“O problema central de um projeto de desenvolvimento é a criação de emprego. Como eu crio emprego? Eu crio emprego crescendo. Como eu cresço? Investindo. Eu acho que não tem cabimento considerar investimento público como despesa”, diz Mário Bernardini, do Conselho Superior de Economia da FIESP
Em entrevista exclusiva para ao HP, o líder empresarial Mário Bernardini afirmou que “há 40 anos o Brasil não tem um projeto de desenvolvimento econômico”. Para Bernardini, “a política econômica passou a ter como objetivos, ora o combate à inflação, ora o combate ao déficit público, ora o combate a isto ou aquilo, mas sem um objetivo de médio ou longo prazo”.
“Começamos a perder o hábito de pensar em crescimento econômico”, afirmou Bernardini, membro do Conselho Superior de Economia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP).
Conforme Bernardini, para ter investimento é preciso ter demanda e ter o custo do capital compatível com o retorno da atividade produtiva. Exemplificou: “se eu faço uma empresa, ganho em média 8 ou 10% ao ano de lucro e pago 34% de imposto de renda. Se compro um título do Tesouro ou uma LCA [Letra de Crédito do Agronegócio], ou uma LCI [Letra de Crédito Imobiliário], eu ganho 10,5% ao ano e não pago imposto de renda”.
Sobre o Plano Real, avalia que não valeu a pena continuar a mesma política durante 30 anos. “Era para fazer aquela política durante 3, 4 anos. Resolveram o problema da inflação, mantendo altos os juros e baixaram o câmbio durante 30 anos. Isso reduziu a indústria de transformação em 16% do PIB com o Fernando Henrique, e, hoje, já está em 11% do PIB [Produto Interno Bruto]. A indústria chegou a ser 30% do PIB”, disse.
O empresário, ex-diretor da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) , considera que, para produção, o essencial são juros decentes, câmbio estável e competitivo e tributos assemelhados aos concorrentes. Sobre o salário mínimo, entende que “deveria chegar a dois mil e quinhentos reais, ressalvando que “não adianta pagar o salário mínimo, se não tiver emprego”.
A seguir, a íntegra da entrevista
HP – As confederações de trabalhadores na indústria propuseram um pacto pela reindustrialização. Josué Gomes, presidente da FIESP, reafirmou a proposta. O que o senhor acha da iniciativa?
MÁRIO BERNARDINI – Pacto contém a ideia de justiça social. Ninguém é contra a ideia de justiça social. A dificuldade está em definir qual é o projeto que a gente quer defender para ter justiça social. O país há 40 anos não tem um projeto nacional de desenvolvimento. Começamos a perder o hábito de pensar em crescimento econômico. A política econômica passou a ter como objetivos, ora o combate à inflação, ora o combate ao déficit público, ora o combate a isto ou aquilo, mas sem um objetivo de médio ou longo prazo. Então, a primeira coisa que eu acho que tem que começar a discutir é um projeto nacional.
“A política econômica passou a ter como objetivos, ora o combate à inflação, ora o combate ao déficit público, ora o combate a isto ou aquilo, mas sem um objetivo de médio ou longo prazo. Então, a primeira coisa que eu acho que tem que começar a discutir é um projeto nacional”
HP – Quais as principais reinvindicações que unificam os empresários e trabalhadores. Precisa aumentar a produtividade? Como o sr. avalia essa discussão?
BERNARDINI – Se a gente for no varejo, a gente não chega a lugar nenhum. Para aumentar a produtividade, precisa de investimentos. Para ter investimentos, precisa ter demanda. E ter custo de capital compatível com o retorno da atividade produtiva. Resolveram o problema da inflação, mantendo altos os juros e baixou o câmbio durante 30 anos. Isso reduziu a indústria de transformação em 16% do PIB com o Fernando Henrique, e, atuais 11% (era 30%). É o resultado de 30 anos de Plano Real. Mas não valeu a pena continuar a mesma política durante 30 anos. Era para fazer aquela política durante 3, 4 anos.
HP – O senhor quer dizer um projeto de desenvolvimento econômico.
BERNARDINI – Não, não é suficiente. O desenvolvimento precisa beneficiar a sociedade brasileira. Então, ele tem que avançar no crescimento com redução de desigualdades, com o nivelamento das oportunidades. Do acesso às oportunidades.
HP– Que outras questões o senhor acha no macro a serem encaminhadas conjuntamente?
BERNARDINI – Precisa que as atividades econômicas tenham o mesmo tratamento fiscal e tributário. Precisa que o imposto de renda incida sobre qualquer fonte de renda independente de sua origem. Precisa que esse imposto de renda seja progressivo. Precisa estar de acordo de que eu quero crescer, com distribuição de riqueza, ou seja, redução de desigualdades e com a melhoria do acesso. Então, eu preciso privilegiar educação de qualidade e assim por diante. É um trabalho grande, não se resolve em um ano, é um trabalho de geração, mas se não começarmos a defender interesses comuns, o pessoal do dinheiro, o mercado janta a gente, tanto de um lado quanto do outro.
HP – E qual a situação da indústria de transformação e da indústria de máquinas e equipamentos?
BERNARDINI – Segundo o IBGE, a indústria de transformação é 10 a 15% inferior à produção de 2013. A de máquinas e equipamentos está a 30%. Ninguém investe porque o custo de capital é excessivo no Brasil. Então, eu preciso ter um horizonte, um cenário de crescimento econômico e um ambiente favorável ao investimento. Não só em juros, mas em taxação, em tributação e assim por diante.
HP – O que desencadeou essa degeneração?
BERNARDINI – É o resultado de 30 anos de Plano Real. Eu tiro o chapéu, eles resolveram o problema da inflação. Resolveram o problema da inflação, mantendo altos os juros e baixou o câmbio durante 30 anos. Isso reduziu a indústria de transformação em 16% do PIB com o Fernando Henrique, há 11% hoje (até os anos 80, era 30%). Então, precisava saber custo e benefício, valeu a pena? Valeu a pena combater a inflação, mas não valeu a pena continuar a mesma política durante 30 anos. Era para fazer aquela política durante 3, 4 anos e depois mudar o repertório.
HP – O senhor disse que o plano do presidente Lula para a indústria é bastante tímido. Encolhido…
BERNARDINI – Mais tímido. Ou seja, não precisa ser especialista para ver isso. O melhor exemplo é o agronegócio. O agronegócio é 6% do PIB. A indústria de transformação é 12%. O agronegócio recebeu esse ano R$ 475 bi de financiamento subsidiado. A indústria recebeu este ano R$ 75 bilhões. E os R$ 300 bilhões são para os quatro anos de governo. Então R$ 75 bilhões. Dos 75, uns 10, 15 são subsidiados. O resto é juros de mercado, TLP mais crédito do BNDES. É dinheiro a 18% ao ano, não dá para pegar, a menos que você pegue pouco. Se você for uma empresa saudável, você pode dizer, eu preciso de uma máquina nova, tá bom, vou pegar um pedaço aqui, apesar de ser caro, como esse empréstimo, representa 5% do meu faturamento, ok, mesmo caro eu pago ele. Mas se eu pegar um empréstimo de 40% do meu faturamento hoje, a juros correntes no mercado brasileiro, eu quebro. Porque o custo desse empréstimo é maior do que o meu lucro. Esse é o drama.
HP– O que o senhor considera essencial para melhorar a produção industrial no Brasil?
BERNARDINI – Juros decentes! O que significa juros decentes? Juros reais, Selic real, abaixo do crescimento do PIB. Certo. E a condição para os juros não subir a dívida. Então eu cresço 2, a Selic real pode ser 2, a minha inflação é 4, a Selic tem que estar em 6%. Isto é aritmética. Se a Selic real é acima do crescimento do país, ela aumenta mais que a arrecadação, portanto, eu não pago e os juros vão para a dívida e ela aumenta. No setor privado, que não vive de Selic, vive de juros de mercado. Então, o juro de mercado têm que estar abaixo do retorno médio das empresas. Qual é o retorno médio das empresas? De 8 a 10. Mas se eu for pegar hoje capital de juros no banco, eu vou pagar 23%, se a minha empresa tiver um bom cadastro. Evidentemente não bate.
HP – Além dos juros altos, o que mais o senhor destaca?
BERNARDINI – Câmbio! Ele não pode ficar subindo e descendo que nem uma biruta de aeroporto. Não dá para fazer contas de investimento, porque eu vou importar matéria-prima, insumos ou máquinas, eu não sei quanto eu vou pagar. Não dá para exportar porque eu não sei que preço eu vou receber, quando finalmente eu entregar o produto. Então é uma variável que tem que ser relativamente estável e competitiva. Ela está até competitiva, eu acho que R$ 5,60 é um câmbio razoável. Mas não pode uma semana estar 5,10 e na outra estar 5,70. Aí não dá.
Então, são juros decentes, câmbio estável e competitivo e tributos assemelhados aos meus concorrentes. Aqui, o IVA é 50% da arrecadação do país e no resto do mundo é 30%, 20%. Eles compensam isso com imposto de renda. Nós, aqui, não taxamos renda e somos obrigados a subir o custo dos impostos no consumo.
HP – Qual patamar de taxa de participação do investimento no PIB seria bom para o país?
BERNARDINI – Não precisa exagerar, vamos fazer um programa para aumentar ano a ano o investimento público, que hoje é ridículo, é 0,4%, 0,5% do PIB. Vamos aumentar para 1,5% no próximo ano, 2,5%, até chegar a 3%, que é um número bom para o investimento público. Esse investimento público de 3% vai puxar mais uns 2 ou 3% do privado, E aí você vai ter 5% só de infraestrutura. Daqui a 10, 15 anos vamos ter 20 mil quilômetros de ferrovia, vamos ter 5 trens bala, vamos ter portos que funcionam e assim por diante.
HP – Como o senhor vê essa questão do fortalecimento do mercado interno aqui no país, dentro desses objetivos macros?
BERNARDINI – Eu sou favorável, por exemplo, à recuperação do poder de aquisição do salário mínimo com aumentos reais até um certo limite. Na realidade, a média do mundo é o salário mínimo da ordem de grandeza do salário médio do país. Isso significa que, se no Brasil são dois mil e trezentos a renda média, o salário mínimo deveria chegar devagar a dois mil e quinhentos reais. Sim, essa recuperação é importante. Agora, não adianta pagar o salário mínimo, se não tiver emprego. Então, a melhor política social que existe é a geração de empregos.
HP – O que o senhor acha da parceria estratégica com a China?
BERNARDINI – Depende dos termos, sim. A China tem capital, tem tecnologia e tem interesses geopolíticos. Ótimo. Evidentemente, eu vou fazer acordo com a China desde que eu não seja um fornecedor de matéria-prima. Eu quero transferência de tecnologia, eu quero investimentos em infraestrutura. Para aumento bruto de capital fixo. Nós estamos com investimentos sobre o PIB na faixa de 17% ao ano. Esse investimento, mal paga a amortização do estoque existente. A minha infraestrutura vai ficando velha e eu não reponho. Ela precisaria estar nova para ser ampliada.
HP – Qual o significado das políticas de transferência de renda?
BERNARDINI – São um quebra-galho que tem que ser usado para a pessoa não morrer de fome, mas não devem ser vistas como permanentes. O Brasil terá uma política econômica decente quando ele oferecer oportunidades de trabalho. Então, o problema central de um projeto de desenvolvimento é a criação de emprego. Como eu crio emprego? Eu crio emprego crescendo. Como eu cresço? Investindo. Então, o problema todo está aí. É o investimento. Eu acho que não tem cabimento considerar investimento público como despesa.
CARLOS PEREIRA
Por que a empresa intermedeia o pagamento de tributos, salários e matéria-prima realizados pelos consumidores? Isentar todas as empresas do pagamento de tributos, salários e matéria-prima. Tributar, pagar salários e matéria-prima nos moldes da CPMF e sobre o consumo ano da PF. Diminuindo em 80% os preços, aumentando demanda, empregos. Investindo o consumo com base no compulsório, retornando ao consumidor o efeito multiplicador.
Se a empresa não cobrar – e repassar ao Estado – os tributos sobre o consumo, quem fará esse papel econômico-social? E se não houver tributos, quem sustentará a sociedade, isto é, o Estado? É preciso ter um raciocínio com cabeça para cima e pé para baixo, leitor.