O governo federal publicou nesta quarta-feira (13) uma Medida Provisória que muda regras para distribuidoras de energia com problemas financeiros, colocando a conta para o consumidor pagar. A MP socorre o caixa da distribuidora Amazonas Energia e cobre pagamentos que a empresa deve fazer para termelétricas que eram da Eletrobrás, empresa privatizada pelo governo Bolsonaro.
Na última segunda-feira, a Eletrobrás comunicou a venda de 13 usinas termelétricas para a empresa privada Âmbar por R$ 4,7 bilhões. Das usinas vendidas, exceto a de Santa Cruz no Rio de Janeiro, todas as outras vendem energia para a Amazonas Energia, a distribuidora de energia do Estado do Amazonas, também entregue à iniciativa privada durante a privatização da Eletrobrás.
No entanto, a Amazonas Energia é deficitária e precisa comprar das termelétricas mais energia do que consegue pagar. Isso vem acontecendo desde novembro.
De acordo com a MP, os contratos de fornecimento de energia das usinas térmicas com a Amazonas Energia serão pagos pela Conta de Energia de Reserva, administrada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Essa conta é financiada por todos os consumidores de energia elétrica, sejam eles do mercado regulado (pequenos consumidores), do mercado livre (grandes consumidores) ou autogeradores.
Segundo Luiz Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores, somente uma parte da energia fornecida à Amazonas Energia é subsidiada pelos consumidores. Com a nova medida provisória, 100% da energia comprada pela distribuidora das usinas térmicas que agora pertencem à Âmbar será financiada por consumidores de todo o país.
“Quando você tira todos os custos das térmicas e coloca na conta de reserva, todos os consumidores pagam. Porque, antes, quando ela estava na CCC, não era o custo integral. Parte dos custos das térmicas ficava com os consumidores da Amazonas Energia”, explicou Barata.
Além disso, a MP também inclui os custos da Amazonas Energia com questões regulatórias, como ajustes para evitar perdas de energia devido a “gatos”, que serão divididos entre os consumidores de todo o país, por meio da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC). Segundo Luiz Barata, essa mudança aumentará os custos da CCC em mais de R$ 1 bilhão. A CCC é uma parte dos subsídios que já estão embutidos na conta de luz dos consumidores.
A medida do governo também prorroga por 120 dias as flexibilizações que permitem à Amazonas Energia registrar perdas e dificuldades econômicas sem sofrer punições. O ministro de Minas e Energia explicou que, sem essas flexibilizações, é improvável que a distribuidora consiga alcançar um nível de sustentabilidade econômica no curto prazo.
ÂMBAR E IRMÃOS BATISTA
Executivos do setor afirmam que a exclusão desses passivos do caixa da Amazonas Energia fez com que uma empresa praticamente falida se tornasse atraente para investidores. Além da Âmbar, outras empresas interessadas são a Equatorial, que opera no Amapá, e a Energisa, que controla distribuidoras em 11 estados.
A Âmbar Energia, cujos proprietários são os irmãos Joesley e Wesley Batista (do Grupo J&F) sairá diretamente beneficiada pelo texto da MP. Os irmãos assumiram o risco de não receber o pagamento desses contratos ao fazerem a oferta, responsabilidade que anteriormente era da Eletrobrás. Além das usinas, a Âmbar já demonstrou interesse em comprar a própria distribuidora Amazonas Energia.
O presidente em exercício Geraldo Alckmin e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, assinaram a Medida Provisória. Mais tarde, o governo enviou ao Congresso Nacional a exposição de motivos, um documento formal que explica a necessidade das novas normas. De acordo com o texto, Silveira propôs a MP em 7 de junho. O texto só se tornou público após ser publicado na quinta-feira, dia 13.
O cálculo do governo é que a medida geraria uma “economia” de R$ 2 bilhões por ano na CCC – subsídio que está na conta de luz, onerando principalmente os consumidores que compram energia da distribuidora, ou seja, residências e pequenos comércios.
Para Barata, o governo está tentando resolver o problema da Amazonas Energia usando o dinheiro dos outros consumidores. “É uma solução em que quem paga são os outros”, disse ele, que foi secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia e dirigiu o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico). “Reconhecemos que a Amazonas Energia é um problema que precisa ser resolvido, mas por que devemos ser nós a pagar pela solução?”, questionou.
AMAZONAS ENERGIA
A Eletrobrás detinha a concessão no Estado, mas, com a saída da companhia do segmento de distribuição, durante o processo de privatização, o contrato foi assumido pelo Consórcio Oliveira Energia, em 2019, pelo valor simbólico de R$ 1 (um real).
“Mesmo após o processo de desestatização e garantido o atendimento aos dispositivos legais, regulamentares e contratuais aplicáveis, a distribuidora não conseguiu atingir níveis sustentáveis do ponto de vista econômico-financeiro”, afirma a Aneel em relatório de 2023.
A extinção do contrato chegou a ser recomendada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em novembro de 2023, depois de verificar que a empresa não tem condições financeiras de manter a concessão. A empresa tem uma dívida de R$ 10 bilhões.
O processo segue no Ministério de Minas e Energia, que pode decidir acatá-lo ou não. A flexibilização das regras para a Amazonas Energia, publicada nesta quinta-feira (13), foi uma forma de garantir a continuidade da prestação de serviços à população, ameaçada pela situação econômica da concessão.