
O ex-secretário estadual de Meio Ambiente do Pará, Luiz Fernandes, sabia, a quase dois anos, dos riscos de vazamento de rejeitos de bauxita da norueguesa Hydro Alunorte, no município de Barcarena. Segundo o advogado, Ismael Moraes, em abril de 2016 ele encontrou o então secretário durante uma audiência pública, em Belém, onde iniciaram conversas sobre o assunto.
“Naquele dia, alertei pessoalmente ao secretário da poluição que a Hydro vinha causando em Barcarena, bem como dos riscos de uma contaminação maior, inclusive de vazamentos de resíduos, caso não fosse tomada nenhuma providência”, afirma Moraes, destacando que na época já era perceptível a poluição da água e do ar.
Segundo Ismael, ele e Fernandes continuaram trocando mensagens após o encontro, mas nada foi feito. Em novembro do ano passado, Moraes decidiu entrar com uma ação judicial pedindo a suspensão e o cancelamento das licenças ambientais da Hydro, e exigindo a recuperação florestal ao redor dos mananciais.
O processo tramitava na 9ª Vara Federal Ambiental e Agrária e foi remetido para a Justiça Estadual, na última sexta-feira (24), porque o juiz alegou impedimento na análise por se tratar de competência do Estado.
Moraes destaca também que a bacia de rejeitos da Hydro está construída em uma área de reserva ambiental, prevista no Decreto Estadual nº 1064/77, o mesmo que criou o Distrito Industrial de Barcarena. Mesmo sendo uma área de proteção ambiental, a mineradora obteve uma “autorização de testes” da Semas, de acordo com o Ministério Público Federal (MPF). “Ao todo, 105 comunidades já estão contaminadas há anos e pelo menos sete delas correm o risco de serem soterradas com lama vermelha”, alerta o advogado.
NÃO SEI
O governador do estado, Simão Jatene, assim como Luiz Fernandes, são acusados pelos moradores da região de serem coniventes e ajudarem a encobrir os abusos da Hydro.
Após as diversas denúncias da população de transbordamento de lama tóxica da barragem, no dia 17, a Semas (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade) fiscalizou a barragem de rejeitos da mineradora e afirmou não haver nenhum indício de vazamento. O governador Simão Jatene (PSDB), endossou o aparece publicamente, defendendo a Hydro e culpando as chuvas pela poluição.
“Vale ressaltar que no mês de fevereiro choveu 696mm e, no período de 16 à 22 de fevereiro, 453mm. O que isso significa? Significa que choveu bem mais que a média para o período nos últimos 30 anos, que foi de 370″, finalizou Simão Jatene, desviando a atenção sobre a responsabilidade ambiental da empresa norueguesa no acidente.
Em seguida foram desmentidos pelo laudo do Instituto Evandro Chagas que comprovou a contaminação dos mananciais por metais pesados, alguns com concentração até 25 vezes superior ao permitido por lei. O MPF e o MPPA recomendaram a suspensão imediata das atividades da mineradora, e só então o governo estadual resolveu se posicionar determinando que a Hydro reduzisse em 50% sua produção.
A redução, no entanto, não foi cumprida pela mineradora, que continua negando o vazamento. O presidente mundial da Norsk Hydro, Svein Brandtzaege, afirmou, em entrevista ao jornal “Valor Econômico” na última quarta (28), que não existem razões para acreditar que a contaminação foi causada pela Hydro. Segundo ele, “o instituto coletou amostras em vilas fora da fábrica e encontraram níveis elevados de substâncias específicas, incluindo algumas que não estão nem presentes na Alunorte. Não temos razão para acreditar que tenha havido vazamento do depósito de resíduos de bauxita na Alunorte. Assim, criamos uma força-tarefa de especialistas para liderar a revisão total da Alunorte – e eles respondem diretamente a mim – para identificar potenciais de melhora que nos permitam desenvolver e melhorar. Eles vão também analisar os resultados de testes para entendê-los melhor”.
A Hydro Alunorte recebeu do governo do Pará incentivos fiscais de R$ 7,5 bilhões até 2030, através de isenção de ICMS da energia elétrica.
ACAMPAMENTO
Moradores da região de Barcarena montaram um acampamento em frente à sede da Hydro para denunciar o crime ambiental. Centenas de moradores amanheceram nesta quarta-feira (28) protestaram contras os danos causados pelo vazamento da bacia de rejeitos da empresa.
Com uma série de faixas e cartazes, a população das comunidades atingidas pediu o fim das atividades da empresa na região, além de criticar a falta de atuação do Governo do Estado, que consideram coniventes com os danos ambientais causados pela empresa.
Além de moradores, trabalhadores da própria empresa e representantes de sindicatos da região também participam do ato.