O ministro da Economia, Paulo Guedes, deu mais um passo, na terça-feira (21), na sua obsessão em dar um calote nos precatórios, “dívidas da União com o cidadão, devidamente reconhecidas pelo Poder Judiciário brasileiro, após longo percurso processual, dentro das balizas da legalidade”, segundo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Em reunião com os presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o ministro da Economia, Paulo Guedes, formalizou a proposta de calote do governo Bolsonaro nos precatórios: limitar o pagamento da dívida da União no valor de R$ 89,1 bilhões em apenas R$ 39 bilhões em 2022. Os R$ 50 bilhões restantes, o governo não será obrigado a pagar. Já os credores serão obrigados a aceitar as condições impostas pelo governo, sem envolver recursos da União, que tentaria levantar os recurso via encontro de contas, como dívidas com a União, liquidação de outorgas e recursos de privatizações.
Tal proposta, já enfrenta resistência de congressistas e amplos setores contrários ao calote nos precatórios, dívidas que decorrem de ações judiciais como, por exemplo, as referentes a salários, pensões, aposentadorias e indenizações por morte ou invalidez.
Paulo Guedes tentou envolver o Supremo Tribunal Federal no calote, mas o presidente do STF, ministro Luiz Fux, rechaçou: “puseram no meu colo um filho que não é meu”.
O valor dos precatórios, cerca de R$ 89,1 bilhões, deveriam ser pagos até dezembro de2022. Destas ações judiciais das quais a União não tem mais a possibilidade de recorrer, o valor de apenas R$ 39 bilhões que o governo seria obrigado a pagar no próximo ano corresponde ao que foi pago em precatórios no ano de 2016, quando foi criado o teto de gastos, corrigido pela inflação -, e os cerca de R$ 50 bilhões restantes, negociados entre os credores e o governo federal, caso não sejam resolvidos, serão empurrados para os próximo ano.
Objetivo da proposta é dar um calote no pagamento dos precatórios para “manter de pé o teto de gastos”. Barrar a transferência dos recursos públicos para os bancos, através do pagamento de juros da dívida pública, nem pensar. Esfola o povo e enche os bolsos dos banqueiros.
Definido pela EC 95/2016, a regra do teto de gastos é considerada por muitos economistas e políticos como “a âncora da estagnação brasileira e da crise social” por travar os investimentos públicos por 20 anos.
“Furar o teto não é mais discussão, é decisão do governo. A discussão é se fazem isso de forma transparente ou disfarçada”, disse o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), ao Valor Econômico. O parlamentar propõe retirar os precatórios do teto, pagar com emissão de dívida e recalculá-lo sem esse gasto.
O acordo pode ser incluído no texto da proposta de emenda à Constituição (PEC 23/2021), conhecida como PEC dos Precatórios, que tramita na Câmara por iniciativa do governo e que previa, originalmente, o parcelamento desses débitos.
Uma comissão especial foi instalada nesta quarta-feira (22) para acelerar a votação da PEC dos Precatórios. O líder do Republicanos, Hugo Motta (PB), foi escolhido como relator. Motta afirmou que rejeitaria qualquer discussão que leve à violação do teto de gastos. “Qualquer discussão que venha a não respeitar o teto de gastos eu entendo que é ruim para o país, já que essa lei [que instituiu o teto] trouxe para o Brasil uma grande segurança acerca dos gastos públicos”, declarou o relator.
“Votei a favor da admissibilidade na Comissão de Constituição e Justiça, mas no mérito voto contra. Não concordo com postergar os pagamentos”, criticou o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE).
EMENDA PIOR DO QUE O SONETO
O economista e ex-ministro da Fazenda do governo de José Sarney, Maílson da Nóbrega, afirmou em artigo “Precatórios: emenda pior que o soneto”, que “a proposta do governo promoveria um calote em créditos líquidos e certos, decorrentes de sentenças judiciais transitadas em julgado, isto é, irrecorríveis”.
“O valor devido pelo Tesouro seria parcelado para quitação em dez anos. Lembre-se que calote não significa apenas deixar de pagar uma obrigação, mas também deixar de quitá-la no vencimento”, lembrou Nóbrega.
O economista explicou ainda que, a exemplo da proposta original do governo, a nova PEC se baseia em proposta do ministro do TCU, Bruno Dantas, que “ considera os precatórios como créditos de segunda classe, cuja forma de pagamento pode ser estabelecida unilateralmente pelo governo. Recorde-se que o devedor dos precatórios, o Tesouro, é o mesmo dos títulos públicos federais adquiridos por investidores brasileiros e estrangeiros. O imbróglio dos precatórios já está afetando a curva longa de juros, um sinal de que os titulares desse título podem ter começado a temer que serão os próximos caloteados pelo governo”.
“O segundo defeito é criar a mencionada bola de neve”, alertou o ex-ministro da Fazenda. “Cálculos efetuados por Hipólito Gadelha, consultor do Senado, mostram que o estoque pode atingir 5 trilhões de reais em 25 anos. Seriam impagáveis. Tanto a PEC do governo quanto a inspirada em ideias do ministro Dantas incorporam um terceiro defeito: incluir a hipótese de compensação com créditos do Tesouro, além de uso dos precatórios para pagar impostos, adquirir imóveis da União e comprar ações de empresas em processo de privatização”.
“A ideia da compensação parece visar os Estados e municípios que devem ao Tesouro por causa da assunção de suas dívidas pelo Tesouro, no governo FHC”[…] “A não ser que estes concordem, tudo indica que uma PEC não pode impor unilateralmente a compensação. Os Estados têm todo o direito de rejeitar a medida e de recorrer ao Judiciário para preservar seus direitos. Seria mais um desgaste do governo Bolsonaro com governadores e prefeitos”, destacou Mailson da Nóbrega.