
“Neste 20 de novembro, é bom que se registre que o nosso contingente populacional negro é o que mais tem sofrido com a falta de emprego, com o fechamento das escolas, com o fosso social das desigualdades que se aprofundou. Portanto, é hora de unir o conjunto das forças políticas e sociais, respaldadas pela mobilização popular, para derrubar muros e castelos, restabelecer uma democracia plena, reconstruir a Nação através de um programa nacional de desenvolvimento. Por isso a grande urgência da construção da Frente Ampla e Democrática contra o fascismo, que já está em curso. E vamos ser vitoriosos”, afirmou em entrevista ao HP o vice-presidente nacional do CNAB (Congresso Nacional Afro-Brasileiro), Irapuan Santos, ao falar sobre o Dia da Consciência Negra.

O que deve ser comemorado neste Dia da Consciência Negra?
– Antes de tudo acho que neste dia, especialmente, deve ser celebrado a grande capacidade de luta, resistência, engenho e arte do enorme contingencial de negros que formam a Nação brasileira, e que com seu sangue e sabedoria construíram materialmente e culturalmente este gigante ao sul do Equador. Por outro lado, este Dia da Consciência Negra deve ser encarado como um dia de luta, de grandes mobilizações contra o racismo, contra a penúria a que está submetido o povo brasileiro, em defesa da democracia, unificado pela bandeira do “Fora Bolsonaro”.
O que representam os sucessivos ataques do governo Bolsonaro às instituições e personalidades negras brasileiras?
– Estes ataques racistas representam uma faceta do comportamento genocida de Bolsonaro contra o povo brasileiro. Uma das características centrais do fascismo é a tentativa de apagar da memória do povo a sua própria história. Como o papel do negro foi fundamental na construção nacional, foi o elemento unificador ao longo da nossa história, os fascistas tentam nos golpear. Não é por outra razão que colocam um “capitão do mato” na Fundação Palmares, que atentam contra a República, que negam o papel da Abolição da Escravatura e tentam sufocar a cultura nacional ensandecidamente.
Quais são os desafios do movimento negro brasileiro?
– Sem dúvida vejo um momento extremamente positivo. Surgem um grande número de organizações, iniciativas e discussões. Isto é extremamente saudável num momento como este. A diferenciação é um fenômeno inerente ao crescimento. Mas devemos caminhar para um trabalho de unificação através de um programa comum. É importante registrar que nós, do movimento negro brasileiro, não devemos nada a ninguém. Temos nossa própria trajetória e não precisamos copiar bandeiras ou comportamentos de quem quer que seja.
Quais são as alternativas políticas para o povo brasileiro?
– O Brasil é um dos países que mais sofreu com a pandemia da Covid-19, fruto de um governo negacionista e reacionário. Perdemos centenas de milhares de vidas. Milhares de famílias foram dilaceradas. A fome voltou a assolar nossa Pátria. A crise social que enfrentamos é a mais grave de nossa história. Neste 20 de novembro, é bom que se registre que o nosso contingente populacional negro é o que mais tem sofrido com a falta de emprego, com o fechamento das escolas, com o fosso social das desigualdades que se aprofundou. Portanto, é hora de unir o conjunto das forças políticas e sociais, respaldadas pela mobilização popular para derrubar muros e castelos, restabelecer uma democracia plena, reconstruir a Nação através de um programa nacional de desenvolvimento. Por isso a grande urgência da construção da Frente Ampla e Democrática contra o fascismo, que já está em curso. E vamos ser vitoriosos.
O que representou e representa Zumbi dos Palmares para os brasileiros?
– Zumbi dos Palmares é alguém que tem lugar nos patamares mais altos do panteão dos nossos heróis. Ele foi um pioneiro no despertar da consciência de que era necessário haver igualdade social no Brasil. Sua estratégia foi construir um Estado dentro do próprio Estado, mas tinha o objetivo de combater as injustiças e confiar na capacidade do negro se autogerir e se libertar com suas próprias forças. Creio que este sentimento libertário é um dos formadores da alma brasileira. A ele se seguiram outros grandes heróis como Luiz Gama, sua mãe Luiza Mahin, uma plêiade de abolicionistas, João Cândido com sua memorável “Revolta da Chibata”, os brasileiros que construíram a Frente Negra, Abdias do Nascimento, e o nosso patrono Eduardo de Oliveira, fundador do Congresso Nacional Afro-Brasileiro, com quem tive a felicidade de dar os primeiros passos no movimento negro.