PEC do governo dá pedalada no Fundef, nas pensionistas e em milhares de outras pessoas que esperaram décadas para receber sua dívida, passou por apenas 4 votos. Oposição espera reverter na 2ª votação e, se necessário, no Senado
Em sessão que terminou na madrugada desta quinta-feira (4), a Câmara dos Deputados aprovou, em primeira votação, a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) dos precatórios, chamada pela oposição de ‘PEC do Calote’, relatada pelo deputado Hugo Mota (Republicanos-PB), por 312 votos a favor e 144 votos contrários. Não compareceram à votação 57 deputados. Os parlamentares ainda precisam votar os destaques que foram apresentados ao texto. A PEC também terá que ser apreciada em segundo turno e, se aprovada, seguirá para votação no Senado.
PRESSÕES do PlANALTO
A aprovação apertada, quatro votos a mais do que o mínimo necessário, de 308 votos, só foi obtida após muita pressão do Palácio do Planalto e manobras regimentais. Numa dessas manobras, a Mesa da Câmara mudou a regra para autorizar que deputados que estão em Glasgow, na COP 26, pudessem votar. A outra foi a viabilização de uma emenda aglutinativa à PEC que aumenta o prazo de 60 para 240 meses do pagamento de dívidas previdenciárias dos municípios.
O pretexto do governo para dar o calote nos precatórios é o que se que precisava para abrir um espaço fiscal de R$ 91,6 bilhões e, com isso, garantir o Auxílio Brasil de R$ 400.
Os parlamentares de diversos partidos desmascararam a versão do governo esclarecendo que o auxílio, ou mesmo a prorrogação do auxílio emergencial, poderia ser viabilizado por uma simples Medida Provisória (MP), autorizando a abertura de crédito extraordinário, que, segundo os oposicionistas, seria aprovada por consenso.
Segundo a oposição, a insistência do governo na PEC do Calote, além de desrespeitar os milhares de credores, teria outros objetivos escusos, como a liberação de R$ 10 bilhões para a chamada emenda do relator, que estão sendo usados com fins eleitoreiros. O calote nos aposentados, pensionistas, trabalhadores, professores e demais beneficiados de decisões judiciais transitadas em julgado gerará R$ 44,6 bilhões de folga orçamentária.
A oposição não votou unida na questão. Enquanto PSB, MDB, Cidadania, Rede, PV, PCdoB, PT e PSOL recomendaram a rejeição da PEC. No caso do PSB, mesmo com orientação em contrário, dez parlamentares votaram a favor da proposta.
ORÇAMENTO SECRETO
A PEC dos precatórios muda o cálculo da inflação que baliza o teto de gastos e cria mais R$ 46,7 bilhões no Orçamento. Destes R$ 91 bilhões, R$ 50 bilhões iriam para o pagamento do Auxílio Brasil — o programa que substituirá o Bolsa Família. Outros R$ 24 bilhões seriam gastos com o reajuste do salário mínimo e de benefícios previdenciários pela inflação. Há uma sobra de R$ 10 bilhões, que seria usada, segundo a oposição, no chamado Orçamento Secreto.
Uma das pedaladas mais denunciadas na sessão foi a fatia dos precatórios da União com estados decorrentes do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, o Fundef. Pedaladas desse tipo, que afrontam as normas orçamentarias e desrespeitam decisões judiciais, podem levar ao impeachment da presidência, como já ocorreu em outras ocasiões no Brasil.
Dos 89 bilhões de reais em precatórios que o governo tem de pagar no ano que vem, quase 16 bilhões correspondem ao fundo. Os governos estaduais que têm recursos a receber são Bahia, Pernambuco e Ceará – e não concordam com o ‘calote’. Com o calote do governo, as dívidas ligadas ao Fundef serão pagas da seguinte forma: 40% em 2022, 30% em 2023 e 30% em 2024.