Desde 2019, o governo Bolsonaro sabia dos riscos do incêndio no Hospital Federal de Bonsucesso (HFB), no Rio de janeiro, que matou três pessoas na terça-feira. Ao invés de tomar alguma medida para prevenir as chamas, no hospital que mais realizada atendimentos do SUS no estado, o governo Bolsonaro resolveu cortar 11% da verba de custeio da unidade.
Um relatório produzido em abril de 2019 por uma equipe de engenheiros, a pedido do Ministério da Saúde, constatou diversos problemas na estrutura de combate a incêndios do HFB. O relatório foi usado como base para que, em setembro de 2019, a Defensoria Pública da União cobrasse providências da direção do HFB para ajustar o hospital às normas de segurança. A defensoria solicitou ainda ao Corpo de Bombeiros que fizesse uma vistoria na unidade de saúde.
“Depois disso, a Defensoria fez seu papel de reforçar reiteradamente a necessidade de providência urgente aos órgãos competentes”, informou, em nota, a Defensoria. “Sobre as razões de as demandas não terem sido atendidas, não temos como responder. Sugerimos que as perguntas sejam encaminhadas aos responsáveis pela gestão do HFB”.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB), que presidiu a Comissão Externa da Câmara Federal para vistoria dos hospitais federais do Rio de 2017 e 2019, se dirigiu ao Hospital Federal Bonsucesso no início desta tarde, onde ela também trabalhou, como médica, até 1991. A deputada disse que, nas vistorias, problemas estruturais no prédio já haviam sido apontados por funcionários.
“A comissão identificou falta de recursos humanos e de manutenção nos prédios. É um problema grave de gestão e de investimentos”, explicou Jandira.
ARROCHO E SUCATEAMENTO
Desde o início da gestão Bolsonaro, o governo federal reduziu em 11% o orçamento do HFB. A unidade vem sendo alvo de denúncias de sucateamento e falta de recursos para funcionar.
Dados do Portal de Transparência da União mostram que, entre janeiro e outubro deste ano, o HFB empenhou (ou seja, reservou valores para custear despesas já contratadas) R$ 145,3 milhões e efetivamente pagou R$ 95,16 milhões. O menor valor registrado para este período desde 2015.
Em relação a 2018, a redução é de 11% nos valores empenhados, e de 8,4% se consideradas as despesas pagas até outubro. Os valores citados são nominais, sem correção pela inflação do período.
Dados do Ministério da Saúdemostram que até o fim de maio, 140 dos 375 leitos disponíveis no HFB estavam fechados por problemas variados, como falta de pessoal, equipamentos ou insumos. Na rede federal do Rio, o número de vagas fechadas chegou a 1.243 das 2.803 existentes.
TRAGÉDIA ANUNCIADA
Segundo o presidente do Sindicato dos Médicos do Rio, Alexandre Telles, ao menos desde 2007 os profissionais de saúde denunciavam problemas elétricos e risco de incêndio no Hospital de Bonsucesso.
“As primeiras denúncias são de 13 anos atrás, e a única providência até hoje foi a compra de extintores de incêndio, no ano passado. A fiação nunca foi trocada”, criticou o médico, que tinha um compromisso no hospital na manhã desta terça-feira e chegou à unidade quando o incêndio começava.
“Além dos problemas na estrutura do prédio, faltou treinamento e coordenação para salvar os pacientes. Os funcionários não sabiam para onde levar os pacientes, porque nunca tinham tido treinamento, não havia um protocolo”, afirmou. “Também faltaram macas. Muitos pacientes foram removidos em cadeiras ou, pior, sobre lençóis”, contou.
Segundo ele, esses problemas não são exclusivos do Hospital de Bonsucesso. “Nenhum dos seis hospitais federais do Rio tem a documentação exigida pelos bombeiros, assim como outros hospitais públicos do Rio também não têm”, disse.
“A direção do Hospital de Bonsucesso é trocada com muita frequência, o diretor nem teve tempo de conhecer o hospital e já é substituído, e são todas indicações políticas, nunca técnicas”, reclamou.