Segundo a ação do ex-diretor de Exploração e Produção da estatal, a distribuição é “totalmente atípica e desproporcionalmente maior que as distribuições de dividendos feitas por todas as grandes petroleiras do mundo, sejam elas estatais ou estritamente privadas”
O geólogo Guilherme Estrella, ex-diretor de Exploração e Produção da Petrobrás, e um dos principais responsáveis pela descoberta do petróleo no pré-sal, entrou com pedido ao Tribunal de Contas da União (TCU), na terça-feira (17), para bloqueio do pagamento de R$ 21,99 bilhões em dividendos aos acionistas da estatal, programado para quinta-feira (19).
Na ação, Estrella afirma que a distribuição desses mega dividendos é “totalmente atípica e desproporcionalmente maior que as distribuições de dividendos feitas por todas as grandes petroleiras do mundo, sejam elas estatais ou estritamente privadas”.
“Esta distribuição de dividendos não atende ao melhor interesse da empresa (mesmo que se tratasse de empresa totalmente privada) e menos ainda ao fim público que inspirou sua criação. Trata-se de um verdadeiro abuso de poder de controle que, nesse caso, por agradar também aos acionistas privados, acabou sendo perpetrado sem qualquer questionamento”, sustentou.
Os mega dividendos da Petrobrás foram parar na Justiça no ano passado. O processo já está em andamento no tribunal. Inicialmente, o ministro Augusto Nardes negou a suspensão dos dividendos, em novembro, mas pediu esclarecimento à estatal. Depois, Nardes se afastou do TCU e o processo não foi redistribuído. A demanda de Estrella é que o presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, tome uma decisão.
A primeira parcela paga de dividendos foi realizada ainda na gestão de Jair Bolsonaro, o que desagradou o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em 2022, o Conselho de Administração da Petrobrás aprovou a distribuição desses mega dividendos de R$ 43,7 bilhões aos acionistas, pagos em duas parcelas: uma em dezembro e a outra neste mês.
Felipe Campos Cauby Coutinho, vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet), declarou, em entrevista à Sputnik Brasil, em novembro, que “as distribuições de dividendos promovidas pela direção da Petrobrás em 2021 e 2022 são insustentáveis”.
O engenheiro apontou que elas foram possíveis em razão da “redução dos investimentos; níveis insuficientes para manter reservas e a produção de petróleo; e vendas de ativos rentáveis e estratégicos, além dos preços do petróleo conjunturalmente altos”.
Persiste ainda hoje o gargalo do refino do petróleo no país. Estão com obras paralisadas uma grande refinaria no Rio de Janeiro, a Coperj e as obras para conclusão de mais de 50% da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Por conta disso e do cancelamento de outros projetos, o Brasil hoje é um grande exportador de petróleo e se vê na condição de importador de gasolina e outros derivados do produto.
Esse crime contra a estatal e contra o Brasil é uma das razões para que esses dividendos sejam suspensos e sejam destinados aos investimentos cruciais para a segurança energética dos brasileiros, inclusive de energias limpas, que já são uma frente de esforços da companhia.
Na ocasião da aprovação, ainda na gestão do hoje ex-presidente Jair Bolsonaro, em novembro, a estatal informou que “esses proventos serão abatidos dos dividendos a serem aprovados na Assembleia Geral Ordinária de 2023“. A declaração foi necessária, pois, além do vulto dos valores envolvidos, a distribuição foi uma antecipação de dividendos sob alegação de disponibilidade de caixa.
Na verdade, os acionistas que estão com ações da Petrobrás, mas querem apenas realizar lucros, sem compromisso com o desenvolvimento da companhia e, hoje, na prática, estão mandando na empresa, devido à irresponsável política do governo Bolsonaro. Esses acionistas se anteciparam a eventual vitória de Lula para garantir seus ganhos, apenas pensando no lucro fácil da especulação de bolsa.
FUP E ANAPETRO
A Federação Única dos Petroleiros (FUP) e a Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários da Petrobras (Anapetro) anunciaram que estão adotando novas medidas judiciais e administrativas para suspender o pagamento da segunda parcela de dividendos da Petrobrás previstos para esta quinta-feira.
“A distribuição de dividendos de tal magnitude é imoral. Serão R$ 180 bilhões de adiantamento de dividendos referentes a 2022, mais R$ 37 bilhões pagos no primeiro semestre, relativos a restos a pagar de dividendos de 2021. Ou seja, a Petrobrás vai distribuir, pelo critério caixa, R$ 207 bilhões de dividendos relativos a 2022”, afirma Deyvid Bacelar coordenador-geral da FUP.
“A gestão bolsonarista transformou a Petrobrás na maior pagadora de dividendos do mundo, superando em muito suas concorrentes no mercado do petróleo, transferindo riqueza do cidadão brasileiro para acionistas, sobretudo para acionistas privados e estrangeiros. Grande parte do lucro da empresa veio da venda de ativos e da dolarização dos derivados de petróleo, que chegam à população com altos preços”, lembra Bacelar.