“Pedir isolamento social sem dar condições para que as famílias fiquem em casa é colocar a pessoa na contradição que o Bolsonaro quer, que é ou saúde ou dinheiro”, disse a ex-deputada do PCdoB
O instituto criado pela ex-deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) recebeu doação de 785 pessoas e entregou 24,9 toneladas de alimentos e itens de higiene para pessoas necessitadas em Porto Alegre.
Até a terça-feira (21), o Instituto E Se Fosse Você conseguiu ajudar 1.916 famílias com as cestas básicas. Também foram doados 415 frascos de álcool em gel, 329 máscaras de proteção e 500 kits de chocolates em uma ação de Páscoa.
“Pedir isolamento social sem garantir uma renda básica, sem dar condições para que as famílias permaneçam em casa, é colocar a pessoa na contradição que o Bolsonaro quer que ela seja colocada, que é ou saúde ou dinheiro”, disse Manuela.
“Essa contradição não pode existir. A garantia para a pessoa ficar em casa devia estar sendo dada pelo governo”, defende Manuela.
Em entrevista à Hora do Povo, Manuela D’Ávila explicou que o “Instituto E Se Fosse Você foi criado em janeiro de 2019, com o intuito de combater o ódio na internet e as fake news. Desde então, financiamos as atividades com as vendas dos meus livros”.
Manuela é autora dos livros Por que lutamos?: Um livro sobre amor e liberdade e Revolução Laura – Reflexões Sobre Maternidade & Resistência.
“Ele funcionou dessa forma, atuando de várias maneiras, até um mês atrás, que foi quando percebemos que haveria medidas de isolamento, mas que isso não ia ser amparado por um serviço de assistência social”, relatou a ex-candidata a vice-presidente da República.
“Nesse momento, a gente começou a correr para garantir alimentos para as pessoas. Se as informações de que não há assistência social e de que houve precarização do trabalho são combinadas, nos damos conta de que a defesa do isolamento social precisa da defesa de uma ação social”, contou.
“Nós, digamos assim, trocamos o pneu do carro com ele andando. Enquanto lutamos para garantir a renda básica emergencial [paga a contragosto pelo governo federal], então já começamos a receber doações e coletar os alimentos”.
A doação das máscaras está acontecendo graças a uma parceria firmada com empresas da região. “Duas lojas aqui da região estão garantindo a doação de máscaras. Elas começaram a produção a partir dos retalhos”, relatou.
“Nós também fizemos uma parceria com as feiras de Porto Alegre para conseguir doar alimentos frescos”, informou.
A ex-deputada deu o exemplo de duas instituições que estão recebendo as doações de seu instituto: o Grupo de Apoio à Prevenção da AIDS (Gapa) e a Casa do Artista, que ajuda artistas, geralmente idosos, com doações.
“Muitas instituições têm um trabalho social de sempre distribuir cestas, enquanto para nós é a primeira vez. Damos para eles as cestas e temos a certeza de que são bem distribuídas”.
As cestas básicas distribuídas entre as comunidades indígenas são reforçadas. “Para as aldeias indígenas contatamos o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], que reforçou as cestas com outros produtos”.
SUAS
Para Manuela, esses trabalhos sociais tomam maior importância por conta do desmonte que o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) sofreu nos últimos anos e décadas.
Com a extinção do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) pelo governo Bolsonaro, hoje o SUAS está abrigado no Ministério da Cidadania, dirigido por Onyx Lorenzoni.
“Governantes que destruíram a rede de assistência social não conseguem reestruturar ela em 30 dias. Por exemplo, há entre 6 e 7 mil moradores de rua em Porto Alegre, mas você não consegue reverter tudo isso em 30 dias, dar teto para essas pessoas em tão pouco tempo”, disse.
“Tem uma grande unidade entre todos os gestores que defendem o isolamento social, mas entre esses gestores não somos todos iguais. Houve quem deu importância para o SUAS, e hoje colhe os frutos, e quem não deu, e hoje corre atrás do prejuízo”, acrescentou a ex-deputada.
“Infelizmente, a gente terá mais vulnerabilidade nos lugares que apostaram na destruição do sistema de assistência social”, lamenta.
A ex-deputada criticou a demissão de 1.800 trabalhadores da saúde de Porto Alegre, feita pelo prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB) no fim de 2019. Os trabalhadores eram ligados à área de saúde da família.
“Esses trabalhadores não fazem falta na hora de informar a população, de ir aos bairros informar que não é certo sair de casa agora?”, questionou.
O SUAS, disse, poderia estar sendo utilizado para agilizar os pagamentos do auxílio emergencial de R$ 600. Ele “deveria ter a total capacidade de resolver esse problema, mas foi desmontado ao longo do tempo”.
FAKE NEWS
Manuela acredita que o trabalho de combate às fake news, que já feito pelo Instituto E Se Fosse Você desde o começo de 2019, tomou outra importância durante a crise do coronavírus porque pode culminar em mais mortes.
“O primeiro esforço é para desmentir esse conjunto de informações que o presidente está tentando passar, desconstruir o discurso mentiroso do presidente”, enfatizou.
Para ela, é “claro que as mais perigosas e potentes [fake news] vêm sempre do lado de Bolsonaro. Elas estão sendo feitas no gabinete do ódio e são amplamente financiadas”.
Mas, ao mesmo tempo, é preciso dar uma “educação virtual” para que as pessoas bem intencionadas não caiam e propaguem fake news.
“Nós queremos que as pessoas que não têm a ‘intenção da fake news’ saibam checar o fato antes de reproduzir. Nós vamos lançar essa semana o nosso curso de educação virtual com preço mais acessível, e um valor acima do de custo que vai ser todo revertido em cestas básicas para serem doadas para as famílias”.
Para ela, “está sendo muito importante também o chamado ‘jornalismo de referência’, que antes era muito ligado à grande mídia. Com a internet, passou a ter outro significado. É o caso do Átila [Iamarino, biólogo brasileiro], que se tornou uma espécie de referência nas informações sobre a pandemia. Ele tem levado muita referência científica para as pessoas”.
PEDRO BIANCO