Alexandre Campanha, um dos gerentes da Vale que foram presos por envolvimento no rompimento da Barragem de Brumadinho que matou 186 pessoas e deixou 122 desaparecidos, afirmou em depoimento que a diretoria da tinha pleno conhecimento dos riscos da barragem.
Ele foi questionado pelas autoridades sobre a ciência do índice do fator de segurança da barragem de 1,09, que seria inferior ao recomendado por alguns especialistas, que colocavam como ideal um fator de segurança 1,3.
Segundo a coluna da jornalista Monica Bergamo na “Folha de S. Paulo, de 01/03, o gerente, “Alexandre Campanha, respondeu que poderia afirmar com certeza e convicção que os dados de avaliação de risco e a probabilidade de ruptura, não apenas de Brumadinho, mas de outras barragens do chamado corredor sul e sudeste, eram de conhecimento dos diretores Silmar Silva e Lúcio Cavalli”.
Alexandre de Paula Campanha, segundo a investigação do MP, foi o funcionário da vale responsável por pressionar os funcionários da TÜV SÜD a assinar laudo de estabilidade da barragem. Além de Campanha, foram detidos no dia 15 de fevereiro: Artur Bastos Ribeiro, Cristina Heloíza da Silva Malheiros, Felipe Figueiredo Rocha, Hélio Márcio Lopes da Cerqueira, Joaquim Pedro de Toledo, Marilene Christina Oliveira Lopes de Assis Araújo e Renzo Albieri Guimarães Carvalho.
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Após o pedido de habeas corpus ter sido aceito pelo ministro do STJ, Néfi Cordeiro, eles saíram da prisão na noite desta quinta-feira (28).
Na decisão, o ministro reconhece haver fortes indícios de que os funcionários da Vale sabiam dos riscos de rompimento e mesmo assim não tomaram as providências cabíveis, mas que a prisão preventiva deles não se justifica, pois colaboram com as investigações. O habeas corpus será ainda avaliado pelo pleno do STJ.
Os suspeitos foram acusados criminalmente pelo rompimento da barragem de Brumadinho, incluindo homicídio qualificado, pelo rompimento da barragem.
De acordo com o juiz Rodrigo Heleno Chaves, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, os oitos funcionários da Vale que foram presos hoje pela Polícia Civil poderiam ter evitado quase todas as mortes decorrentes do rompimento da barragem da empresa.
“Entretanto, ao que parece, os funcionários da Vale assumiram o risco de produzir o resultado”, disse o juiz, referindo-se aos 166 mortos e aos 147 desaparecidos. “Mesmo diante de novos elementos aptos a demonstrar a situação de emergência, não acionaram o PAEBM (Plano de Ações Emergenciais)”.
DEPOIMENTOS
Nos depoimentos, os funcionários da Vale confirmaram que a direção da mineradora tinha conhecimento dos riscos da barragem.
De acordo com o engenheiro Felipe Figueiredo Rocha, durante um evento interno da mineradora, foram apresentados vários problemas na barragem B1 que se rompeu. Segundo ele, os diretores Silmar Silva e Lúcio Cavalli estavam presentes no último dia do painel de especialistas, onde foi realizada uma apresentação resumida dos riscos da barragem.
Felipe citou que, entre os riscos da barragem, as maiores possibilidades eram a liquefação e a erosão interna, motivos apontados pelas investigações como o mote principal do rompimento da barragem.
Ainda no depoimento, o engenheiro disse que foram apresentados os resultados ao comitê de riscos, comandado pelo diretor executivo, Luciano Siani.
Alexandre Campanha confirmou que os diretores Silmar Silva e Lúcio Cavalli participaram do painel e que os relatórios finais eram encaminhados para Lúcio Cavalli e demais diretores operacionais.
Marilene Christina, outra funcionária que foi presa, também confirmou essas informações.
Em depoimento, Joaquim Toledo, gerente da Vale, afirmou que em 2018, reportou ao diretor Silmar Silva à instalação de DHP – drenos horizontais profundos, que servem para drenar a água de dentro da barragem. Esses drenos tiveram problemas, apontados em relatórios técnicos. Isso demonstrava que a barragem estava com problemas, havia mais água do que era seguro e os drenos não davam conta.
Marilene também disse que ficou sabendo de problemas nos DHP’s e afirma que avisou ao diretor Lúcio Cavalli.
TJMG proíbe que Vale retome atividades nas barragens em risco
“Prejuízos financeiros são preferíveis a novas tragédias”, considerou o desembargador.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negou o pedido da Vale para retomar as atividades em barragens cujas estruturas não foram consideradas seguras. O pedido foi negado pelo desembargador Marcelo Rodrigues, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).
A mineradora recorreu de decisão que determinou a paralisação das atividades e do lançamento de rejeitos em barragens em situação de risco. A medida também designava a adoção de medidas como a contratação de novas auditorias externas independentes para real avaliação das condições das estruturas.
Na Primeira Instância, foi determinado que a mineradora apresente relatório acerca da estabilidade das barragens de Laranjeiras/Mina do Brucutu (localizada em São Gonçalo do Rio Abaixo); Menezes II, Capitão do Mato, Dique B, Taquaras (situadas em Nova Lima); Forquilha I, Forquilha II e Forquilha (localizadas em Ouro Preto), das demais estruturas de contenção de rejeitos e outras existentes nos referidos complexos minerários e de quaisquer outras construções que estejam em zona de risco ou atenção (Alarp Zone).
Além, disso, a empresa deverá elaborar e submeter à aprovação da Agência Nacional de Mineração (ANM) e Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) um plano de ação que garanta a total estabilidade e segurança de todos os empreendimentos acima citados, para neutralizar todo e qualquer risco à população e ao meio ambiente.
A decisão ressalta a necessidade de esclarecimento da situação de cada uma das barragens tratadas na ação. “Resulta imprescindível que auditorias externas e confiáveis sejam realizadas antes da retomada da exploração de minério pela agravante”.
Sobre a alegação da Vale de que a decisão lhe traria prejuízos financeiros, o relator do processo afirma que “está convicto de que, por ora, eventuais prejuízos financeiros são preferíveis a novas tragédias”.
A decisão esclarece ainda que as auditorias devem ser realizadas em todas as estruturas, independentemente do método de construção da barragem, e que os relatórios e planos de ação devem ser elaborados com urgência.
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