Voltemos à reportagem sobre o ocultamento de documentos localizados pelos historiadores israelenses. O encontrado pela historiadora Tamar seguia “descrevendo massacres adicionais, saques e abusos perpetrados pelas forças israelenses”.
E mais adiante, “não há nome no documento e não está claro quem está por trás dele. Eu achei muito perturbador. Eu sabia que o fato de encontrar um documento como este me tornava responsável por esclarecer o que havia acontecido”.
Diz o jornal israelenses que, nos anos que se seguiram, foram feitas denúncias de que a 7ª Brigada cometera crimes de guerra em Safsaf. “Tais denúncias agora se apoiavam no documento que foi visto pela historiadora Tamar Novick e que se constituía evidência adicional de que o alto escalão militar israelense sabia das ocorrências em tempo real”, segue o Haaretz.
Quando ela perguntou ao colega Benny Morris onde ele havia encontrado as mesmas informações contidas em seu livro “O nascimento do problema dos refugiados palestinos, 1947, 1949”, ele lhe esclareceu que tinha tido acesso a notas do integrante do Comitê Central do Mapam, Aharon Cohen, quando se referia a um informe de Israel Galili, um dos chefes das milícias que compunham a Haganah, que posteriormente viria a ser a formação central do exército de Israel.
As anotações de Cohen, citadas por Morris, coincidem com precisão com as descrições contidas no documento localizado pela Dra. Novick.
OCULTAÇÃO SISTEMÁTICA E ILEGAL
Certificada da veracidade das informações através dessa checagem, a historiadora retornou ao mesmo local, Yad Yaari e, para sua surpresa descobriu que o documento já não estava mais lá.
“Levou algum tempo para que eu considerasse a possibilidade de que o documento havia simplesmente desaparecido”, confessou Tamar Novick.
“Quando ela perguntou”, acrescenta a reportagem de Hagar Shezaf para o Haaretz, aos encarregados pelo documento, lhe foi dito que ele havia sido trancafiado em um cofre [localizado no subsolo do mesmo local] “por ordem do Ministério da Defesa”.
Mais de cem documentos foram ocultados como parte desse esforço sistemático de esconder as pegadas dos crimes da Nakba. Quem também detectou isso foi o Instituto Akevot para o Conflito Israel-Palestina. Um informe deste instituto corrobora que a ação é centralizada pelo tal órgão denominado Malmab (acrônimo em hebraico de Diretoria de Segurança da Autoridade de Defesa).
Segundo o informe da organização Akevot, o Malmab retirou do público documentos já anteriormente autorizados à divulgação pelos órgãos de governo e, portanto, o fez sem autoridade legal para que assim procedesse.
Sem divulgar nomes, o jornal israelense afirma que “em alguns casos, diretores [dos arquivos onde estavam os documentos] foram ameaçados”.
Yehiel Horev, que dirigiu o Malmab por duas décadas, até 2007, foi quem lançou essa ação que ainda está em pleno andamento. Perguntado sobre o que motiva o Ministério da Defesa a agir assim disse que a ocultação era “justa” pois, “liberar este material poderia provocar perturbações na população árabe do país” e confessou que o objetivo “é minar a credibilidade dos estudos sobre a história do problema dos refugiados”. Na visão de Horev, “uma alegação que não pode ser comprovada nem refutada não tem o mesmo peso de uma alegação feita por um pesquisador respaldada em documentos originais”.
‘ATOS NAZISTAS’ – DENÚNCIA E REPULSA
O Haaretz declara que sua investigação acabou por conseguir localizar um memorando de Aharon Cohen que serve de referência ao documento agora oculto. Segundo Cohen houve uma reunião do Comitê Político do Mapam para tratar dos massacres e expulsões de 1948. “Os participantes foram chamados a colaborar com uma comissão de inquérito que investigaria os eventos daquele ano”.
No memorando, Cohen se refere a denúncia feita por um participante “na aldeia de Al-Dawayima”. Atos de vandalismo e saque também foram informados sendo citadas as cidades de Lod [antiga Lida onde hoje está localizado o aeroporto de Tel Aviv], Ramle e Be’er Sheva.
Segundo Cohen, relatando um episódio que mostrava contradições ao nível dos escalões inferiores do comando do país à época, a decisão tomada ao final da reunião na sede do Mapam estabelece que “O partido é contra a expulsão quando não houver necessidade militar para isso. Há diferentes abordagens para a avaliação de tal necessidade e mais esclarecimentos são necessários. O que aconteceu na Galileia – estes são atos nazistas! Cada um dos nossos integrantes deve informar de tudo o que sabe” (grifo nosso).
Apesar do esforço do governo israelense para esconder os crimes da Nakba, nem todos os documentos da maior importância ainda estão inaccessíveis, graças ao esforço de historiadores e arquivistas de organizações como a Akevot e do próprio jornal Haaretz.
Um deles, é um memorando escrito por um oficial do Shin Bet (o serviço secreto interno de Israel) que, à época dos massacres de 1948, se chamava Shai.
Segundo o historiador Morris, o autor deste informe é Moshé Sasson que discorre o esvaziamento dos habitantes palestinos da região onde se construiria o Estado de Israel, com a macabra tarefa já em grande parte levada a efeito, em junho de 1948, ou seja, com o terror ainda em andamento, e que recebeu o título de “A Emigração dos Árabes da Palestina”.
Com base nestes papéis que Morris escreveu um artigo de grande repercussão em 1986. Foi o suficiente para que o material desaparecesse do arquivo onde ele o havia localizado e ficou inaccessível por algum tempo.
O que o pessoal do Malmab não podia prever é que pesquisadores trabalhando para a organização Akevot encontrariam, anos depois, uma cópia do mesmo texto e aí não deu mais para esconder, pelo menos estas revelações.
LIMPEZA ÉTNICA ‘ABENÇOADA’
Já na introdução do memorando de Sasson, o escritor, descreve o mês de maio de 1948 (a “Declaração de Independência de Israel” foi lida por Ben Gurion no dia 14 daquele mês) como “abençoado com a evacuação do máximo de lugares”.
O mesmo autor estipula como primeira razão para o êxodo “atos diretos de hostilidade contra os povoamentos árabes” e a segunda foi o “impacto dessas operações nas aldeias vizinhas”; a terceira causa foram as “operações pelos dissidentes”, neste terceiro caso referindo-se aos bandos terroristas clandestinos Irgun (do qual um dos dirigentes, Menachem Begin, tornou-se depois premiê israelense) e Lehi.
A versão que Israel sustenta como única para o deslocamento palestino aparece aí somente como quarta causa que inclui a tensão nas lutas entre os grupos de combate árabes que resistiam às operações de tomada da Palestina e as forças da Haganah, além de isoladas orientações de líderes destes grupos para que os moradores se afastassem por conta do perigo da troca de tiros e do bombardeio.
A quinta razão para o êxodo em massa foram “os boatos espalhados pelos judeus entre os árabes” para induzi-los a fugir e o sexto fator, “os ultimatos de evacuação”.
Sasson prossegue, determinando: “sem dúvida, as operações hostis eram a principal causa do movimento da população” soma-se a esta as falas nos “alto falantes, em língua árabe, que provaram sua efetividade quando usados de forma apropriada”.
Aí vale destacar uma ação terrorista descrita por Sasson e executada em conjunto pelas ganques Irgun e Lehi e que ajudou em disseminar o sentimento de insegurança e logo a seguir gerou a fuga de aldeões da Galileia central.
“Muitos, nas aldeias da Galiléia central começaram a fugir depois do sequestro de notáveis de Sheikh Muwannis [uma aldeia ao norte de Tel Aviv]. Os árabes aprenderam que não era suficiente para eles chegarem a acordos [de rendição] com a Haganah e que há outros judeus [isto é as tais ‘milícias dissidentes’] às quais também deviam temer”.
Daí é exposta a eficácia dos ultimatos, na mesma região: “Naturalmente, a ação destes ultimatos, assim com o efeito dos ‘avisos de amigo’ vinham após uma certa preparação do terreno por meio de ações hostis na área”.
O documento traz um capítulo citando, resumidamente, mais uma série de ações de expulsão; “Ein Zeitun – ‘nossa destruição da aldeia’; Tira – ‘aviso amigável de judeus’; Qeitiya – ‘destruição e ameaças de mais ações’; Almaniya – ‘nossa ação, muitos mortos’; Al’Amarir – ‘depois de roubo e assassinatos por parte dos dissidentes’; Sumsum – ‘nosso ultimato’; Bir Salim – ‘ataque ao orfanato’ e Zarnuga – ‘conquista e expulsão’”.
A INDIGNAÇÃO DO HISTORIADOR BENNY MORRIS
Dia 12, uma semana depois das denúncias Shezaf, o próprio historiador Benny Morris escreveu outro artigo publicado também no Haaretz, intitulado, “A ocultação de documentos da Nakba por Israel é totalitária”.
Aqui vão trechos das recentes revelações do historiador israelense que começou a desvendar para o grande público os crimes de limpeza étnica em 1986:
“Mas de dois anos atrás estava preparando uma coletânea de artigos para meu livro mais recente em Hebraico, intitulado ‘De Deir Yassin a Camp David’, publicado em 2018, pedi permissão às Forças de Defesa de Israel e aos Arquivos do Sistema de Defesa para dar mais uma olhada nos documentos do massacre na aldeia árabe de Deir Yassin, por duas milícias/ organizações terroristas – Irgun e Lehi – nas proximidades de Jerusalém Ocidental, em 9 de abril de 1948. Naquele dia de 100 a 120 aldeões foram mortos, a maioria deles mulheres, crianças e idosos.
“Estes documentos estavam abertos aos pesquisadores e ao público em geral no início do século e eu citei extensivamente trechos deles em meu artigo, “A Historiografia de Deir Yassin”, na edição de 2005 do jornal da Universidade de Tel Aviv sobre história israelense.
“Agora eu estava pedindo para ver os documentos novamente, mas o diretor do arquivo negou o meu pedido. A única explicação murmurada foi de ‘os documentos agora estão fechados’.
“A idiotice das ações do Malmab em ocultar o material incriminador sobre a expulsão e os massacres por membros da Haganah, Irgun e Lehi e ainda as forças armadas em 1948 é de alucinar. Toda a história já foi contada desde 1988 em numerosos livros e artigos em hebraico e inglês, por mim mesmo e outros, em parte com base nestes documentos que estavam aberto a acadêmicos e ao público em geral. A tentativa do Malmab de esconder este material é similar a fechar a porta do estábulo depois do cavalo ter fugido.
“Mas, como indica o artigo de Shezaf, os chefes do Malmab tinham ou têm a esperança de que suas ações de bloqueio da acessibilidade ao material israelense irão levantar dúvidas sobre o trabalho dos pesquisadores, suas conclusões e a credibilidade dos acadêmicos, incluindo a mim, diante dos leitores de seus livros e artigos.
“A lei israelense diz que documentos diplomáticos devem ser abertos depois de 30 anos e documentos militares depois de 50 anos, a menos que a sua exposição possa prejudicar a segurança nacional ou as relações internacionais do país. E, ainda, a decisão de estender o sigilo não cabe a órgão sombrio como o Malmab decidir, mas a um comitê ministerial especial dirigido pelo Ministério da Justiça em acordo com os órgãos estatais de arquivamento.
“Além disso, uma decisão deste tipo deve ser considerada com relação a cada documento em separado e não como um esforço generalizado estendido a um conjunto de documentos.
“Em geral, as ações do Malmab com relação aos documentos de 1948 e dos anos posteriores é um ato bobo e malévolo típico de regimes totalitários.
“As questões permanecem: quem deu a autoridade ao Malmab para isso? Quem deu a ordem para filtrar material de 1948 e sobre 1948 para embelezar a história de Israel? Foram os primeiros-ministros Ariel Sharon ou Ehud Olmert ou, mais provavelmente, Benjamin Netanyahu? Ou alguém falando em seu nome?”.
FALAM OS GENERAIS
No início dos anos 2000, o Centro Yitzhak Rabin (denominação em homenagem ao premiê assassinado após iniciar a retirada dos territórios ocupados depois da assinatura dos Acordos de Oslo, com Yasser Arafat) realizou uma série de entrevistas com destacadas personalidades e chefes militares do período. Estas entrevistas também foram ocultadas por ordem do Malmab, que as declarou secretas.
Agora, o Haaretz declara que teve acesso a diversas dessas entrevistas também.
Uma das entrevistas transcritas foi concedida pelo Major General (da reserva), Elad Peled ao historiador Boaz Lev Tov.
Escolhemos o seguinte trecho deste depoimento que foi colocado sob segredo de Estado para encerramento desta matéria:
Lev Tov: Estamos falando sobre uma população – mulheres e crianças?
Peled: De todos, sim.
Lev Tov: Você não faz distinção entre eles?
Peled: O problema é muito simples. A guerra é entre duas populações. Eles saíram de suas casas.
Lev Tov: Se a casa existe, eles têm para onde retornar?
Peled: Não são exércitos, são gangues. Nós também, somos, na verdade, gangues. Nós saímos e voltamos para casa. Eles saíram e voltam para casa. Ou é a casa deles ou é a nossa casa.
Lev Tov: Os escrúpulos só aparecem nas gerações mais recentes?
Peled: Sim, hoje. Quando eu me sento na minha poltrona, aqui, e penso no que aconteceu, todo tipo de pensamentos vem à minha mente.
Lev Tov: Esse não era o caso então?
Peled: Veja, deixe-me lhe contar algo ainda que menos agradável e cruel, sobre a razia em Sa’sa [aldeia árabe já citada, que fica na Galileia]. O objetivo era, na realidade, dissuadi-los, dizer a eles, ‘Caros amigos, a Palmach [tropas de choque da Haganah] pode chegar em todo canto, vocês não estão imunes’. Ali se localizava o coração do povoamento árabe. Mas, o que nós fizemos? Meu pelotão explodiu mais de 20 casas com tudo que havia ali.
Lev Tov: Enquanto as pessoas dormiam ali?
Peled: Suponho. O que aconteceu lá, nós viemos, entramos na aldeia, colocamos uma bomba nas proximidades de cada casa e depois houve um toque de corneta, porque nós não tínhamos rádios, e este foi o sinal para nossas forças saíram. Corremos na direção oposta, enquanto os sapadores ficaram, era tudo primitivo. Eles acionaram o detonador e todas estas casas se foram.
Como se pode ver, ao longo desta matéria, a limpeza étnica que agora o governo israelense busca ocultar, foi executada de maneira sistemática, fria e calculada.
DECISÃO E REMORSO
Mostrando que a opinião favorável aos massacres não foi unânime, houve, aqui e ali, embora de forma vergonhosamente limitada, manifestações raras de dúvida e de remorso. É o caso do poeta mais decantado da fase sionista de implantação do Estado de Israel, Nathan Alterman, que escreveu um poema quando soube pela primeira vez dos massacres na Galileia.
O poema foi reproduzido por Pappe no seu “Limpeza Étnica”:
“Em um jipe ele cruzou as ruas/ Jovem, príncipe da Alcateia/ Um casal de velhos apertou-se contra a parede/ E com seu sorriso angelical ele clamou:/ ‘A submetralhadora experimentarei’, e cumpriu/ Espalhando o sangue vermelho no meio-fio”
Em junho de 1948, já com grande parte do Plano D executada e outra parte ainda em andamento, o dirigente máximo do projeto sionista, Ben Gurion, foi direto e sucinto ao responder a alguns dos dirigentes da Agência Judaica que ousavam questionar a horrenda dimensão da brutalidade em curso. “Eu sou pela transferência compulsória, não vejo nada imoral nela”, disse o premiê israelense de então.
NATHANIEL BRAIA
O fogo eterno está quimando e aguardando todos os canalhas e covardes desse planeta terra, isto é fato é só aguardar a sua hora ela vai chegar.
Pior é a Unesco dizer que os judeus não tem relação alguma com Samaria, Judeia e Galileia. Se for assim rasga-se a Bíblia cristã, nem falo da Bíblia judaica.
Só por curiosidade: o que tem uma coisa a ver com a outra?