Governo propõe dar verba da Educação e Saúde para bancos

O ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou a medida em entrevista neste domingo, 10

Não quer assaltar só a Previdência

Guedes quer acabar com obrigação constitucional mínima para essas áreas

O ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou que o governo vai apresentar ao Congresso uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que desvincula 100% dos gastos do Orçamento.

Isso significa que a arrecadação de impostos que, pela Constituição, é obrigatoriamente destinada à Saúde, Educação e outros setores, deixaria de existir – ou, mais precisamente, seria destinada a outras coisas.

Atualmente, existem duas vinculações orçamentárias principais:

1) Educação: a Constituição estabelece que a União deve despender com “Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE)” o equivalente a 18% da Receita Líquida de Impostos (que é a receita de impostos menos as transferências constitucionais a Estados e Municípios).

2) Saúde: é obrigatória a aplicação em “Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS)” de 15% da Receita Corrente Líquida (que é a soma de todos os tributos – não só os impostos – menos as transferências constitucionais) do exercício anterior.

Além disso, existem despesas obrigatórias, ou seja, aquelas que o governo não pode, pela Constituição, deixar de pagar:

– as transferências para Estados e municípios;

– a folha de pagamento do funcionalismo;

– as aposentadorias da Previdência;

– as pensões e demais benefícios (inclusive abono salarial e seguro-desemprego);

– os juros da dívida pública.

O que Guedes quer fazer é acabar com a vinculação e com a obrigatoriedade de pagar.

Obrigatoriedade de pagar o quê? Com que obrigatoriedade Guedes quer acabar?

Certamente que não é a de pagar os juros da dívida pública. Até porque ele enriqueceu na especulação com esses juros. Quanto às obrigatoriedades em relação ao povo, que se dane o povo.

Em 2018, os gastos do governo foram, resumidamente, os seguintes:

JUROS: R$ 385,426 bilhões;

AMORTIZAÇÃO (sem rolagem): R$ 336,154 bilhões;

PESSOAL: R$ 293,818 bilhões;

SAÚDE: R$ 109,548 bilhões;

EDUCAÇÃO: R$ 99,448 bilhões.

(Fontes: BC e STN/RREO)

O Orçamento da Previdência (Regime Geral), que legalmente não pertence ao orçamento fiscal, pois tem fontes próprias, pagou aposentadorias, pensões e outros benefícios no total de R$ 587,714 bilhões.

Quanto à previdência dos funcionários federais (Regime Próprio), os pagamentos foram de R$ 79,850 bilhões.

É evidente por que Guedes quer assaltar a Previdência – para não pagar ou reduzir barbaramente os seus pagamentos.

E para que reduzir esses pagamentos?

Para transferir os recursos ao setor financeiro, que acha pouco os R$ 721,580 bilhões que levou em 2018, em juros e amortizações (sem refinanciamento/rolagem).

Porém, não basta.

Guedes quer, também, desvincular os recursos para a Educação e Saúde e desobrigar os pagamentos obrigatórios (pessoal, benefícios, etc.).

Vejamos como Guedes apresentou essa proposta, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”:

Os políticos têm de controlar 100% do orçamento. Os deputados vão entender que, em vez de discutir R$ 15 milhões ou R$ 5 milhões de emendas, vão discutir R$ 1,5 trilhão de orçamento da União, mais os orçamentos dos municípios e dos Estados.”

Como todo vigarista, Guedes acha que todos são otários.

Como se alguém acreditasse que a proposta de Guedes é para beneficiar os políticos…

Um líder governista na Câmara declarou ao mesmo jornal: “Guedes está ‘vendendo ilusão’ ao dizer que dará prestígio ao Congresso com controle total sobre o Orçamento”.

Realmente. O que Guedes está dizendo aos deputados é, resumidamente: ‘se vocês acabarem com a Previdência e tirarem o dinheiro público da Educação, da Saúde, dos Estados, dos municípios e até da folha de pagamento, eu dou esse dinheiro para vocês decidirem o que fazer com ele’.

Dá como, se o dinheiro não é dele?

Bem, não é prestígio que Guedes dará aos parlamentares…

No máximo, ele promete vento – e desgraça política para o resto da vida.

Um economista com espírito prático perguntou: “como os parlamentares podem colocar em outro lugar os R$ 600 bilhões da Previdência ou os R$ 300 bilhões de pessoal?”.

Os parlamentares, geralmente, gostam dos seus mandatos – inclusive, gostam de si mesmos.

Tirar R$ 600 bilhões da Previdência ou R$ 300 bilhões da folha de pagamento, no entanto, não fará com que o eleitorado goste deles, para dizer o mínimo.

Com certeza, trata-se de uma discussão surrealista, pois é tudo irreal. Mas, pela reação no Congresso, os parlamentares não acham razoável que Guedes queira que eles tirem o dinheiro da Educação, da Saúde, etc., etc. – pois são eles que responderão por isso.

Nem, muito menos, o dinheiro dos Estados e municípios.

Pois, segundo disse Guedes, as verbas que a Constituição, hoje, obriga que sejam repassadas aos Estados e municípios, também seriam tiradas. Por isso, o orçamento de Estados e municípios não seria mais decidido por eles (e Guedes chama isso de “PEC do pacto federativo”).

PREVIDÊNCIA

Mas há outra questão, além dessas: o anúncio de Guedes de que o governo enviará uma PEC desvinculando 100% das despesas e desobrigando o pagamento de qualquer despesa (seria a “PEC do calote”, se não fosse a “PEC do roubo”), está ligado à “reforma da Previdência”.

É óbvio que a promessa de R$ 1,5 trilhão – o Orçamento todo – é um suborno para que os parlamentares votem contra a Previdência pública.

O próprio Guedes, que não é muito inteligente, deixou escapar isso, na entrevista, ao dizer que o governo tem o apoio, para o ataque à Previdência, de apenas 160 deputados (e, diz ele, “mais 100 que dizem que estão juntos do governo nos bastidores”).

Aliás, até o líder do DEM, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), repeliu a tentativa de negociação de Guedes, nessa entrevista (“Se cair a idade mínima das mulheres, não poderá mexer nas regras do rural, no BPC (Benefício de Prestação Continuada). Se quer reduzir a idade da mulher, tira do militar. Se quer dar para o militar, tira do rural”).

Respondeu o líder do DEM: “Aposentadoria rural e BPC não tem saída. A regra atual não vai mudar”.

Entretanto, Guedes declarou, também, que a suposta necessidade dessa PEC é porque a “reforma da Previdência”, sozinha, não resolverá os problemas dos Estados e municípios – como, aliás, não resolverá problema algum.

Então, para que serve a “reforma da Previdência”?

Para tirar dinheiro da população.

Para que serve essa nova PEC?

Para a mesma coisa.

A desvinculação eu quero total. Aí vamos ver quanto dá, mas vou tentar. Os políticos têm de assumir as suas responsabilidades, as suas atribuições e os seus recursos”, disse ele.

Os políticos não estão propondo essa PEC. Mas, Guedes, um golpista financeiro que jamais teve um voto, acha que pode cobrar “responsabilidades” deles e dizer: “a desvinculação eu quero total”.

“São dois projetos grandes e importantes. Um entrando pelo Senado, outro pela Câmara”, afirmou o ministro.

Trata-se de um gênio político, como se pode ver. Se um entra pelo Senado e outro pela Câmara, só pode um dos dois emplacar…

O que Guedes está querendo é uma DRU (Desvinculação de Receitas da União) que, em vez de desviar 30% dos recursos federais para juros, como hoje, possa desviar 100%.

Parece coisa de maluco, mas essa gente é assim, com uma ganância sem a mínima noção de limite – nem de ridículo.

PRISCILA CASALE

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