Desastre na economia do país colocou mais 23 milhões sem ter como se alimentar. Em 2018, eram 10,3 milhões nessa situação. Desatinos do Planalto fizeram a insegurança alimentar atingir 125,2 milhões de pessoas
O mandato de Jair Bolsonaro vai chegando ao fim e o seu maior legado foi transformar o Brasil no país da fome. Um levantamento divulgado na manhã desta quarta-feira (08) mostra que, atualmente, 33,1 milhões de brasileiros estão passando fome, isto é, não estão comendo diariamente. Em 2018, a população em situação de fome era de 10,3 milhões.
Os dados são do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan).
No primeiro levantamento, divulgado em abril de 2021, a Rede Penssan apontou que o número de brasileiros que não tinham o que comer era de 19 milhões.
QUADRO PERVERSO
“O país regrediu para um patamar equivalente ao da década de 1990”, destacou a rede ao divulgar o resultado de seu segundo inquérito. “A continuidade do desmonte de políticas públicas, a piora no cenário econômico, o acirramento das desigualdades sociais e o segundo ano da pandemia da Covid-19 tornaram o quadro desta segunda pesquisa ainda mais perverso”, enfatizou a entidade.
“O país regrediu para um patamar equivalente ao da década de 1990”, destacou a rede ao divulgar o resultado de seu segundo inquérito. “A continuidade do desmonte de políticas públicas, a piora no cenário econômico, o acirramento das desigualdades sociais e o segundo ano da pandemia da Covid-19 tornaram o quadro desta segunda pesquisa ainda mais perverso”, enfatizou a entidade.
A pesquisa foi realizada entre novembro de 2021 e abril de 2022 a partir de entrevistas em 12.745 domicílios das 27 unidades da federação, tanto em áreas rurais quanto urbanas.
Pela metodologia, os mais de 33 milhões de brasileiros passando fome se enquadram na categoria de insegurança alimentar grave – quando faltam alimentos para os moradores em um domicílio.
MAIS DA METADE DOS BRASILEIROS SOFREM ALGUM GRAU DE INSEGURANÇA ALIMENTAR
A insegurança alimentar, que mede os que vivem em situação de insegurança moderada e leve, atingia 116,8 de brasileiros no levantamento anterior, contudo, hoje esta é uma realidade para um contingente de 125,2 milhões de brasileiros. Isso corresponde a 58,7% da população do país. Na comparação com 2020, a insegurança alimentar aumentou em 7,2%. Já em relação a 2018, o avanço chega a 60%.
Em grau leve de insegurança, há preocupação e incerteza sobre o acesso aos alimentos e queda na qualidade dos alimentos consumidos. Na moderada, há redução quantitativa e ruptura dos padrões de alimentação.
Em situação ideal de segurança alimentar, todos os membros da família têm acesso pleno e regular a alimentos de qualidade sem comprometer outras necessidades essenciais. Isso é uma realidade para apenas 41,3% dos brasileiros.
GOVERNO BOLSONARO É RESPONSÁVEL PELO AUMENTO DA FOME
“As medidas tomadas pelo governo para contenção da fome hoje são isoladas e insuficientes, diante de um cenário de alta da inflação, sobretudo dos alimentos, do desemprego e da queda de renda da população, com maior intensidade nos segmentos mais vulnerabilizados”, aponta o grupo de entidades responsável pelo estudo. A inflação oficial do país está batendo as caso dos dois dígitos há 12 meses e espalhada por todos os bens de consumo, mas sobretudo os alimentos. De acordo com o, a inflação acumulada da cesta básica chega a 103%.
Embora tenha disparado no contexto da pandemia, as causas para o aumento da fome não podem ser creditadas apenas ao Covid-19.
“A pandemia surge neste contexto de aumento da pobreza e da miséria, e traz ainda mais desamparo e sofrimento. Os caminhos escolhidos para a política econômica e a gestão inconsequente da pandemia só poderiam levar ao aumento ainda mais escandaloso da desigualdade social e da fome no nosso país”, apontou Ana Maria Segall, médica epidemiologista e pesquisadora da Rede PENSSAN.
Ela afirma que um dos detalhes que chama a atenção é que o percentual de famílias em insegurança alimentar leve caiu de classe social nesse período de pandemia. “E com essa queda vêm as complicações disso: o endividamento, a fome. Vivemos um grande empobrecimento da população”. O retrato dessa situação, segundo Segall, “são aquelas imagens que vemos em reportagens: pessoas atrás de caminhão de osso, buscando alimentos nos lixões6”, lembra.
Para a pesquisadora, a parte mais dolorosa da pesquisa foi ver como a fome atinge mais as casas onde há três ou mais pessoas abaixo de 18 anos – em um em cada quatro desses domicílios (25%), há fome. Quanto menor a faixa etária da fome, mais repercussões ela vai causar, e prejuízos a longo prazo. Estamos falando de crianças que vão levar essas sequelas para o resto da vida”, completa.
Além de uma política econômica que promove a inflação, o arrocho e o desemprego, há o desmonte das políticas de atendimento da população em situação de vulnerabilidade. Esta semana, revelou-se que o governo federal praticamente zerou o orçamento do principal programa de aquisição de alimentos da agricultura familiar, o Alimenta Brasil, voltado para a compra da produção agrícola de famílias e doação a pessoas em situação de insegurança alimentar.
Para o economista Francisco Menezes, que é analista de políticas da ActionAid e ex-presidente do Consea (Conselho Nacional Segurança Alimentar e Nutricional, órgão extinto em 2019 por Bolsonaro), a fome no país chegou a níveis inaceitáveis.
“Em 2020 já eram números grandes, ruins. Mas agora eles são assustadores. O que nós vemos é um quadro de desigualdade que impera no país, seja de raça, cor, gênero ou regional”, pontuou.
Ele cita, ainda, as políticas para proteção social que foram desmontadas ou remodeladas, de acordo com ele, “de forma equivocada”.
“O governo acabou o Bolsa Família e criou o Auxílio Brasil, que tem muitos problemas: ele é confuso, difícil de entender porque mistura vários programas separados, o que o torna muitas vezes inacessível”.
PANORAMA
- Famílias do Norte (25,7%) e Nordeste (21%) passam mais fome;
- 18,6% dos domicílios em situação de grave insegurança alimentar são de áreas rurais; 60% sofrem insegurança em algum grau;
- Saltou de 10,4% em 2020 para 18,1% em 2022 entre os lares comandados por pretos e pardos.
- Atinge 19,3% dos lares sustentados por mulheres e 11,9% por homens.