Profissionais da rede de comunicação vestiam coletes de mídia e o carro portava placas de identificação de imprensa. “Assassinatos de Israel são seletivos. É uma campanha sistemática”, denuncia a Al Jazeera, quando já morreram 165 profissionais da imprensa assassinados pelas tropas de Netanyahu
Vestindo coletes de mídia e com o carro rigorosamente identificado com placas de imprensa, o jornalista Ismail al-Ghoul e seu cinegrafista Rami al-Rifi, ambos da rede Al Jazeera, foram executados nesta quarta-feira (31) no campo de refugiados de Shati, a oeste da Cidade de Gaza.
“Este último ataque aos nossos profissionais faz parte de uma campanha sistemática contra os nossos jornalistas e suas famílias desde outubro de 2023”, afirmou a Al Jazeera Media Network, qualificando a atrocidade de “assassinatos seletivos”. A rede prometeu honrar a memória dos jovens – nascidos em 1997 – e “tomar todas as ações legais para processar os perpetradores desses crimes”.
O presidente do Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), Jodie Ginsberg, afirmou que os dois assassinatos são o exemplo mais recente dos riscos de documentar a guerra em Gaza, “o conflito mais mortal para jornalistas que a organização cobriu em 30 anos”.
Os profissionais foram mortos em um ataque aéreo quando faziam uma reportagem próximo à residência de Ismail Haniyeh, o líder político do Hamas – assassinado por Israel nas primeiras horas do mesmo dia em Teerã, capital do Irã.
Anas al-Sharif, também da Al Jazeera, informou que “Ismail estava transmitindo o sofrimento dos palestinos deslocados, o sofrimento dos feridos, bem como os massacres cometidos pela ocupação [israelense] contra o povo inocente”. “A sensação é de que não há palavras que possam descrever o que aconteceu”, relatou.
Os profissionais da Al Jazeerah, Ismail al-Ghoul e Rami contataram a redação pela última vez 15 minutos antes do ataque. Durante a ligação, eles relataram um ataque a uma casa próxima de onde estavam reportando e foram instruídos a sair imediatamente. Saíram e seguiam de carro rumo ao Hospital Al-Ahli Arab quando foram bombardeados.
Veja vídeo com colega dos jornalistas denunciando o crime contra a imprensa:
O escritório de mídia do governo de Gaza estima que 165 profissionais da imprensa, com mais de 140 jornalistas palestinos foram mortos desde o começo da barbárie israelense em 7 de outubro de 2023.
Para o editor-chefe da Al Jazeera em árabe, Mohamed Moawad, os jornalistas da rede sediada no Catar foram covardemente executados enquanto “cobriam corajosamente os eventos no norte de Gaza”.
PROFISSIONALISMO E DEDICAÇÃO NA DENÚNCIA DAS ATROCIDADES
Ismail era conhecido por seu profissionalismo e dedicação, chamando a atenção do mundo para o sofrimento e as atrocidades cometidas em Gaza, especialmente no Hospital al-Shifa e nos bairros ao norte do enclave completamente sitiado. Sua esposa está vivendo em um acampamento no centro de Gaza e não vê o marido há meses, que também deixa uma filha pequena.
“Sem Ismail, o mundo não teria visto as imagens devastadoras desses massacres”, escreveu Mohamed Moawad no X, acrescentando que al-Ghoul “cobriu implacavelmente os eventos e transmitiu a realidade de Gaza ao mundo por meio da Al Jazeera”.
“Sua voz agora foi silenciada, e não há mais necessidade de gritar ao mundo que Ismail cumpriu sua missão para seu povo e sua terra natal. Que vergonha para aqueles que falharam com os civis, jornalistas e a humanidade”, sublinhou o editor-chefe da Al Jazeera.
Os assassinatos de quarta-feira elevam para quatro o número total de jornalistas da Al Jazeera mortos em Gaza desde o início da guerra. Em dezembro, Samer Abudaga foi trucidado em um ataque israelense em Khan Younis, enquanto o chefe do escritório, Wael Dahdouh, ficou ferido. A esposa, o filho, a filha e o neto de Dadouh perderam a vida em outubro durante um bombardeio aéreo israelense ao campo de refugiados de Nuseirat.
Em janeiro, o filho de Dahdouh, Hamza, que também era jornalista da Al Jazeera, foi dilacerado por um míssil israelense em Khan Younis.
Em maio de 2022, a correspondente da Ak Jazeera, Shireen Abu Akleh, foi executada a tiros por um soldado israelense enquanto cobria um ataque em Jenin, na Cisjordânia ocupada. Embora Israel tenha reconhecido que seu soldado provavelmente atirou fatalmente em Abu Akleh, não realizou qualquer investigação criminal.
Reportando de Deir el-Balah, do centro de Gaza, na mesma quarta-feira, Hind Khoudary, da Al Jazeera, refletiu sobre os perigos diários que os jornalistas enfrentam. “Fazemos tudo [para permanecer seguros]. Usamos nossos casacos de imprensa. Usamos nossos capacetes. Tentamos não ir a nenhum lugar que não seja seguro. Tentamos ir a lugares onde podemos manter nossa segurança, mas fomos alvos em lugares normais onde cidadãos normais estão”, declarou a repórter Hind Khoudary, da Al Jazeera. “Estamos tentando fazer tudo, mas, ao mesmo tempo, queremos relatar, queremos contar ao mundo o que está acontecendo”, concluiu.