Ao invés de mostrar arrependimento e disposição para o diálogo, representante do governo Abe manifestou-se arrogantemente sobre a sugestão, feita na semana passada, pelo presidente da Assembleia Nacional sul-coreana, Moon Hee-sang, de que o imperador Aikhito “como filho do principal culpado por crimes de guerra [o então imperador Hirohito]”, deveria pedir desculpas às mulheres coreanas que foram feitas de escravas sexuais pelos invasores japoneses, antes de renunciar no final de abril.
No jargão do exército imperial fascista japonês, as asiáticas sequestradas e levadas a bordeis para servirem a oficiais e soldados invasores eram as “mulheres de conforto” e a questão através das décadas desde o final da II Guerra segue sem solução porque Tóquio continua fugindo das suas imensas responsabilidades, enquanto as sobreviventes, já em avançada idade, exigem o reconhecimento formal do crime a que foram sujeitadas.
Para o secretário-chefe do gabinete japonês, Yoshihide Suga, é Moon quem tem que fazer “um pedido de desculpas e a retirada de seus comentários”, que classificou de “absolutamente inadequados” e “extremamente lamentáveis”.
Absolutamente inadequados e extremamente lamentáveis foram, para dizer o mínimo, os assombrosos crimes de guerra cometidos contra os povos dos países invadidos pelas hordas japonesas, do massacre de Shanghai às “mulheres de conforto” e aos experimentos macabros de guerra bacteriológica. Ou a proibição do uso de nomes coreanos e do idioma coreano, durante a anexação da milenar nação coreana às botas japonesas de 1910-45.
Tóquio diz que tudo foi resolvido com o acordo de 2015, feito pelo governo da atual presidiária Park Geun-hye, que consistiu de escusas meia boca e um fundo de nove milhões de dólares para indenizar – e tentar calar – as idosas vítimas. Muitas delas se recusaram a aceitar tal dinheiro, dizendo que as desculpas não eram sinceras e desde 2017 o atual governo considera falho o acordo. (Antes, o Japão dizia que tudo fora resolvido em 1965, pelo acordo entre Tóquio e Seul de “normalização de relações”, com ambos ocupados pelos EUA).
Numa notável manifestação de comedimento, a chancelaria sul-coreana retrucou ao abusado, dizendo que “nosso governo continuará se esforçando para fomentar relações voltadas para o futuro, ao mesmo tempo incentivando uma solução inteligente para questões do legado histórico”. O porta-voz do ministério, Roh Kyu-deok, ainda ponderou que o presidente do parlamento sul-coreano estava salientando a necessidade de Tóquio mostrar uma “atitude sincera” para curar as feridas.
TRABALHO ESCRAVO
Também entidades japonesas que pleiteiam que Tóquio corrija em alguma medida os crimes do passado exigiram que o governo Abe pare de pressionar corporações japonesas, condenadas pela Suprema Corte sul-coreana no ano passado, por trabalho escravo durante a guerra, para que não acatem as sentenças e não paguem as reparações determinadas por esse tribunal.
Carta da “Ação Conjunta” entregue à chancelaria japonesa na sexta-feira da semana passada questiona com base em que o governo Abe alega que a sentença da Suprema Corte sul-coreana “viola o direito internacional” e “destrói a base legal das relações entre Japão e Coreia do Sul”, num caso sobre trabalho escravo sob guerra e ocupação militar. As entidades de direitos humanos se espantaram com a orientação do governo Abe a que as corporações acusadas “não obedeçam à sentença” e “não compensem as vítimas”.
Takahashi Makoto, dirigente de uma das organizações que apoiam os processos civis contra o recrutamento à força de trabalhadores coreanos para uma fábrica cuja sucessora é a Mitsubishi Nagoya, também entregou à chancelaria japonesa cópia do depoimento escrito de Kim Jung-gon, um desses trabalhadores escravos, recentemente falecido, submetido a um tribunal japonês em 2006. Na declaração estão as palavras: “Eu não posso morrer até que o transgressor admita o mal que fez”.