem toda a verba do Piancó para bancar campanhas, os parlamentares ainda teriam de remanejar mais R$ 15,3 milhões do FNS para atingir a cota de R$ 48,7 milhões como contribuição ao fundo.
Em Santa Catarina, a bancada reservou R$ 42,4 milhões do Orçamento da União no próximo ano para a compra de equipamentos agrícolas, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Mesmo que os parlamentares catarinenses redistribuam toda essa quantia para o fundo bilionário de campanha, pela definição da lei, ainda assim terão de transferir mais R$ 6,3 milhões dos R$ 120 milhões que foram destinados ao Fundo Nacional de Saúde para abastecer o fundo eleitoral.
A proposta original do fundão era do petista Vicente Cândido, mas ela foi “melhorada” no Senado pelo campeão de investigação [o mais investigado], Romero Jucá (PMDB-RR). O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), outro acusado de corrupção, prometeu que a saúde e a educação não seriam afetadas. “Não aceito nada de fonte que mexa um centavo de saúde e educação”, disse ele à época. Como se vê, nada do que diz a quadrilha do PMDB deve ser levada a sério. Jucá, por exemplo, com maior cara e pau, fez coro com Eunício: “A proposta que eu fiz não tira dinheiro da educação, da saúde, de lugar nenhum”.
O escandaloso fundão eleitoral será composto de R$ 1,3 bilhão em emendas coletivas impositivas somados aos R$ 450 milhões advindos do fim da compensação fiscal para TVs na exibição de propaganda partidária. A distribuição das verbas do fundo irá beneficiar principalmente os partidos que mais roubaram nas últimas eleições. Cerca de 70% vão para o PMDB, o PT e o PSDB. Outro tanto vai abastecer os partidos do chamado “centrão”, responsável pelos votos que recentemente salvaram Temer da investigação dos seus crimes. O objetivo, portanto, do fundo que retira dinheiro da saúde e de outros projetos sociais, é manter a tralha que foi eleita – na esteira da eleição de Dilma e Temer – com base na maior roubalheira de toda a história do Brasil.
SÉRGIO CRUZ