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Alta dos alimentos afeta principalmente os de menor renda e novos aumentos da Selic não resolverão o problema
Estudo do economista André Braz, da FGV, veiculado no jornal O Globo, mostra que as famílias mais pobres são as principais vítimas da atual inflação de alimentos no Brasil. Em janeiro de 2025, os alimentos comprometeram 22,61% do orçamento das famílias que ganham entre um e um salário mínimo e meio, enquanto para as famílias que ganham mais de trinta salários mínimos o valor cai para 11,32%.
Para Maria Andreia Parente, economista do IPEA, o protagonismo da comida no orçamento das famílias “potencializa” os impactos do aumento dos preços. Isto porque as famílias sentem no bolso, semanalmente, os preços aumentando nos mercados e nas feiras, de Norte a Sul do país. A queda da popularidade do governo, nas últimas semanas, é um reflexo desse processo inflacionário
A inflação geral, medida pelo IPCA, fechou 2024 em 4,83%, ligeiramente acima da tolerância da meta de inflação. Apesar do alarde do mercado financeiro, exigindo mais aumentos da taxa de juros para conter a inflação, a raiz do problema está no componente principal que puxa o IPCA, os alimentos, e novas elevações da Selic servirão apenas para encher os bolsos do setor financeiro.
Uma das características centrais da inflação é seus efeitos desiguais, atingindo com mais força as famílias mais pobres. As consequências imediatas são o aumento da carestia (comer menos), a maior procura por ultraprocessados (mais baratos) e a elevação do endividamento (produtos caros e juros altos). Enquanto os efeitos são sentidos nacionalmente, as causas da inflação são determinadas sobretudo internacionalmente e a política econômica brasileira falha continuamente em respondê-la da forma correta.
A dolarização dos preços dos alimentos e dos insumos utilizados em sua produção – como é o caso do fertilizante, amplamente importado -, a ausência de uma política robusta de estoques reguladores para administrar os preços em tempos de alta/baixa e a persistência de aumentos sucessivos da taxa Selic como única resposta ao processo inflacionário compõem o quadro de atuação tímida e insuficiente do Estado para garantir comida no prato da população.
Outro fator relevante na alta dos alimentos é a instabilidade climática, que vem sendo utilizada como bode expiatório para justificar a inflação. Na verdade, esse argumento revela a inadequação da política monetária vigente para combater os desafios contemporâneos e a atualidade da política dos estoques reguladores, que precisa ser retomada para atenuar os efeitos de fenômenos climáticos extremos.
Com a atuação do Banco Central restrita ao movimento mecânico – e essencialmente político – de elevar a Selic sempre que a inflação aumenta, bem como as incertezas do cenário econômico internacional, ficará difícil conter a inflação que nos assola.
Tendo em mente a baixa sensibilidade da inflação de alimentos ao juros e a incapacidade humana de Galípolo para controlar o clima e garantir colheitas fartas, talvez o caminho mais prudente seja retomar os estoques reguladores, atenuar os efeitos da dolarização dos preços e reduzir os juros, a fim de aliviar os custos, tanto para os produtores quanto para os consumidores.