O governo pretende entregar os campos de Sépia e Atapu no segundo leilão na cessão onerosa da Petrobrás no pré-sal da Bacia de Santos, em dezembro, para os estrangeiros. Os dois campos foram ofertados em 2019, juntamente com Búzios e Itapu, no “megaleilão” badalado como “grande acontecimento” pelo ministro Paulo Guedes e por Jair Bolsonaro e não foram arrematados. Búzios foi adquirido pelo consórcio formado pela Petrobrás, com 90% das ações, e duas empresas chinesas, CNOOC e CNODC, cada uma com 5% de participação, e Itapu, pela Petrobrás sozinha. Sépia e Atapu nem receberam ofertas. Das 14 petroleiras inscritas no “megaleilão”, apenas sete apareceram. Nenhuma apresentou lance.
Para tentar viabilizar o leilão de Sépia e Atapu, o governo reduziu em cerca de 70% o bônus de assinatura e o volume de partilha de óleo com a União. O deságio para a outorga (lance mínimo) caiu de R$ 36,601 bilhões para R$ 25,5 bilhões. Os dois campos foram ofertados no primeiro leilão por R$ 22,859 e R$ 13,742 bilhões, respectivamente. Sépia terá bônus de assinatura de R$ 7,138 bilhões e Atapu terá bônus de R$ 4,002 bilhões.
Os percentuais de óleo-lucro, que é a parte que fica para a União, também sofreram reduções drásticas, muito além de generosas para as empresas ou consórcios que se apresentarem para o leilão. No caso de Sépia, de 27,88% para 15,02%, praticamente a metade. E, de Itapu, de 26,23% para 5,89%, ou 89% a menos.
Os números foram definidos pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) na terça-feira (20) e divulgados pelo Ministério de Minas e Energia e seguem para a aprovação de Bolsonaro.
Por que vender os poços de Sépia e Itapu? E ainda, por que vender com um deságio de 70% e drástica redução da relação óleo-lucro? E, ainda mais, prejudicando os interesses nacionais?
Sabe-se que essa é mais uma iniciativa do governo, declarado por Guedes e avalizado por Bolsonaro, de queimar o patrimônio das estatais para pagar juros e estabelecer o seu decantado estado mínimo ou estado máximo dos monopólios estrangeiros.
O Brasil é autossuficiente em petróleo. Além de termos o que precisamos para o consumo do país, a empresa registrou no mesmo ano um recorde de exportação de petróleo, conforme declaração recente do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. As vendas para o exterior somaram, em média, 1,4 milhão de barris/dia no ano passado. Algo em torno de 500 milhões de barril por ano.
De acordo com a Petrobrás, em 2020, “a produção de óleo e gás alcançou recorde histórico de 2 milhões e 840 mil de barris de óleo equivalente (boe), ao passo que a maioria dos nossos competidores globais registrou redução na produção. A maior parcela do volume produzido – cerca de 66% – veio dos campos do pré-sal. Esse desempenho se deve em grande medida excelente desempenho do campo de Búzios, nosso maior ativo em águas profundas do mundo”.
Lembrando que Búzios foi um dos campos oferecidos no “megaleilão” junto com Sépia e Atapu. Para entregar esses campos, usa-se o termo “desencalhar” referindo-se a áreas que estão no filé do pré-sal, depreciando os ativos, bem a gosto daqueles que querem participar do “fim de feira”.
Aumentar a oferta do produto, inclusive, por concorrente que consegue comprar reservas de petróleo a preços na “bacia das almas”, é criar concorrência para a própria Petrobrás, favorecendo os países ricos, grandes importadores mundiais do óleo e exportadores de derivados. Ou então, transferir reservas para o concorrente explorar e ganhar lá na frente, com preços mais vantajosos do barril do produto.
O que mudou de 2019 para cá? As condições dos campos são as mesmas. A geração de óleo está ainda mais assegurada. O pré-sal é um sucesso retumbante.
As condições comerciais, sim, só pioraram. A começar pela própria instabilidade política, econômica e social que o governo Bolsonaro está provocando e que, na contramão do mundo, na maior crise sanitária e em meio à recessão, prefere torrar patrimônio ao invés de proteger e investir no país.
A Cessão Onerosa é um regime jurídico regido por um contrato que a Petrobrás aasinou com a União em 2010, com o direito de produzir, com 100% de participação, um volume de até 5 bilhões de barris de óleo equivalente (boe) em seis blocos no pré-sal da Bacia de Santos – hoje os campos de Búzios, Sépia, Atapu, Norte de Berbigão, Sul de Berbigão, Norte de Sururu, Sul de Sururu, Itapu, Sul de Lula e Sul de Sapinhoá.
Geólogos, geofísicos e engenheiros da Petrobrás confirmaram a extensão dessas áreas para além de 5 bilhões de barris. Por conta disso, os excedentes poderiam ser leiloados sob regime de Partilha, conforme legislação vigente, caso houvesse o consentimento da estatal, operadora dos campos da Cessão Onerosa, segundo a Petrobrás.
Engenheiros e entidades protestaram contra o absurdo, afinal, o espaço físico onde estão os campos e o seu excedente é o mesmo, assim como a infraestrutura de produção, incluindo dutos, equipamentos submarinos e plataformas da Petrobrás.