HP 04/11/2016
O governo Temer está comemorando que amealhou R$ 50,9 bilhões em impostos e multas de cerca de 25 mil pessoas e 10 empresas que escondiam dinheiro sujo no exterior sem declará-lo às autoridades. Para isso anistiou os crimes de sonegação e evasão de divisas cometidos por essa gente. Um belo exemplo que o governo dá para aqueles que trabalham e pagam seus impostos em dia no Brasil. A mamata é tão escandalosa que integrantes do círculo íntimo do Planalto, como Geddel Vieira Lima (ministro da Secretaria de Governo de Temer), por exemplo, estão insistindo na mudança da lei para que eles próprios e seus parentes também possam lavar dinheiro roubado, já que funcionários públicos estão proibidos de fazê-lo. O valor total que foi repatriado – o que não quer dizer que entrou no país – foi de R$ 169,9 bilhões.
O prazo para pessoas e empresas com recursos camuflados no exterior receberem a anistia e se beneficiarem com descontos na multa terminou na segunda-feira (31). O auditor da Receita Federal, Mauro José Silva, denunciou, em entrevista ao site de economia IHU On-Line (Instituto Humanitas Unisinos), que toda essa desavergonhada lavagem de dinheiro ilícito e a absurda anistia dada pelo governo aos espertalhões que esconderam dinheiro fora do país eram desnecessárias porque a partir do próximo ano, o Brasil terá acesso às informações financeiras dessas pessoas, por conta de uma série de acordos bilaterais e multilaterais assinados com outros países, de modo que poderia tributá-las sem conceder anistia aos crimes cometidos. O auditor revelou que a lei não obriga a entrada do dinheiro, apenas cobra a multa e o imposto.
Segundo o auditor, esse tipo de legislação vai piorar a arrecadação porque “abala a moral do contribuinte e o desestimula a recolher voluntariamente suas obrigações tributárias”. É, portanto uma lei que premia os bandidos e estimula a sonegação. A estimativa é de que atualmente a sonegação de impostos seja da ordem de 500 bilhões de reais, mas, segundo Mauro Silva, “não existe nenhuma campanha federal para evitar esse tipo de prática”. “Vemos alguma notícia na imprensa sobre isso ou vemos o governo querendo combater a sonegação?”, indagou. “Enquanto isso, fala-se em PEC 241 e em lei de repatriação, mas o governo não se envolve no combate à sonegação”, denuncia. De acordo com o funcionário da Receita, se 25% da sonegação fosse combatida, seria possível arrecadar 92 bilhões de reais. “Poderíamos ainda fazer isso em três anos, mas o problema é que o combate à sonegação é algo de uma vez só, ou seja, é para sempre, porque isso eliminaria a sonegação”, destacou.
Além da pressa em arrecadar dinheiro sujo para entregá-los aos bancos, como já anunciou Henrique Meirelles, o que os integrantes do governo Temer, assim como os de Dilma também – afinal a lei de repatriação [que de Pátria não tem nada] foi gestada na administração petista – visa legalizar dinheiro ilícito. “Não sejamos ingênuos”, diz Mauro Silva, “porque os políticos sabiam que o país iria alcançar essas pessoas a partir dos dados de acesso à informação no próximo ano. E justamente por isso que fizeram pressão para que a lei fosse aprovada, para que eles pudessem trazer esses recursos em condições vantajosas”. Só não abriram o jogo porque estavam pressionados pela Lava Jato. Mas agora perderam a vergonha e querem derrubar o artigo 11, segundo o qual eles e seus familiares não podem se aproveitar dos benefícios da lei.
Outro ponto destacado pelo auditor fiscal como escandaloso é que governo justifica a legislação defendendo os bandidos. Essa defesa foi elaborada por Joaquim Levy. A justificativa diz que as pessoas que têm dinheiro não declarado no exterior foram praticamente obrigadas a enviar esses recursos para fora porque, “nos últimos anos, o Brasil teve vários planos econômicos e passou por um momento de instabilidade”. Então a lei garantiria a possibilidade de reverter essa situação, permitindo que as pessoas declarassem o dinheiro até então não declarado. “Essa justificativa é algo que me espanta muito, pois estamos em um país no qual o ministro de Estado permite que uma lei conceda anistia a pessoas que cometeram crimes e o Estado faz a defesa de quem cometeu esses crimes, porque ninguém concede anistia se não há crime”, denunciou Mauro Silva.
Segundo ainda o auditor, a lei induz a saída de recursos. Isso porque quem remeteu o dinheiro para o exterior, agora poderá regularizá-lo e pagará 15% de imposto, mais 15% de multa, ou seja, 30%, mas dado o valor do dólar em 31 de dezembro de 2014, esses 30% viram 24%. Por outro lado, aquele sonegador que manteve o dinheiro no Brasil pagará 27,5% de alíquota máxima da tabela progressiva do Imposto de Renda, pagará mais 20% de multa e mais uns 24% de juros de mora, ou seja, algo em torno de 40% sobre o valor sonegado. Então, se a pessoa tivesse sonegado e mantido o dinheiro no Brasil, hoje, comparecendo espontaneamente à Receita, ela pagaria 40% e não seria anistiada de nenhum crime. Mas, segundo Mauro Silva, aqueles que remeteram o dinheiro ao exterior pagarão menos – 24% – e serão anistiados de todos os crimes que cometeram. “O que você acha que os sonegadores vão fazer daqui para frente? Começarão a enviar o dinheiro para fora, porque é mais vantajoso, dado que depois eles poderão ser anistiados”, arrematou Silva.
SÉRGIO CRUZ