A Agência Espacial Brasileira decidiu cortar o repasse de verbas para pesquisas, desenvolvimento e capital humano do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) para 2021. O orçamento do Inpe é obtido através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e pela Agência Espacial Brasileira (AEB). Na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020 o Inpe recebeu R$ 118,2 milhões, para o próximo ano o PLOA prevê R$ 79,7 milhões, um corte de cerca de 33%.
O corte na verba do INPE acontece num momento em que os índices de desmatamento da Amazônia batem recorde atrás de recorde. Entre agosto de 2019 e julho de 2020, o aumento foi de 34%.
A dotação que vem do MCTI sofreu um corte de 14%, de R$ 54,6 milhões em 2020 para R$ 46,9 milhões em 2021, por parte da AEB o corte foi 49%, de R$ 63,6 milhões em 2020 para R$ 32,7 milhões em 2021, o que provoca uma atenção especial para o desequilíbrio dos cortes.
Os recursos apresentados no orçamento como “Pesquisa, desenvolvimento tecnológico e formação de capital humano para o setor espacial” financiavam a infraestrutura, como: aquisição de materiais, equipamentos laboratoriais, acesso a publicações científicas e isso viabiliza a condução de pesquisas científicas e o desenvolvimento de inovações tecnológicas dentro do Inpe.
Esse setor recebeu, em 2020, R$ 4,7 milhões. Os departamentos do Inpe haviam pedido R$ 5,7 milhões para o ano de 2021 e não irão receber nada. Outra divisão que teve o mesmo problema foi a de desenvolvimento e lançamento de satélites científicos, que havia recebido R$ 1,3 milhão em 2020 e para o qual o instituto gostaria de ter, em 2021, R$ 29,4 milhões e que também não receberá nenhum valor.
O coordenador-geral de Ciências Espaciais e Atmosféricas, Clezio Marcos De Nardin, apresentou moção de apoio à direção para esse esforço: “a Agência Espacial Brasileira (AEB) decidiu, unilateralmente, zerar o orçamento destinado aos Planos Orçamentários de Pesquisa e Desenvolvimento Científicos realizados neste instituto. Isto (…) significa dizer que Pesquisa Espacial não tem importância nenhuma em um instituto que leva em seu nome a palavra ‘Pesquisas’, subordinado a um Ministério que tem por ofício realizar e fomentar ‘Ciências’, o MCTI.”
De Nardin, enfatiza que diante do enfrentamento da pandemia, entende a necessidade de cortes, mas que zerar as verbas é inaceitável. “Aceitaremos reduzir nossos recursos na mesma proporção que o MCTI impôs a todas as Ups [unidades de pesquisa] para que o país se recupere o mais breve possível, mas não podemos trabalhar com ZERO de recursos!”
DECISÃO REVOLTA PESQUISADORES
A decisão da AEB em zerar o orçamento para o Inpe, previsto no PLOA 2021, revoltou pesquisadores que decidiram se manifestar anonimamente ao portal UOL.
De acordo com as fontes, com a decisão, faltarão recursos para manutenção de equipamentos básicos no órgão. “Até mesmo se um computador quebrar ou se precisarmos repor peça de equipamento de TI [tecnologia da informação] ou de laboratório, não poderemos fazer nada. Verba zero”, afirmou um pesquisador.
Na avaliação dos pesquisadores, a previsão de orçamento zero deve fazer com que a área de pesquisa e o desenvolvimento tecnológico no Brasil sejam negligenciadas, em meio ao enfrentamento do governo Jair Bolsonaro com o Inpe.
“Não sabemos o que virá depois. Pode ser o fechamento destas áreas no Inpe com remanejamento de pessoal para outras instruções, por exemplo”, disse um dos pesquisadores.
Na prática, de acordo com especialistas, sem as verbas o Inpe poderia deixar de ser um centro de pesquisa e desenvolvimento e se transformaria apenas em um prestador de serviços do governo. “O Inpe seria apenas um prestador de serviços e produtos. Previsão do tempo, imagens de satélites para monitorar queimadas e desflorestamento, mas sem precisar fazer pesquisas sobre e desenvolvimento tecnológico futuro”, disse um dos pesquisadores ouvidos.
DESMONTE
Os cortes que o governo Bolsonaro tenta implementar são mais um passo no desmonte da ciência no país e, em especial, no Inpe. Em dezembro, o ex-diretor do organismo Ricardo Galvão se desligou do cargo por contestar publicamente o presidente Jair Bolsonaro a respeito do avanço das queimadas na Amazônia.
Já em 2020, o governo anunciou uma “reformulação” no Instituto, demitindo a coordenadora-geral de Observação da Terra, Lubia Vinhas, logo depois da divulgação de dados que mostraram o aumento do desmatamento da Amazônia.
“Eu não sei se é com má intenção, mas de qualquer jeito, o que posso dizer mais fortemente, foi um erro crasso. Com toda essa pressão que o Brasil está sofrendo, com o prestígio que o Inpe tem no exterior, parece que esse governo não entende quais são as partes importantes na ciência brasileira”, disse Ricardo Galvão sobre a demissão de Lubia.
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