“Esta doença é controlada com vacina, não é pra morrer ninguém de febre amarela”, destacou o epidemiologista André Ribas Freitas, da SBD/A
“O Ministério da Saúde cometeu um erro grave ao anunciar o fim da epidemia de febre amarela em setembro do ano passado”, considerou o epidemiologista consultor da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses (SBD/A), André Ricardo Ribas Freitas, em entrevista à Hora do Povo. Para ele, o ato diminuiu os esforços de vacinação. “Declarar o fim da epidemia significou diminuir o nível de atenção com a doença, e isso foi um erro grave, uma precipitação”, disse.
De acordo com o último balanço divulgado pelo Ministério da Saúde, no período de 1º de julho de 2017 a 6 de fevereiro deste ano, houveram 353 casos confirmados da doença e 98 mortes. A falta de agilidade do governo no combate à doença e a subestimação do vírus, contribuíram decisivamente para a epidemia atual. Entre os erros estão problemas de planejamento, falta de cobertura vacinal e falta de senso de urgência diante de evidências de que o vírus se aproximava das regiões mais populosas do país.
Freitas, que é doutor em Epidemiologia pela UNICAMP e professor da faculdade de Medicina de São Leopoldo Mandic, de Campinas, também destacou que “qualquer epidemiologista ou infectologista que conhece a história da febre amarela sabe que o que tinha acontecido na verdade era o fim de uma estação de febre amarela, mas permaneceram todos os meses ocorrências de primatas”.
Para epidemiologista, “se o Ministério tivesse assumido, no segundo semestre do ano passado, a intensificação da vacinação nas áreas de recomendação, ou seja, em todo o estado de Minas e outras regiões, teria evitado muitas mortes. Mas o Ministério deu uma sinalização inadequada de diminuição de risco, tanto é verdade que o estado de São Paulo está sofrendo mais este ano do que no ano passado, assim como várias regiões de Minas. Ao invés de declarar o fim do surto e comemorar, devia ter sido feito um esforço de vacinação”.
A comparação, feita pelo Ministro da Saúde, Ricardo Barros, das ocorrências do ano passado com as deste ano, também foram criticadas por Andre Freitas, “não se pode fazer isso porque estamos tratando de uma doença que é controlada com vacina, não é pra morrer ninguém de febre amarela, então não dá pra comemorar diminuição de mortes, a gente tem que comemorar se não tivesse nenhuma morte, então diminuição não significa nada. Teve um semestre inteiro do ano passado para trabalhar e o trabalho não foi feito no nível suficiente, senão não estaria tendo ocorrência diária nas áreas que já eram de vacinação obrigatória”.
Já em relação às áreas de Minas Gerais e outras regiões, onde já havia recomendação de vacina, é destacada a falta de estratégia de vacinação para os moradores da área rural, que são a principal população em risco. “A maior ameaça não está na área urbana, está na área rural, e esta é a população que tem mais dificuldade de receber a dose da vacina, então deveria ter havido uma estratégia no segundo semestre de imunizar essa população e não foi feito”, destacou.
Em Minas, a cobertura vacinal contra a febre amarela está em torno de 83,38%. No entanto, 321 municípios ainda não conseguiram imunizar 80% da população, o que corresponde a 37,6% de todo o território mineiro.
FRACIONAMENTO
Ao contrário do que diz o ministro da Saúde, de que existe vacina para toda a população, Freitas destaca que a dose fracionada é uma consequência da falta de vacina, e que é recomendada apenas quando não há estoque de vacina para toda a população. Para ele, “diante de uma situação em que há necessidade do aumento súbito na oferta de vacina, de uma maneira que não há capacidade de produção, está correta esta medida. Mas o ideal é que, ao voltar a produção capaz de cobrir toda a população, que a dose seja feita integralmente”.
“Se você tiver certeza de ter doses suficientes para a cobertura de toda a população o recomendado é aplicar a dose completa. Tanto é verdade que essa vacina fracionada não dá direito ao certificado internacional. Mas como a situação do país agora é uma oferta abaixo da demanda necessária é melhor você cobrir um maior número de pessoas do que deixar gente sem vacinar”, completa.
O especialista também diz que a estratégia de vacinação fracionada não está errada, “o que está errado é que isso foi feito muito tarde, se perdeu um tempo no segundo semestre que foi nobre. Tinha que ter pegado entre julho e dezembro e vacinado a população de risco e intensificar a produção de vacina, mas o Ministério resolveu dizer que estava tudo sob controle”.
VETOR
Sobre a falta de combate ao vetor, ou seja, ao mosquito que transmite a febre amarela, Andre Freitas destacou que desde que “foi criada vacina da febre amarela o controle da doença é feita fundamentalmente desta forma”. Ele explica, que ao contrário da dengue, chikungunya e zica, que são transmitidas pelo aedes aegypti, o mosquito que transmite a febre amarela silvestre, atual epidemia, é um mosquito que vive na mata, por isso não tem como controlar ou fazer o combate ao mosquito, a solução é “proteger as pessoas que vão até aquela localidade”.
CAMILA SEVERO