Dos 4.300 aeroportos do mundo, apenas 614 têm algum tipo de operação privada, menos de 15%. Na contramão do mundo, Bolsonaro vai entregar os aeroportos de Congonhas e Santos Dumont, os mais movimentados e rentáveis, à iniciativa privada. Açambarcadores do Galeão (RJ) deram calote na outorga, os de Viracopos em Campinas (SP) devem bilhões à ANAC e bancos públicos e devolveram a concessão, assim como os do aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN)
O governo Bolsonaro decidiu acelerar o processo de privatização de dois entre os mais importantes aeroportos do país. O edital da 7ª rodada de licitações de aeroportos, que governo coloca sob consulta pública a partir de hoje inclui os aeroportos de Congonhas, em São Paulo, e de Santos Dumont, no Rio de Janeiro, os mais movimentados e rentáveis aeroportos do país, considerados as “joias da coroa” do setor. A entrega dos aeroportos para a inciativa privada, de preferência para estrangeiros, deve acontecer até abril de 2022.
O governo espera investimentos nos aeroportos no valor de cerca de R$ 8,8 bilhões durante a vigência da concessão que será de 30 anos.
Serão três blocos com 16 terminais. Um bloco encabeçado por Congonhas com os aeroportos de Campo Grande, Corumbá, Ponta Porã, Altamira, Marabá, Santarém, Parauapebas e o Campo de Marte. Santos Dumont compõe o segundo bloco com os de Jacarepaguá, Uberlândia, Montes Claros e Uberaba. E o terceiro bloco é formado pelos aeroportos de Belém e Macapá.
Na contramão do mundo, o governo dá mais um golpe na infraestrutura aeroportuária, antes controlada pela Infraero, que através do subsídio cruzado garantia os recursos necessários para o funcionamento dos aeroportos espalhados pelo país afora que não dão lucro e não interessam à iniciativa privada.
Segundo Germano Neto, em artigo publicado em dezembro de 2020 no site A Revolução Industrial Brasileira:
“Dos 500 aeroportos mais movimentados de todo o mundo, apenas 39% possuem algum tipo de participação do setor privado. Se formos analisar os 4.300 aeroportos do mundo, apenas 614 têm algum tipo de operação privada, menos de 15%. Esse índice varia muito entre os continentes. A Europa lidera com 43% dos aeroportos com algum envolvimento do setor privado, Ásia sem segundo com 26%, América Latina tem 25%. A África é um dos lugares com menor participação privada, apenas 3% dos aeroportos.
Mas aí você deve estar se perguntando? E os EUA? Bom, os EUA só não perdem para o Oriente Médio. Na América do Norte, apenas 2% dos aeroportos têm alguma participação privada. No Oriente Médio, apenas 1%.”
A falência da política das privatizações no setor de aeroportos teve lances incomuns, como as relicitações, que Bolsonaro vem implementando.
O caso emblemático foi o Aeroportos Brasil Viracopos (ABV) – consórcio formado pelas construtoras Triunfo, UTC e a francesa Egis. que quase foi à falência, tendo mesmo ameaçado interromper suas atividades em 2017. Depois de idas e vindas Viracopos conseguiu entrar em recuperação judicial em 2018. Em dezembro de 2020 a Justiça decretou o encerramento desse processo.
No entanto, restaram dívidas de R$ 2,88 bilhões, principalmente com bancos e governo. Para salvar o aeroporto teve que colocar mais dinheiro, para variar com o aval do Tesouro Nacional. Esse novo processo recebeu o nome de relicitações, uma privatização dentro da privatização, com dinheiro público.
A própria sentença que suspendeu a Recuperação Judicial estabeleceu a relicitação como uma condições obrigatória para sua efetivação. Os débitos com a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) ficarão para ser encerrado também no âmbito da relicitação, e com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), com créditos adiados para outubro de 2023.
A solução natural da quase falência de Viracopos era a o retorno do seu controle acionário para a União. Haveria um prejuízo muito menor, até mesmo regatáveis. O Estado arcaria com todas as dívidas, como na prática assumiu com a relicitação, mas ficava com o aeroporto, que no desdobramento geraria lucros para amortizar as perdas e gerar novos ganhos. Não é por outro motivo que a Aeroportos Brasil vai continuar no negócio.
Outro caso escabroso acontece com o Aeroporto do Galeão no Rio de Janeiro. Depois de dar calotes no pagamento da outorga, pela qual arrematou para si a concessão do aeroporto, desde 2017. O mesmo processo de relicitação entrou “em campo” e renegocia o contrato.
Neste mês de setembro o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, sugeriu a utilização do valor de outorga, em definitivo paga pela concessionária RioGaleão, como forma de construir projetos de mobilidade e acesso ao aeroporto. Em vez desse dinheiro ficar com o Tesouro, como outorga devida, não, a empresa teria de volta parte desse montante para construir projetos previstos no contrato, que a Concessionária deveria executar.
O aeroporto de São Gonçalo do Amarante, no Rio Grande do Norte, também teve a concessão devolvida pelos argentinos que venceram o leilão.