A Câmara dos Deputados promoveu na terça-feira (15), Dia do Professor, uma Comissão Geral que fez um amplo debate sobre a situação das universidades públicas, dos institutos federais e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O encontro reuniu representantes de movimentos sociais e segmentos do setor educacional, para analisar os ataques do governo Bolsonaro ao ensino superior e o contingenciamento orçamentário.
Entre os temas abordados, a intenção do Ministério da Educação de submeter as universidades a metas e indicadores de desempenho, típicos da iniciativa privada, as restrições orçamentárias que ameaçam o funcionamento e a existência de instituições como o CNPq com a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e o programa Future-se.
O deputado Bacelar (Podemos-BA), autor do requerimento para a Comissão Geral, condenou as restrições orçamentárias e o que chamou de uso ideológico do Ministério da Educação. Ele ressaltou que, com a chegada de Abraham Weintraub à pasta “começaram a surgir ataques à educação superior do Brasil”. “Está nítido como o MEC tem se pautado apenas por temas rasos de uma polêmica ideológica que sustenta esse governo”, criticou.
“Uma das primeiras medidas tomadas foi anunciar o corte de recursos destinados às universidades e institutos federais que, segundo ele (Weintraub), não apresentassem o desempenho acadêmico esperado e, ao mesmo tempo, ‘promovessem balbúrdia’ em seu campus. O país está sendo empurrado para o mais profundo obscurantismo”, disse.
Bacelar lamentou também os cortes orçamentários nas bolsas de pesquisa. “Sei do problema do corte das bolsas e sei agora da tentativa de fundir Capes e CNPq. Mas acima de todos esses problemas, sem dúvida, o problema maior é a transformação do Ministério da Educação em uma ferramenta ideológica”, acrescentou.
A atuação do governo em relação ao setor recebeu duras críticas dos participantes da comissão geral que denunciaram a existência de um incessante ataque às estruturas existentes sem apontar um caminho que traga avanços.
O presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Carlos Salles, avaliou que os que veem a universidade pública “como um negócio” são incapazes de enxergar o alcance que a produção científica tem para o desenvolvimento do país.
“O parlamento deve ver o perigo presente nas atuais ameaças à Universidade. Com tais ameaças, correm perigo os valores, os princípios e os fundamentos que lhes servem, dia a dia, para fazer de nossa sociedade uma nação altiva, livre, autônoma, na qual o bem-estar social garanta a todos o exercício mais livre da cidadania”, afirmou.
Vice-presidente da Academia Brasileira de Ciências, Helena Nader disse que Abraham Weintraub não pode considerar as críticas como um conflito entre direita e esquerda, nem atacar conquistas como a dedicação exclusiva para professores, classificados pelo ministro de “zebras gordas”.
“Eu me senti ofendida, ministro, eu lhe respeito e eu quero respeito, porque eu dou a vida, nos meus 71 anos, pela universidade. Não faço bico em nenhum lugar”, ressaltou Nader.
Segundo a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que falou em nome da liderança da Minoria, o corte de verbas imposto às instituições é consequência de uma opção política, que vem se arrastando desde o governo (Michel) Temer e tem seu “coroamento nefasto” com Bolsonaro.
“O que temos hoje no Brasil é uma visão terraplanista de, lamentavelmente, afastar o desenvolvimento científico e tecnológico das prioridades do país, reduzindo o Brasil – de grande potencial educacional para desenvolver o seu povo – a uma colônia de quinta categoria completamente submissa aos interesses das potências do norte”, assinalou.
Alice Portugal lembrou que, em março deste ano, o governo federal fez um corte de 30% nos recursos de custeio e investimento no ensino superior. Do total de recursos que foram contingenciados, houve a devolução de apenas R$ 1.99 bilhão, em setembro, que não resolveu o problema das universidades e dos institutos federais.
Para o deputado Márcio Jerry (PCdoB-MA), as restrições orçamentárias levaram as universidades públicas e institutos federais a uma situação muito grave e as previsões para o ano que vem são sombrias. O parlamentar recomendou que as mobilizações em defesa da educação, que entidades ligadas ao setor realizaram este ano em todo o país, sejam reforçadas.
“Acho que das mensagens que ouvimos aqui, constatações, os dados, todos eles atestam que nós temos uma crise grave e um ataque sistemático contra a educação em nosso país, em todos os níveis. Contra a pesquisa, contra a ciência, contra as universidades, contra os institutos de educação. Isso é muito grave”, observou.
Os reitores presentes criticaram o programa “Future-se”, manobra apresentada pelo Ministério da Educação para mascarar os contingenciamentos das verbas. Segundo o reitor da Universidade Federal da Bahia, João Carlos Salles, o governo trata as universidades como se elas fizessem parte de um negócio que deve ter como meta obter resultados financeiros.
A reitora da Universidade de Brasília, Márcia Abrão, disse que a proposta fere a autonomia universitária, sendo inconstitucional.
Alguns participantes pediram apoio à Proposta de Emenda à Constituição (PEC 24/19), da deputada Luisa Canziani (PTB-PR), que permite às universidades públicas usarem seus recursos próprios – arrecadados por meio de ampliação de serviços, doações ou convênios – fora do limite do teto de gastos anual instituído pela emenda constitucional 95.
WALTER FÉLIX