Quase quatro vezes o orçamento previsto para o Bolsa Família no próximo ano (R$ 158 bilhões)
Recente estudo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco Nacional) calcula que o governo vai deixar de arrecadar com renúncias fiscais em 2026 o total de R$ 903,3 bilhões. No entendimento da entidade, grande parte desse montante, também chamados tecnicamente “gastos fiscais”, beneficiam apenas a fatia mais rica da população.
Desse montante, a Unafisco entende que R$ 284,9 bilhões são isenções tributárias que se caracterizam por “notória contrapartida social ou econômica” e, portanto, seriam justificáveis.
“Alguns benefícios são importantes”, considera o presidente da Unafisco, Mauro Silva. “Agora, nem todos. Se os benefícios fiscais concedidos não atingem certos objetivos — como a busca do pleno emprego, o desenvolvimento sustentável e a redução de desigualdades —, temos aí um problema. É justamente aí que surge a figura dos ‘privilégios tributários’.”
Dos R$ 618,4 bilhões restantes, ou quase quatro vezes o orçamento previsto para o Bolsa Família no próximo ano (R$ 158 bilhões), não se enquadram em benefícios efetivos para a sociedade, mas pelo contrário, se caracterizam por beneficiar, com isenções, anistias, subsídios e benefícios tributários para setores econômicos, atividades ou grupos sociais específicos.
Os dez maiores gastos tributários somam R$ 479,6 bilhões, ou 78% dos privilégios totais.

Os cálculos da Unafisco consideram os gastos tributários apontados anualmente pela Receita Federal em seu Demonstrativo dos Gastos Tributários (DGT), que acompanha o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), mas adota um conceito mais amplo, incluindo na sua conta outras três renúncias que considera relevantes:
A isenção de lucros e dividendos distribuídos por pessoa jurídica. Imposto que poucos países no mundo não praticam, incluindo o Brasil. Apesar da recente lei que estabeleceu o fim da isenção total, ela ainda taxa os dividendos abaixo de outras rendas, como salários, taxadas atualmente a um alíquota nominal entre 15% e 27,5%.
O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), previsto na Constituição e até hoje não regulamentado pelo Congresso. Em novembro passado o Supremo Tribunal Federal (STF) apontou essa omissão legislativa.
E, ainda, os programas de parcelamentos de débitos tributários, como o Programa de Recuperação de Créditos Fiscais (Refis) e o Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), cuja a prática recorrente incentiva o sonegador contumaz. Contribuintes que deixam de pagar impostos no prazo, esperando por esses programas.
Os estudos da Unafisco expressos pela Nota Técnica Nº 35 e o Privilegiômetro Tributário pretendem expressar a relevância da aplicação correta do conceito constitucional de gasto tributário. “Um DGT que não obedece ao texto constitucional revela opção ideológica, não apenas critério econômico, que afeta a decisão dos agentes políticos sobre as políticas públicas a serem adotadas”, se posiciona a entidade.
A isenção do Imposto sobre a Renda (IR) na distribuição de lucros e dividendos por empresas, principal isenção fiscal, é igual aos R$ 146,1 bilhões. Este valor já considera taxação de até 10% sobre rendimentos a partir de R$ 600 mil por ano, introduzida pela Lei 15.270/25, a partir do ano que vem.
“Quando a União não inclui no gasto tributário a isenção para lucros e dividendos, isso retira do Legislativo uma oportunidade de debate. Eles não são informados o quanto essa isenção traz de prejuízo ao país. Sabemos que temos R$ 1 trilhão de dividendos distribuídos, anualmente no Brasil, e é preciso que isso faça parte desse debate entre Executivo e Legislativo na elaboração do Orçamento”, disse Mauro Silva à BBC Brasil.
A segunda e mais significativa isenção na lista dos maiores privilégios tributários, é a não instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas (R$ 100,5 bilhões). Tais privilégios tributários beneficiam justamente contribuintes com maior capacidade contributiva.
“Os estudos existentes mostram que o bolo das renúncias fiscais é enorme e crescente. O que o Privilegiômetro faz é mostrar quem está comendo esse bolo, quanto leva e por que parte relevante disso não pode ser chamada de política pública, mas de privilégio tributário”, afirmou o presidente da Unafisco Nacional para a revista ISTOÉ Dinheiro.











