Decisão de liberar criminoso do uso de tornozeleira eletrônica se dá às vésperas de novo depoimento do assassino de Marielle, que servia a Rogério Andrade. Crime organizado do Rio comemorou a facilitação de fuga propiciada pelo ‘ministro bolsonarista’
O ministro Nunes Marques, indicado por Jair Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu, monocrática e sigilosamente, retirar a tornozeleira eletrônica do maior criminoso do Rio de Janeiro, o contraventor Rogério Andrade, que controla o crime organizado na Zona Oeste da capital e tinha como seu matador profissional o pistoleiro Ronnie Lessa, preso pelo assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson gomes.
A decisão de Marques foi em um despacho sigiloso na terça-feira (16). Ele tomou a decisão sem ouvir a Procuradoria Geralda República. Ronnie Lessa, que trabalhava como matador de Rogério Andrade, fez recentemente um acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal e abriu quem foram os mandantes do crime político cometido por ele.
ESCRITÓRIO DO CRIME
Ronnie Lessa era, ainda, integrante do “Escritório do Crime”, uma central de assassinatos de aluguel das milícias e de outras organizações criminosas do Rio de Janeiro, e que era comandado pelo ex-PM Adriano da Nóbrega, amigo da família Bolsonaro e controlador da milícia de Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio.
Nóbrega também era pistoleiro de aluguel e foi homenageado por Jair Bolsonaro e por seu filho, o senador Flávio Bolsonaro. O miliciano recebeu das mãos de Flávio Bolsonaro a Medalha Tiradentes, maior comenda oferecida pelo estado do Rio e tinha sua ex-mulher e sua mãe como funcionárias fantasmas no gabinete do filho de Bolsonaro, então deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio.
Nóbrega foi assassinado na Bahia, numa operação de queima de arquivo. O gângster Rogério Andrade já comandava toda a Zona Oeste e promoveu uma série de assassinatos no Rio de Janeiro para controlar os jogos de azar e pontos de bicho em outras regiões nobres da cidade, como a Zona Sul, controlada por Bernardo Bello, outro chefão do crime organizado e que está foragido.
Rogério Andrade foi preso na segunda fase da Operação Calígula, realizada para combater a organização criminosa da família, que é comandada por ele e por seu filho, Gustavo Andrade.
CRIME ORGANIZADO DO RIO
A decisão de Nunes Marques foi a terceira favorável ao chefe do crime organizado do Rio nos últimos dois anos. Em agosto de 2022, o ministro revogou um mandado de prisão contra Andrade. Em junho de 2023, tomou a mesma decisão quanto ao filho dele, Gustavo Andrade, que também tinha sido preso na Operação Calígula.
Chama a atenção da Polícia o fato do ministro Nunes Marques ter tomado uma decisão tão séria, de maneira sigilosa, que tem como consequência a facilitação da fuga de um dos mais perigosos criminosos do Rio. E, mais grave, foi tomada às vésperas de outro depoimento de Ronnie Lessa, que foi segurança particular e matador contratado por Rogério Andrade, à Polícia Federal.
Não há dúvida que Rogério Andrade terá muito mais facilidade de fugir do país, como também poderá agir mais confortavelmente nas práticas de obstrução de Justiça e ameaças às testemunhas. Ele poderá atrapalhar as investigações que estão em andamento sobre a sua organização criminosa. Nunes Marques determinou que Rogério Andrade não precisará mais voltar para casa todos os dias antes das 18h.
FUGA FACILITADA
O Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) havia autorizado a soltura de Andrade no fim de 2022. Ele estava preso desde agosto. O alvará foi expedido após uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que aceitou um pedido de habeas corpus da defesa do criminoso. No despacho, foi determinado o cumprimento de medidas cautelares, como o uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento noturno domiciliar e o comparecimento periódico ao juízo para comprovar suas atividades. Agora essas medidas foram canceladas por Nunes Marques.
O criminoso havia recorrido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o uso da tornozeleira eletrônica, mas o órgão recusou o pedido. A defesa de Andrade havia sustentado que as medidas cautelares já se estendiam por muito tempo, que o bicheiro não descumpriu nenhuma delas e que as investigações do Ministério Público do Rio (MPRJ) contra ele já estavam na fase final.
Os advogados do mafioso, sobrinho do antigo poderoso chefão do bicho carioca Castor de Andrade, alegaram, cinicamente, que as restrições à liberdade do mais perigoso criminoso do país estão impedindo “o bom exercício de sua ativa paternidade”.
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