O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) criticou o favorecimento das operadoras de planos de saúde no Brasil com o projeto “Plano de Saúde Acessível”, apresentado pelo Ministério da Saúde do governo Michel Temer (PMDB).
Para o IPEA o projeto “parece ter sido muito mais motivado pela perda de mercado das seguradoras diante do desemprego e da queda de renda”, afirmou a nota técnica “O público e o privado no sistema de saúde: Uma apreciação do projeto de Plano de Saúde Acessível”, assinada pelo Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do instituto, Edvaldo Batista.
Em janeiro do ano passado, o Ministério da Saúde enviou a proposta de uma nova modalidade de plano de saúde para apreciação da Agência Nacional de Saúde (ANS) argumentando a redução do número de segurados ocorrida devido ao aumento do desemprego e à queda da renda resultantes da crise econômica.
A nota do IPEA critica este ponto. Segundo o órgão, são usadas “apenas justificativas econômicas relativas ao mercado de planos e seguros privados de saúde para sustentá-lo”.
A proposta do governo Temer cria três novas modalidades de plano de saúde: 1- Plano Simplificado, que cobre apenas exames de baixa e média complexidades e consultas; 2- Plano Ambulatorial + Hospitalar, que inclui também internação e urgência; e 3- Plano em Regime Misto de Pagamento, que tem cobertura ampla mas requer que o paciente arque com parte dos custos da assistência prestada (coparticipação).
Aproximadamente 25% dos brasileiros já são cobertos pela Saúde Suplementar (planos de saúde e seguros saúde) em modalidades que incluem as propostas pelo “Plano de Saúde Acessível”. Isso porque por mais que oficialmente não exista planos em regime misto de pagamento, a falta de regulação pelo governo federal das operadoras, permite que aproximadamente 1/3 dos produtos comercializados na Saúde Suplementar sejam no modo de coparticipação ou franquia.
O governo promete que as novas modalidades terão preços mais baixos, levanto a um aumento do número de pessoas que optarão por planos e seguros privados de saúde, deslocando assim, parte da demanda por serviços públicos para o setor privado, “reduzindo gastos e melhorando o acesso à assistência à saúde no SUS”.
Mas, segundo o IPEA “a proposta de Plano de Saúde Acessível, além de segmentar ainda mais o sistema de saúde e exacerbar os problemas de equidade existentes, tem pouca probabilidade de atingir os objetivos declarados de ajudar a controlar gastos em saúde e melhorar o acesso no SUS”.
O relatório aponta como exemplo a “coparticipação de pelo menos 50% do valor dos procedimentos”. Irá “reduzir o grau de mutualismo entre os segurados e limitar o acesso dos mesmos aos cuidados necessários, especialmente aos mais caros, podendo forçá-los a recorrer ao SUS e/ou pagar do próprio bolso”, destacou.
Outro exemplo é a regra do projeto que visa a recomposição de preços com base em planilhas de custos das operadoras, o que na prática, aponta o IPEA, repassa custos e risco do negócio para o segurado. “Retirando incentivos para busca de eficiência por parte das operadoras, além de permitir comportamentos abusivos nos reajustes de preços”.
O projeto prevê a criação de um plano regionalizado com cobertura adaptada à disponibilidade da rede privada no município, o que representa a restrição ao acesso aos cuidados necessários e aumenta as desigualdades na utilização da assistência à saúde, sem que necessariamente a redução de custos seja repassada para os segurados. “A proliferação de planos regionalizados exacerba e cria oportunidades para que as operadoras adotem comportamentos abusivos, como, por exemplo, a exclusão de tratamentos para determinadas doenças mesmo quando disponíveis na localidade e a venda de cobertura para procedimentos não disponíveis na localidade”, apontou o IPEA.
PRIVATIZAÇÃO
A comparação com outros países também foi colocada pelo IPEA demonstrando o quão prejudicial à saúde brasileira é a inserção desenfreada do setor privado.
Nos Estados Unidos o setor privado tem papel superior no financiamento e fornecimento da atenção à saúde, mais de 65% da população possui cobertura privada de saúde, e 52% do gasto com saúde tem como fonte a iniciativa privada.
Em termos de percentual do Produto Interno Bruto (PIB), os Estados Unidos gastam 17%, enquanto no Reino Unido esse percentual é de 9%, o Brasil e o Chile gastam aproximadamente 8% do PIB. Porém “apesar dos elevados gastos, o sistema de saúde americano tem um dos piores desempenhos quando comparado a outros países desenvolvidos”, destacou o IPEA.
Entre 11 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), os Estados Unidos ficam em penúltimo lugar em termos de acesso e em último lugar em termos de desempenho geral (eficiência, equidade e qualidade da assistência à saúde prestada). Em situação oposta, o Reino Unido, com majoritariamente sistema público de saúde, situa-se em primeiro lugar tanto em termos de acesso quanto em termos do desempenho geral.
MAÍRA CAMPOS