“Temos que defender nossos próprios interesses econômicos”, disse a ministra de Comércio Exterior, Liesje Schreinemacher, à Bloomberg. A litografia ultravioleta profunda (DUV) da holandesa ASML é usada para chips um tanto menos avançados, mas de uso muito mais generalizado.
A Holanda defenderá seus interesses econômicos quando se trata de vendas de equipamentos de fabricação de chips para a China, disse um alto funcionário holandês, como registrado no jornal chinês Global Times, para o qual isso significa um forte sinal de que o país europeu – sede da ASML, empresa líder mundial em fundição de chips avançados – não cederá à coerção dos EUA, apesar da intensa pressão desde Washington.
A ministra holandesa de Comércio Exterior, Liesje Schreinemacher, disse aos legisladores na terça-feira (22) que a Holanda tomará sua própria decisão sobre as vendas de equipamentos de chips da ASML para a China em meio a negociações de regras comerciais com os EUA, informou a Bloomberg.
“É importante defendermos nossos próprios interesses – nossa segurança nacional, mas também nossos interesses econômicos”, disse Schreinemacher.
A ASML já não estava vendendo sua litografia ultravioleta extrema (EUV) para a China – com a qual se produzem os microchips mais avançados, até 3-5 nm, equipamento de que detém monopólio – por imposição dos EUA.
Mas em termos do sistema de litografia ultravioleta profunda (DUV) – usado para chips menos avançados, mas de uso muito mais generalizado -, as apostas relacionadas ao mercado da China continental são altas e uma “dissociação” pode cortar a maior parte dos lucros da empresa e minar seu investimento em pesquisa e desenvolvimento em tecnologias futuras, segundo analistas.
Em 2021, os embarques de equipamentos DUV da ASML para a China representaram 16% do fornecimento global.
No início de outubro, nova medida de guerra tecnológica do governo Biden intensificou o bloqueio ao desenvolvimento do setor de microchips da China, proibindo uma ampla gama de exportações de equipamentos de fabricação de chips, e de chips avançados fabricados com qualquer equipamento ou tecnologia norte-americana, e pressionando os aliados, incluindo Japão e Holanda, a se enquadrarem imediatamente.
A ASML disse em comunicado enviado ao Global Times que não deseja especular ou comentar o assunto. “Esta é uma discussão entre governos”.
INSATISFAÇÃO CRESCENTE COM WASHINGTON
Observadores da indústria disseram que o comentário do governo holandês é crítico, porque expressa explicitamente a crescente insatisfação com os EUA, que tem reverberado entre seus aliados, e deve reforçar as decisões de outros países de não sucumbir à coerção dos EUA.
Analistas também disseram que a postura holandesa é parcialmente inspirada pela atitude ‘dura’ da Coreia do Sul ao ingressar na chamada aliança “Chip 4”. Em agosto, Seul supostamente estabeleceu pré condições para ingressar na aliança, que em grande parte minimizou os tons anti-China, com a ênfase em não arruinar as exportações para a China.
De acordo com um relatório do portal de notícias coreano Pulse News, Seul argumentou que os quatro membros “devem respeitar a política de uma só China e não mencionar nenhuma barreira à exportação na China”.
O que – no entender do GT – provavelmente aumentará a resistência do Japão e de outros membros relevantes em seguir os ditames dos EUA.
PÉ ATRÁS NO ‘CHIP 4’
Montado no ano passado por Washington com a finalidade de aumentar o bloqueio ao desenvolvimento tecnológico da China nos semicondutores de ponta, a aliança “Chip 4” reúne EUA, Japão, Coreia do Sul e Taiwan.
Seul e Tóquio – observa o Global Times – “aprenderam que ceder à pressão de Washington não traz ganhos, mas corre o risco de abrir mão de um dos mercados de semicondutores mais lucrativos do mundo para os concorrentes, e até mesmo levaria à discórdia nas relações econômicas bilaterais com Pequim”.
“As ações dos aliados dos EUA têm um significado especial em termos de como a China pode evitar a turbulência da prolongada guerra tecnológica liderada pelos EUA e expandir a cooperação comercial internacional”, disse Ma Jihua, analista veterano do setor de telecomunicações, ao Global Times na quarta-feira.
Ma acrescentou que os comentários abertos da Holanda mostraram que os benefícios de resistir à pressão dos EUA “superam em muito” a rendição, o que forneceria um efeito de demonstração e faria mais aliados dos EUA, como o Japão, seguirem o exemplo.
“Ao contrário do EUV, onde a ASML tem um quase monopólio, a competição na indústria de DUV é bastante intensa. Se a ASML se retirar, a lacuna logo será preenchida por outros rivais na Coreia do Sul e no Japão. As empresas chinesas de chips também fizeram grandes avanços em fabricação de chips, e eles estão perto de fornecer substitutos caseiros”, disse Ma, o que pode significar uma “perda permanente” para a ASML.
BUMERANGUE
Um funcionário da indústria chinesa, que falou sob condição de anonimato, disse ao GT à margem da 5ª Exposição Internacional de Importação da China em Xangai que um grande participante estrangeiro da indústria de semicondutores “rapidamente” demonstrou suas máquinas de litografia quando a ASML ficou sob os holofotes em meio à escalada de restrições tecnológicas dos EUA à China.
A luta da ASML não é única. Observadores da indústria disseram que, se as novas medidas forem implementadas com rigor, podem colocar em risco até 30% da receita total de alguns gigantes da indústria de chips dos EUA e do mundo, já que a China responde por um terço de suas receitas totais.
Em uma coletiva de imprensa regular no início de novembro, Zhao Lijian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, enfatizou que a formação e o desenvolvimento da cadeia global da indústria de chips são o resultado do efeito combinado das leis de mercado e das escolhas corporativas.
“Um determinado país abusou repetidamente de seu poder nacional, politizou, instrumentalizou e transformou em armas questões de ciência e tecnologia e comércio e reprimiu maliciosamente a China, o que não apenas prejudicará seriamente as regras comerciais globais, mas também prejudicará a estabilidade da cadeia industrial global”, afirmou Zhao.
Analistas têm denunciado que a política de Biden atinge os próprios alicerces da economia digital ao criar uma divisão digital desnecessária, quando o que deveria prevalecer é a integração em torno de um conjunto comum de padrões digitais com acesso universal e irrestrito.
É um ato de agressão – apontou um articulista -, destinado a isolar o setor de alta tecnologia da China e impedir o desenvolvimento da China, independentemente das consequências humanas. Trata-se de um “capitalismo de mafioso”, que usa a coerção para ‘matar’ a concorrência a fim de dominar o mercado. É também um ataque direto ao direito da China de melhorar a vida de seus cidadãos em um mundo cada vez mais digital. E um ataque à digitalização das economias da ASEAN [bloco de países do Sudeste Asiático], onde a aceitação dos serviços e protocolos digitais da China já é alta.