
“Negar a história é retraumatizar a vítima”1 (Parte II)
Com participação destacada no debate promovido pelo Instituto Federal de São Paulo, que motivou esta matéria de Iso Sendacz, dividida em duas partes, a psicóloga e psicanalista Renata Plaza, ao se referir ao negacionismo em torno do Holocausto, denuncia que “negar a história é retraumatizar a vítima”.
Renata denuncia que o negacionista é, em essência um sociopata, um psicopata, cuja personalidade busca poder e glória e que não tem nenhuma empatia pelos demais seres, em especial as vítimas dos crimes contra a Humanidade.
Ela ressalta que, no momento atual, “o negacionista diz que não é preciso tomar vacina, não existe o perigo do coronavírus”.
O negacionista opera através de mecanismos como os das equações opinião=história; fake news = memória e “através da falsificação busca não só justificar, mas apagar os crimes”.
“A vítima é que inventa os crimes para se vitimizar. Esse é o truque para apagar os crimes”, detalha.
A professora Deborah Lipstadt, autora do livro, “Negando o Holocausto: o crescente assalto contra a verdade e a memória” e que venceu o negacionista David Irving – que a acusou de calunia-lo ao denunciar como falsas suas ‘comprovações’ da inexistência do Holocausto – em um tribunal inglês, alerta que “a verdade está sob ataque”.
Em uma palestra logo após o julgamento que considerou Irving mentiroso, antissemita, racista e preconceituoso a professora destaca: “Temos que entender que a verdade não é relativa”.
“Há os fatos, há as opiniões…e há as mentiras”, acrescenta.
Ela desvela o que há por trás deste discurso travestido de racional: “O mesmo extremismo. Se descermos uma polegada abaixo da superfície o que encontramos aí é a mesma adulação de Hitler, a admiração pelo 3º Reich, antissemitismo, racismo e preconceito”.
Vamos à segunda parte da matéria de Iso.
Boa leitura
ISO SENDACZ*
Na primeira parte desta matéria o centro da exposição de Ricardo Plaza e Haroldo Hirata recaiu sobre o nazismo e o holocausto em si. Em complemento, as palestras de Renata Plaza e Ângelo Nannini trataram da negação dos fenômenos por certa casta neonazista.
O antropólogo mogiano baseou-se na trilogia de Richard Evans sobre o Terceiro Reich, cuja pesquisa sucedeu ao processo que um certo David Irving moveu contra Deborah Lipstadt, reclamando da renomada acadêmica a determinação histórica da existência do holocausto nazista.
Não obstante a Justiça ter demandado à ré – e não ao acusador – provar o que disse, Deborah e a verdade venceram. Vítimas e seus descendentes, vizinhos dos sequestrados e dos campos de extermínio e principalmente os criminosos afirmaram que aconteceu o holocausto.
Ângelo demonstrou que só há uma verdade histórica, reconhecida por documentos legítimos, cujo conteúdo é verificável por fontes externas. O resto são opiniões, que não alteram os fatos ocorridos. Lembrou que o Ministro nazista da Propaganda, Goebbels, recentemente imitado por um integrante do governo brasileiro, colocava a eficiência da sua “arte” em convencer as pessoas sem que elas se dessem conta disso. Assim, os judeus eram “secretamente” caracterizados como os bolcheviques responsáveis pelas mazelas alemãs.
Registre-se que a Alemanha dos anos 1920 era um país científica e culturalmente avançado. No entanto, o morticínio foi elevado à escala industrial, como relatam dois sobreviventes em Nasci Duas Vezes.
NASCI DUAS VEZES
Por que certos sujeitos insistem em dizer que nada disso aconteceu, da mesma forma que outros garantem que a Terra é plana? Quem explica é a psicanalista Renata Plaza, também professora do IFSP.
A boa técnica terapêutica, respeitosa e promotora do ser humano, ajuda o paciente a recordar o passado para não repetir certos comportamentos que lhe fizeram mal. Mas há gente arrogante para quem os fatos não importam, trabalham com uma autoverdade que sabem ser mentira. Não se trata de ignorância, mas de crueldade arrogante para com o próximo: negar a história faz a vítima ser retraumatizada.
Freud também explica: “uma imagem reprimida pode abrir consciência pelo ‘não’”2, como uma espécie de defesa. Para saber a verdade, bastaria tirar o “não” da frase.
Os organizadores referenciaram a obra Maus, do quadrinista Art Spiegelman, com avaliações em vídeo de o Quadro em Branco e em artigo de Horácio Sendacz.
2não há pretensão de exatidão científica ou histórica na citação, trata-se apenas de uma ilustração à conclusão do autor, baseada na palestra da professora Renata Plaza.
(*) Engenheiro Mecânico pela EESC-USP, Especialista aposentado do Banco Central, diretor do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central, do Instituto Cultural Israelita Brasileiro e membro da direção estadual paulista do Partido Comunista do Brasil
Itens referenciados na matéria
I – Vídeo com a conferência da professoar Deborah Lipstadt logo após o enfrentamento em uma corte inglesa do negacionista David Irving. O tribunal declarou que sua negação dos crimes do Holocausto eram mentiras e o veredito o considerou antissemita, racista e preconceituoso. Veja o vídeo (legendas em inglês):
II – Vídeo “Nasci várias vezes” com relatos de sobreviventes dos campos de extermínio nazistas:
III – Vídeo “O Quadro em Branco” baseado no livro do quadrinista Art Spiegelman intitulado ‘Maus’ sobre os crimes nazistas