
Ao mesmo tempo que se utiliza do pretexto de que haveria uma crise nas contas da Previdência e da Seguridade Social para aumentar o desconto dos trabalhadores e reduzir os seus direitos de aposentadoria, Jair Bolsonaro anunciou, no último sábado (30), através de seu twitter, que o “Ministério da Economia estuda reduzir impostos das empresas”. Elas estariam, segundo ele, sendo muito “sobrecarregadas”.
As benesses que ele quer dar às empresas vão atingir as finanças da seguridade, já que, entre os impostos que Bolsonaro pretende reduzir está a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), uma das fontes de receita da Previdência. Ele diz que vai substituir a redução no Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e da CSLL das empresas pela tributação sobre lucros e dividendos que são distribuídos aos acionistas.
A isenção de cobrança sobre lucros e dividendos, que Bolsonaro pretende usar como moeda de troca, é uma excrescência que só existe no Brasil e na Estônia. Essa indecente isenção de imposto da renda dos donos de empresas – enquanto os assalariados são taxados na fonte – já deveria ter sido abolida há muito tempo e não servir como pretexto para o governo oferecer mais benefícios para empresas.
Especialistas, como Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, discordam da proposta do governo e dizem que ela é um erro. “Taxar a empresa é muito mais simples e eficaz e previne sonegação, porque é recolhido na fonte”, argumenta. “Um dos fenômenos de sonegação mais conhecidos em todo o mundo”, diz Maciel, “se chama distribuição disfarçada de lucros”.
Sócios das empresas tenderão a maquiar seus balanços, transformando bens e despesas pessoais em empresariais, para fugir do fisco. Para o ex-secretário da Receita, isso é um “complexo de vira-lata” de Bolsonaro que quer “imitar e trazer para cá tudo o que de ruim é feito por Trump”.
Já há no país uma enorme evasão de receitas da Seguridade Social e Bolsonaro pretende elevá-la ainda mais com sua proposta de reduzir os impostos e contribuições das empresas.
Entre os anos de 2011 e 2019 a Previdência perdeu R$ 1 trilhão, 137 bilhões e 407 milhões em desonerações (fonte: SRF e ANFIP). Praticamente o mesmo valor que Bolsonaro e Paulo Guedes pretendem saquear da Previdência nos próximos dez anos com seu projeto de desmonte.
Veja quanto a Previdência perdeu, nos últimos nove anos, com as desonerações (para 2019, usamos a estimativa da Receita Federal sobre o Orçamento do ano):
- 2011: R$ 66,178 bilhões;
- 2012: R$ 77,006 bilhões;
- 2013: R$ 119,452 bilhões;
- 2014: R$ 139,566 bilhões;
- 2015: R$ 148,948 bilhões;
- 2016: R$ 137,884 bilhões;
- 2017: R$ 141,177 bilhões;
- 2018: R$ 150,415 bilhões;
- 2019: R$ 156,781 bilhões;
TOTAL: R$ 1 trilhão, 137 bilhões e 407 milhões (fonte: SRF e ANFIP).
E ainda, com a Medida Provisória 795, aprovada em 2017, conhecida como Regime Especial para Exploração de Petróleo, as empresas do setor deixarão de pagar em contribuições de R$ 1 trilhão em 20 anos, segundo cálculos da Assessoria Econômica da Câmara dos Deputados. Além, disso, o setor do agronegócio exportador já é totalmente isento de pagamento de contribuições para a Seguridade Social. Mas, Bolsonaro acha que eles estão sendo explorados e quer reduzir ainda mais os impostos dessas empresas.
Se computarmos as sonegações fiscais, veremos que as empresas pagam muito menos do que deviam para a Previdência Social. A dívida dos mil maiores devedores da Previdência soma, em valores corrigidos, R$ 136 bilhões, 627 milhões, 412 mil, 866 reais e 8 centavos. Reparemos que essa é a lista dos 1.000 maiores devedores, pois “a soma dos passivos das empresas junto à previdência remonta cifras da ordem de R$ 450 bilhões” (cf. CPI da Previdência, Relatório Final, outubro/2017, p. 32).
Mesmo com todo esse sangramento em suas receitas, a Previdência Social, ao contrário da narrativa do governo atual, e dos anteriores, se mantém perfeitamente viável economicamente. É o que mostra o estudo “Analise da Seguridade Social em 2017”, feito pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip).
Segundo o estudo, a Seguridade sempre foi superavitária. De 2005 a 2015, suas receitas foram sistematicamente maiores do que as despesas. Elas só foram reduzidas nos anos recentes causadas, não por problemas internos ao sistema, mas sim pela recessão e a estagnação econômica. (Veja gráfico abaixo)
Tanto a Previdência Social tem solidez em suas finanças que, além de todas perdas provocadas pelas desonerações e sonegações, os diversos governos vêm retirando de seus cofres, para pagar juros aos bancos, 20% de suas receitas anualmente desde 1994. É a chamada Desvinculação de Receitas da União (DRU).
E mais do que isso, essas retiradas de receitas foram, inclusive, aumentadas para 30% das contribuições para fins de financiamento da Seguridade Social desde 2016. Os valores retirados estão hoje na casa dos R$ 100 bilhões anuais, valor muito acima do resultado negativo de 54,4 bilhões e 56,8 bilhões auferidos em 2016 e 2017, respectivamente, provocados pela recessão econômica iniciada em 2014.

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