Em nota técnica, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) propõe zerar a fila de espera do Bolsa Família, reajustar permanentemente os valores em 29% e criar um benefício extraordinário ao programa para assistir as famílias mais pobres “particularmente expostos à combinação de pandemia e recessão”.
Atualmente, o Program Bolsa Família atende famílias em situação de extrema pobreza (renda per capita de até R$ 89 por mês) e de pobreza (renda per capita de até R$ 178 mensais). Os autores do estudo propõem que as linhas de elegibilidade sejam reajustadas para pelo menos R$ 115 e R$ 230, respectivamente
“Considerando-se a defasagem do poder de compra dos benefícios atuais do Bolsa Família e os riscos econômicos e sociais decorrentes da pandemia de covid-19 parece-nos um preço baixo a pagar para garantir um nível mínimo de bem-estar aos mais pobres”, afirmam os pesquisadores Luís Henrique Paiva, Pedro Ferreirade Souza, Letícia Bartholo e Sergei Soares, responsáveis por 72 simulações sobre ações mínimas necessárias para proteger as famílias mais vulneráveis através dos cadastros sociais existentes.
Para zerar a fila do programa – hoje estimada em 1,7 milhões de famílias – os pesquisadores sugerem suspender os processos de revisão cadastrais temporariamente, ampliando a concessão do benefício para todos os elegíveis do Cadastro Único. Assim, o programa seria expandido para 15,5 milhões de famílias, “o que equivale a incorporar quase 5 milhões de pessoas, um aumento de cerca de 12% no tamanho do programa”, afirmam.
“O fundamental é partir da estrutura que já construímos para atender de imediato às famílias mais pobres. Caso contrário, o risco é de só conseguirmos operacionalizar o benefício tarde demais. Além disso, nossas simulações também mostram que é possível garantir uma renda mínima para as famílias vulneráveis com custos relativamente baixos, considerando a gravidade da situação”, afirmou Pedro Ferreira de Souza.
Se essa medida for adotada para a folha do mês de abril e estendida até o fim do ano, seu impacto deverá estar na casa de R$ 2,24 bilhões, um aumento de pouco menos de 10% em relação ao cenário atual.
Com a ampliação da elegibilidade, a linha de extrema pobreza iria a R$ 115, enquanto a linha de pobreza passaria a R$ 230, e os benefícios variáveis (para grávidas, nutrizes e crianças ou vinculados a adolescentes), ficariam entre R$ 53 a R$ 62. “O percentual de reajuste é de aproximadamente 29% em todos os casos”. Só a inflação acumulada desde o último reajuste, em 2018, já chega a quase 6%.
“Como não há nenhuma indexação Bolsa Família, o valor real das linhas de elegibilidade e dos benefícios depende de reajustes discricionários que, grosso modo, não têm ocorrido com ritmo e intensidade suficientes para manter o poder de compra”, aponta o estudo.
A terceira recomendação do Ipea é que seja criado um benefício extraordinário, com duração de pelo menos seis meses, no valor de R$ 450 para todas as famílias do Cadastro Único e renda familiar per capta inferior a meio salário mínimo. Ou seja, adicional aos benefícios ordinários.
Com a extensão desses programas, o aumento nos gastos seria da ordem de R$ 68,6 bilhões em 2020, passando de 0,4% do PIB, tomando 2019 como referência, para algo entre 0,8% e 1,4% – “portanto, o impacto orçamentário seria muito modesto”.
Enquanto diversos países do mundo estão gastando em torno de 20% de seus PIB’s para enfrentamento da pandemia, o Brasil anunciou medidas que não alcançam 3%. “A cada dia, mais países adotam transferências de renda como parte da resposta à Covid-19, o que sinaliza o potencial que essa medida tem de funcionar no Brasil”, pondera o pesquisador Luís Henrique Paiva.
Pacote do governo é insulficiente
Até o momento, as ações do governo federal para assistência de famílias pobres e trabalhadores informais neste momento de crise é considerada fracassado. Após o governo de Jair Bolsonaro ter anunciado o corte de 96 mil benefícios e a Justiça ter proibido o Executivo de suspender pagamentos, um pequeno aporte ao programa de assistência, insuficiente para atender todo mundo que precisa, foi anunciado. Para atendimento dos trabalhadores informais, lançou um programa de transferência de apenas R$ 200 por pessoa – ampliada mais tarde para R$ 600 por iniciativa do Congresso Nacional.
“Dada a probabilidade de desdobramentos catastróficos do ponto de vista social, nossa recomendação inevitavelmente tende para os cenários mais generosos”, afirmam os pesquisadores.
O Ipea pontua que antes mesmo desta grave crise, os sucessivos cortes orçamentários de 2019 para 2020 foram catastróficos.
“Somente de 2019 para 2020, a dotação orçamentária da proteção social básica caiu cerca de R$ 800 milhões – de R$ 1,8 para R$ 1,03 bilhão. Considerando-se a regra de ouro e a dotação condicionada à aprovação de projeto de lei esse valor se reduz a R$ 687 milhões”, afirmam.
O mesmo vale para os programas de atendimento à população de rua, cujos recursos orçamentários caíram de RS 637 milhões em 2019 para R$ 518 milhões. “Com as mesmas limitações já citadas para a proteção básica, o valor se limita a R$ 345 milhões.”
E o Mansueto fica defendendo os valores desfasados da Dilma. É dose!