
O encontro de governadores da região Nordeste, realizado na quinta-feira (14), em São Luís, condenou a tentativa do governo Bolsonaro de retirar os direitos previdenciários dos brasileiros da Constituição Federal e estabelecer o chamado regime de capitalização, por meio da PEC 6/2019. De acordo com a Carta, assinada ao encerramento do encontro, a PEC apresentada pelo governo pretende “retirar da Constituição garantias fundamentais aos cidadãos”.
O documento foi redigido durante o Fórum dos Governadores do Nordeste, no Palácio dos Leões, sede do Governo do Maranhão. Anfitrião do evento, Flávio Dino, destacou que o grupo se posicionou sobre temas que afetam diretamente a população. Dentre eles, a estão a retirada das regras previdenciárias da Constituição; a adoção do regime de capitalização; e medidas restritivas de direitos dos mais pobres, incluindo os trabalhadores rurais e a redução do valor do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
O governador de Pernambuco, Paulo Câmara, também criticou diversos pontos da PEC da Reforma da Previdência. “Tem questões relacionadas à aposentadoria do trabalhador rural e ao BPC (Benefício de Proteção Continuada) que vão contra o interesse da população mais pobre. Isso precisa ser discutido, porque as regras têm que estar maduras e é preciso olhar o Brasil como um todo. Não dá para ver apenas um sentido, como se tudo fosse igual e não tivéssemos um País tão grande, com tantas regiões e com tanta desigualdade”, afirmou o governador pernambucano, listando ainda outros dois pontos do texto questionados pelos gestores nordestinos: a capitalização e a “desconstitucionalização” da reforma.
ORÇAMENTO
Os representantes dos nove estados criticaram ainda a iniciativa da equipe de Paulo Guedes de desvincular as receitas da Saúde e Educação do Orçamento federal.

“Achamos que resultaria num desastre social para o país. Iria haver diminuição de investimentos em saúde e educação, sobrecarregando ainda mais Estados e municípios, que são obrigados a manter suas redes de atendimento, as escolas, os hospitais, as UPAs”, afirmou Flávio Dino, que falou em nome dos demais governadores.
Segundo o governador maranhense, “a desvinculação não produziria nenhum efeito a não ser a eventual diminuição de repasses para Estados e municípios”.
DESENVOLVIMENTO
No encontro, os governadores também defenderam as estruturas de desenvolvimento regional, que estão sob a ameaça de privatização ou extinção. De acordo com a carta, é preciso preservar a existência do Banco do Nordeste, da Sudene e da Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco).
Para Dino os mecanismos regionais “são fundamentais não apenas para o Nordeste, mas para o Brasil, uma vez que superar desigualdades regionais não é um direito dos nordestinos, é um dever do Brasil inscrito na Constituição. Por isso somos contrários a qualquer proposta de privatização ou extinção desses importantes organismos da vida política do Nordeste”.
Segundo ele, o Fórum de Governadores defende o amplo diálogo com todas as esferas de poder: “Nossos Estados têm no Congresso Nacional 27 senadores e 153 deputados federais. O primeiro trabalho é que haja uma sensibilização das bancadas federais em relação a esses pontos”.
“A agenda que apresentamos é de amplo diálogo, com outros governadores de outras regiões também. São pontos de vista que interessam a Nação e outros Estados. E diálogo também com as bancadas federais no Congresso, de modo suprapartidário, e com o governo federal”, acrescentou.
CONSÓRCIO
No Fórum, também foi assinado o protocolo de criação do Consórcio Nordeste. Com o instrumento, os estados nordestinos terão, por exemplo, mais poder de negociar preços, já que serão feitas compras conjuntas, com um volume muito maior. Também poderão ser feitas cooperações policiais muito mais intensas que as de hoje.
A medida foi celebrada pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara. “Com a assinatura do Consórcio Nordeste, teremos condições de atuar com mais inteligência em temas que são muito importantes para o desenvolvimento da região. Teremos mais eficiência e celeridade a partir de agora”, destacou Câmara.
Os governadores defenderam, ainda, o Estatuto do Desarmamento e se mostraram contrários a regras que ampliem a circulação de armas, mediante posse e porte.
Estiveram presentes no Fórum os governadores Flávio Dino (Maranhão), Rui Costa (Bahia), Paulo Câmara (Pernambuco), Camilo Santana (Ceará), João Azevedo (Paraíba), Wellington Dias (Piauí), Fátima Bezerra (Rio Grande do Norte), Belivaldo Chagas (Sergipe) e o vice-governador José Luciano Barbosa da Silva (Alagoas).
Veja a íntegra da Carta dos Governadores do Nordeste:
CARTA DOS GOVERNADORES DO NORDESTE
São Luís (MA), 14 de março de 2019.
Os Governadores dos Estados do Nordeste, reunidos nesta data, em São Luis (MA), manifestam-se à sociedade brasileira, nos seguintes termos:
1. Assinamos hoje o Protocolo que resultará na criação do Consórcio Nordeste, importante instrumento político e jurídico para o fortalecimento da nossa região e para melhorar a prestação de serviços públicos aos cidadãos e cidadãs. Acreditamos que a cooperação assim intensificada resultará em diversas conquistas, por exemplo parcerias na aquisição de produtos e na execução de ações conjuntas em áreas como Segurança Pública.
2. No mesmo sentido de proteção e promoção dos direitos do povo do Nordeste, sublinhamos que vamos dialogar com os 153 deputados federais e 27 senadores dos nossos estados para que não haja qualquer retrocesso quanto a mecanismos essenciais para o desenvolvimento regional, notadamente o Banco do Nordeste, a CHESF e a Sudene.
3. Sobre propostas atualmente em debate no país:
a) Registramos que não concordamos com a ideia de desvinculações de receitas para fazer face às despesas obrigatórias com saúde, educação e fundos constitucionais, que resultariam em redução de importantes políticas públicas. Em vez disso, desejamos discutir realmente o Pacto Federativo, inclusive no tocante à repartição constitucional de receitas e competências.
b) Quanto à Reforma Previdenciária, consideramos que se trata de um debate necessário para o Brasil, contudo posicionamo-nos em defesa dos mais pobres, tais como beneficiários da Lei Orgânica da Assistência Social, aposentados rurais e por invalidez, mulheres, entre outros, pois o peso de déficits não pode cair sobre os que mais precisam da proteção previdenciária. Também manifestamos nossa rejeição à proposta de desconstitucionalizar a Previdência Social, retirando da Constituição garantias fundamentais aos cidadãos. Do mesmo modo, consideramos ser imprescindível retirar da proposta a previsão do chamado regime de capitalização, pois isso pode inclusive piorar as contas do sistema vigente, além de ser socialmente injusto com os que têm menor capacidade contributiva para fundos privados. Em lugar de medidas contra os mais frágeis, consideramos ser fundamental que setores como o capital financeiro sejam chamados a contribuir de modo mais justo com o equilíbrio da Previdência brasileira.
4. Por fim, defendemos o atual Estatuto do Desarmamento e somos contrários a regras que ampliem a circulação de armas, mediante posse e porte de armas. Tragédias como o assassinato da vereadora Marielle e a de Suzano, no Estado de São Paulo, mostram que armas servem para matar e aumentar violência na sociedade. Somos solidários à dor das famílias, destas e de outras tragédias com armas, e é em respeito à memória das vítimas que assim nos manifestamos.
5. Ratificamos nosso empenho conjunto em favor de uma nação justa e soberana, renovando mais uma vez nossa disposição para o diálogo amplo, conducente a dias melhores para o Brasil.