Na pandemia de Covid-19, o desemprego quase que dobrou e a inflação dos mais pobres disparou a quase 40%. Especialistas alertam que, até que os preços dos alimentos caiam, a população de baixa renda poderá empobrecer ainda mais.
A estagflação – uma situação de desemprego e inflação elevados, somado a uma economia em estagnação ou corrosão – chegou primeiro para os brasileiros mais pobres, é o que demonstram dados divulgados pelo Datafolha neste domingo (31).
Muito antes do indicador geral da inflação chegar aos dois dígitos, 10,25%, em 12 meses, segundo o IPCA, o peso dos alimentos ao consumidor já figurava próximo dos 20%, e quase 40% desde o início da pandemia.
O forte aumento no período agravou um cenário de disparada do desemprego na metade mais pobre do país. De 2014 a 2019, a desocupação nessa parcela da população quase dobrou (para 21%), e voltou a subir mais 8,5 pontos percentuais na pandemia.
Na prática, o resultado foi a queda acentuada do poder de compra dos mais pobres, elevando a fome e a miséria no Brasil.
Nos últimos 12 meses, período em que os alimentos dispararam 20%, a renda real familiar per capita do trabalho na metade mais pobre despencou 18%, de R$ 210 mensais para R$ 172, segundo dados da FGV Social. Antes disso, em 10 anos até 2021, o rendimento da metade mais pobre no país já havia retrocedido 26,2%.
Segundo especialistas, para que os preços se estabilizem ou caiam nos próximos meses, é esperado que a atividade econômica e o emprego sofram ainda mais, repetindo o roteiro a partir de 2015, quando a inflação oficial (IPCA) cedeu de 10,67% naquele ano para 4,31% em 2019. Antes disso, no biênio 2015-2016, o governo Dilma aplicou um arrocho fiscal na economia, afundando o PIB brasileiro em -7,2%; e o Banco Central (BC) elevou a taxa básica de juro (Selic) para 14,25%, praticamente ao dobro da vigente dois anos antes.
A péssima atuação do governo Bolsonaro irá piorar ainda mais as condições de vida da população. Bolsonaro já deixou claro que não vai interferir em nada para combater a disparada dos preços dos alimentos, combustíveis e da conta de luz, e ainda liberou geral para o mercado financeiro elevar os juros.
Nesta semana (27), o Banco Central (BC) elevou em 1,5 ponto percentual a taxa básica de juros, que passou de 6,25% para 7,75% ao ano. Com isto, o Brasil voltou à posição de campeão mundial de juros reais (descontada a inflação).
Ao aumentar a Selic pela sexta vez consecutiva este ano, o BC impõe mais arrocho aos investimentos e ao consumo, prejudicando a indústria, o comércio e os trabalhadores, e jogando a inflação ainda mais para o alto, como alertou o economista José Luis Oreiro.
“Nesse contexto de aumento da aversão dos investidores internacionais a aplicações denominadas em reais, o aumento da taxa de juros pode ser contraproducente ao sinalizar para os mesmos que as aplicações no Brasil são, de fato, muito arriscadas pois o Banco Central do Brasil é uma das poucas autoridades monetárias do mundo que está aumentando de forma significativa a taxa de juros básica para enfrentar um choque de oferta de caráter temporário que está ocorrendo no mundo inteiro“, destaca o economista.
Segundo Oreiro, “o BCB aplica uma política monetária que destoa não apenas do praticado pelos bancos centrais dos países desenvolvidos, como também dos bancos centrais de outros países emergentes como é o caso da Turquia”, país que recentemente reduziu a taxa básica de juros.
“O aumento da taxa de juros levou a uma depreciação da taxa nominal de câmbio, o que deverá aumentar, ao invés de reduzir, as pressões inflacionárias nos próximos meses”, escreveu o professor da UnB em artigo.