Um agente da Guarda Civil Municipal de Ouro Preto destruiu tapete de serragem feito numa rua da cidade em homenagem à Marielle Franco, vereadora do Rio de Janeiro que foi assassinada por milicianos em março de 2018.
A ação da guarda foi alvo de repúdio pelas pessoas que trabalhavam na confecção dos tapetes de serragem colorida. As montagens são uma tradição de 300 anos na histórica cidade mineira, confeccionados durante a madrugada pela população, para a procissão da Páscoa, no domingo.
Mas, segundo o guarda “liberdade de expressão tem limite”.
A ação do agente municipal foi observada por dois guardas e filmada por pessoas que acompanhavam a confecção. O vídeo que circula pela internet mostra a ação. É possível ver o guarda desfazendo o tapete com os pés enquanto outros dois guardas observam.
Veja o vídeo:
Inconformadas, pessoas gritam palavras de ordem contra a ação dos guardas. “Ninguém vai chutar. Respeito à comunhão e à liberdade de expressão”, grita um homem para os guardas. Também na gravação, outras pessoas gritam “Marielle, presente”.
Por meio de nota, o comando da Guarda Municipal de Ouro Preto informou que “a liberdade de expressão não é absoluta ainda mais quando outros direitos estão sendo afetados”. O comando, porém, não disse quais direitos foram “afetados”.
Episódio idêntico ocorreu no em abril de 2018, quando um agente da Guarda Municipal de Ouro Preto também destruiu um tapete em homenagem à Marielle.
À época, a Guarda Civil alegou que cumpria orientação da prefeitura para evitar manifestações políticas na Páscoa. Este ano, a corporação lembrou o episódio ocorrido no ano passado.
“O recado já foi dado em 2018, em 2019 não foi diferente. Respeitem Ouro Preto, nossas tradições. Vale salientar que os guardas só desmancharam os tapetes com os pés, porque não tínhamos outro instrumento”, diz a nota da Guarda Municipal.
UBM repudia ação e questiona argumento
A União Brasileira das Mulheres (UBM) de Ouro Preto divulgou uma nota de repúdio à ação da Guarda Civil Municipal. No texto, o grupo defende a atuação de Marielle que “atuava há mais de uma década em movimentos sociais e políticos e era militante da luta pelos Direitos das mulheres, do Movimento Negro, das favelas e dos Direitos Humanos. Marielle Franco construiu suas batalhas nas lutas pelo povo oprimido, por direitos e por justiça social”.
A organização disse compreender a importância da preservação das manifestações culturais e tradições, ponderando que, se não há uma temática pré-definida por edital ou chamada pública, o julgamento do que é ou não um tapete devocional fica subjetivo. “Cabe destacar que o assassinato de Marielle Franco tem direta relação com o tema apresentado pela campanha da Fraternidade de 2019: ‘Serás libertado pelo direito e pela justiça'”, argumenta.
Por fim, o movimento indaga sobre o porquê da corporação ter destruído somente este tapete. “Havia manifestações sobre o incêndio na Catedral de Notre Dame, sobre o Sagrado Feminino, sobre o direito à terra… Mas a Guarda Municipal, pelo segundo ano consecutivo, resolveu atacar a memória da mulher negra de luta. No ano passado, um tapete em homenagem ao jovem ouro-pretano, Igor Mendes, assassinado pela PM em setembro de 2017, também foi objeto de censura e ataque da Guarda Municipal”, completou a entidade.