O ex-presidente Jair Bolsonaro recebeu e nunca declarou às autoridades uma terceira caixa de joias, avaliadas em mais de R$ 500 mil, que também lhe foram dadas de “presente” pela família real da Arábia Saudita em 2019.
O conjunto de peças de luxo, cuja existência foi revelada pelo Estadão, é composto por um relógio da marca Rolex, de ouro branco cravejado de diamantes, cujo valor de 4 chega a R$ 364 mil.
As outras peças, como a caneta da Chopard, um par de abotoaduras em ouro branco, um anel em ouro branco e um rosário árabe, também tinham diamantes e pedras incrustadas.
Ao todo, o conjunto foi avaliado pelo Estadão em, no mínimo, R$ 500 mil.
O ex-presidente Jair Bolsonaro recebeu o “presente” dos sauditas pessoalmente, em outubro de 2019, quando viajou para o Catar e para a Arábia Saudita. Ele participou de um almoço com o rei saudita Salma Bin Abdulaziz Al Saud.
Ele já falou que tem “certa proximidade” com o filho do rei Salma, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salma, que é a principal figura do regime saudita. Mohammed bin Salma é presidente do Conselho de Assuntos Econômicos e de Desenvolvimento, ministro da Defesa e vice-primeiro-ministro do país.
Do encontro, Jair Bolsonaro voltou para o Brasil carregando a caixa de joias avaliadas em mais de meio milhão de reais e ordenou que fossem incluídas em seu acervo pessoal. Segundo o Gabinete Adjunto de Documentação Histórica da Presidência, isso foi efetivado em novembro de 2019.
Um documento que registra esse encaminhamento, publicado pelo Estadão, demonstra que não houve intermediários na entrega do “presente”, comprovando que Jair Bolsonaro os recebeu pessoalmente, e que ele visualizou a caixa.
O relógio Rolex e as outras joias ficaram guardadas no acervo privado até junho de 2022, quando Bolsonaro pediu para tê-las em mãos. O sistema da Presidência diz que as joias foram encaminhadas “ao gabinete do presidente Jair Bolsonaro” e depois ficaram “sob a guarda do Presidente da República”.
“PRESENTES” MILIONÁRIOS
Essa “terceira caixa” se soma às duas que Jair Bolsonaro tentou embolsar. Um dos estojos já foi devolvido após o escândalo vazar e ele, após dizer que não tinha conhecimento de nenhum presente, admitiu que estava com elas.
Foi revelado que o ex-presidente recebeu de “presente” da família real da Arábia Saudita duas caixas de joias de luxo que foram trazidas para o Brasil através de seu ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque.
Bento Albuquerque não declarou a entrada de nenhum dos pacotes à Receita Federal, o que já configura uma ilegalidade.
A Receita Federal conseguiu identificar um deles, que foi retido. Este pacote, composto por colares e outras joias com diamantes, era, segundo Bento Albuquerque, destinado à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. O conjunto foi avaliado em R$ 16,5 milhões.
Bolsonaro mobilizou três ministérios, as Forças Armadas e seu gabinete presidencial para tentar retirar ilegalmente o pacote milionário sem pagar impostos. Fez no total 8 tentativas de ficar com o “presente”. Os servidores da Receita se recusaram a cometer ilegalidades e o ex-presidente ficou sem o pacote que ganhou de “presente” dos sauditas.
Um outro conjunto de peças de luxo, porém, passou despercebido pela Receita Federal.
Nesse caso, Jair Bolsonaro chegou a se apropriar e ficar ilegalmente com as joias. Esse pacote continha um relógio, cotado em R$ 223 mil, um par de abotoaduras, uma caneta, um anel e um masbaha (espécie de rosário). Tudo era da marca suíça Chopard, conhecida por ser usada entre artistas no tapete vermelho do Oscar.
Documentos registram que, em novembro de 2022, Bolsonaro visualizou o pacote que foi enviado para seu acervo pessoal.
No início, o ex-presidente dizia que não havia nenhuma joia ou ilegalidade. Depois, admitiu que tinha as joias de luxo. Por fim, acabou tendo que devolvê-las ao estado brasileiro por uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU).
Além das joias que entraram no país sem fiscalização e sem pagamento de imposto, Bolsonaro devolveu uma pistola e um fuzil personalizado que recebeu, também, como “presente”, dos sauditas.
No caso das armas, avaliadas em R$ 57 mil, Jair Bolsonaro havia pago os impostos.
PRIVATIZAÇÃO
Na época em que as joias foram introduzidas no país, transcorria o processo de privatização da refinaria Landulpho Alves, da Bahia, o que acabou acontecendo logo depois.
Bento Albuquerque havia feito a viagem ao mundo árabe para acertar a venda da refinaria.
Quem comprou foi o Fundo árabe Mubadala, que possui vários sócios árabes, mas o principal deles é exatamente o governo dos Emirados Árabes que enviou parte dos presentes.
A refinaria acabou sendo vendida para este fundo financeiro por R$ 10 bilhões, quando, na verdade, por ser uma das mais importantes do país, valia o dobro deste preço, R$ 20 bilhões.
Os R$ 16,5 milhões em joias que os membros da equipe de Bolsonaro, chefiada pelo ex-ministro de Minas e Energia, tentaram introduzir clandestina e ilegalmente no Brasil, passa a ser encarada pelos investigadores como forte indício de suborno ou propina em troca do grande desconto dado na compra da refinaria.
SENADO
O senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão de Transparência e Fiscalização, afirmou que existem “indícios fortíssimos de propina” no caso das joias de R$ 16,5 milhões que Jair Bolsonaro recebeu do governo da Arábia Saudita.
Aziz, ao ser entrevistado pelo UOL, disse que “é obrigação da Comissão [de Transparência e Fiscalização] investigar o caso” e que Bolsonaro, o ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, e o ex-chefe da Receita Federal, Julio Cesar Vieira Gomes, serão convocados.
“Eu quero saber do Bolsonaro porque ele recebeu um presente de R$ 16,5 milhões e queria levar para casa”, falou Omar Aziz. As joias milionárias eram para a Presidência, mas Jair Bolsonaro queria embolsá-las para si.
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