O ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), o homem da mala, que foi flagrado correndo pelas ruas de São Paulo com 500 mil reais em propina arrancada dias antes por Michel Temer do empresário Joesley Batista, jurou, em depoimento à Polícia Federal, que tudo que fazia para Temer era estritamene profissional. Loures era assessor especial da Presidência da República e suplente de deputado federal.
Ele tentou também convencer os policiais que seu chefe, Michel Temer, não sabia das reuniões que ele [Loures] mantinha com representantes do setor portuário, inclusive com executivos da Rodrimar. Loures é acusado de receber propina para interferir na edição de um decreto presidencial em favor da Rodrimar. Temer controla há anos o porto de Santos, onde a empresa Rodrimar tinha muitos interesses econômicos. Rocha Loures era o enviado de Temer para as reuniões onde eram acertadas as propinas.
Temer mantém o controle político do Porto de Santos desde o primeiro mandato de Fernando Henrique. Já em 1995 indicou para presidente da Codesp, estatal encarregada da administração do maior porto do Brasil, Marcelo de Azeredo. Denúncias da ex-esposa de Azeredo, Érika Santos, feitas no ano de 2000, dois anos depois da saída de seu marido do cargo, mostraram que Temer recebia propina em diversas obras do porto. Marcelo Azeredo foi processado por improbidade administrativa ao assinar em 1997 o 9º Aditivo a um contrato de ampliação do Terminal de Containers do Porto de Santos, que só ocorreria no ano seguinte. O Aditivo acrescentou R$ 144 milhões a um contrato de R$ 295 milhões. Azeredo já havia sido substituído por outro indicado de Temer, Paulo Fernandes do Carmo. Até este momento ainda não se sabia das denúncias de Érika Santos, de que Temer recebia propinas.
Em abril de 1999, quando Eliseu Padilha era Ministro dos Transportes de FHC, Temer indicou o ex-deputado Wagner Rossi para ocupar a direção da estatal. Padilha e Temer começaram a substituir oficiais da Marinha dos conselhos de autoridade portuária de Santos, Rio Grande e Paranaguá. Em Santos, o ministro foi obrigado a voltar à trás. Jorge Gerdau chegou a pressionar o Planalto contra as mudanças feitas por Padilha e Temer. Na época Padilha justificou as mudanças pela privatização. A construção do terminal II do Porto de Santos, pela Andrade Gutierrez teve, nesta época, segundo o TCU, um superfaturamento de 141% do preço original.
Érika Santos denunciou, com base em documentos que ela desviou do computador do ex-marido, que a empresa Libra Terminais Ltda, operadora portuária, pagou propina de R$ 640 mil a Temer e uma parte menor para Marcelo Azeredo. Outra figura que recebeu da Libra foi uma pessoa de nome Lima, hoje identificado como o coronel reformado da PM, João Batista Lima, envolvido também em propinas da JBS para Temer. Esta empresa ganhou dois terminais em Santos. Um inquérito conduzido pelo delegado Cássio Luiz Guimarães Nogueira tentou ouvir Temer e não conseguiu. A Rodrimar também teria pago R$ 600 mil para o esquema – metade para Temer e 25% para Azeredo e Lima. O rateio da propina sempre respeitaria essa divisão. Na campanha presidencial de 2014, dois acionistas da Libra doaram R$ 1 milhão ao peemedebista, então candidato a vice-presidente. A Polícia Federal acredita que o dinheiro pode ter sido repassado como contrapartida pela aprovação da MP dos Portos, cujo relator na Câmara foi o então deputado Eduardo Cunha.
No primeiro mandato de Lula, Temer continuou mandando no Porto de Santos. Rossi depois foi ser Ministro da Agricultura de Lula e Padilha foi comandar a Secretaria de Aviação Civil do governo Dilma. Temer em 2010 virou vice de Dilma. A investigação sobre o decreto que beneficiou a Rodrimar tem como alvos Michel Temer, Rocha Loures, além de Antônio Celso Grecco e Ricardo Conrado Mesquita, executivos da Rodrimar, empresa concessionária no porto de Santos. O inquérito foi reaberto por Rodrigo Janot, depois de ter sido arquivado pelo procurador que o antecedeu. A suspeita é de que Temer recebeu propina pela edição do decreto que beneficiou a Rodrimar. O depoimento correu em novembro mas só agora está sendo conhecido.
No depoimento, Rocha Loures admitiu ter recebido parecer jurídico com “apontamentos” do setor portuário à minuta do decreto que, segundo as investigações, beneficiou a empresa Rodrimar. Segundo ele, o documento foi elaborado por um escritório de advocacia e entregue em reunião com representantes do setor portuário, entre eles, Ricardo Mesquita. Essa enrolação toda de Loures está parecendo as invencionices dos defensores de Lula com a fabricação de recibos falsos do apartamento de São Bernardo.
A Polícia Federal mostrou a Rocha Loures áudios gravados com declarações de executivos da J&F. Um deles é uma conversa entre ele e o executivo da J&F, Ricardo Saud, e entre ele e o chefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha.
Sobre o primeiro diálogo que, segundo as investigações, tratava sobre entrega de dinheiro por meio de intermediários, Rocha Loures saiu-se com a desculpa que inventou o nome de um suposto intermediário apenas para “se livrar da abordagem” de Saud.
Rocha Loures: “Então vamos fazer o seguinte. Eu vou verificar com Edgar, se o Edgar… Tem duas opções: o Edgar ou o teu Xará”.
Ricardo Saud: “Pra mim é mais confortável com o Edgar”.
Rocha Loures: “Você não conhece e ele também não te conhece”.
Em outro momento, a PF questionou o peemedebista sobre um diálogo que manteve com Gustavo Rocha.
Gustavo Rocha: “É uma exposição muito grande para o presidente se a gente colocar isso. Já conseguiram coisas demais nesse decreto”.
Rocha Loures: “O importante é ouvi-los.”
Gustavo Rocha: “A minha preocupação é expor o presidente em um ato que é muito sensível. […] Esse negócio vai ser questionado”.
Ao explicar o diálogo, Loures disse desconhecer as expressões: “já conseguiram coisas demais nesse decreto” e “é uma exposição muito grande para o presidente”.