“Se o Banco Central não reduzir os juros esta semana nós vamos ter por mais de 12 meses consecutivos a Selic em 13,75%”, disse José Luís Oreiro. Virgílio Guimarães classificou as taxas de juros do BC como “imorais”. Nilson Araújo afirmou que o juro alto “é o nó a ser desfeito agora”. Rene Vicente defendeu mobilizações dos trabalhadores e da sociedade
Em debate promovido pelo Observatório da Democracia, na segunda-feira (31), economistas e sindicalistas denunciaram que o Banco Central (BC), comandado por Roberto Campos Neto, está boicotando a retomada da economia, ao seguir mantendo o nível do juro elevado no Brasil. O encontro foi mediado pela advogada Amanda Sobreira, diretora da Fundação João Mangabeira, do PSB.
No debate, intitulado Contra os juros altos, pelo desenvolvimento, organizado por Fundações partidárias, participaram o professor da Universidade de Brasília (UNB) José Luís Oreiro, pela Fundação João Mangabeira; o professor da Universidade da Integração Latino-Americana (UNILA) Nilson Araújo de Souza, pela Fundação Maurício Grabois e o Instituto Cláudio Campos; o vice-presidente da Central dos Trabalhadores e das Trabalhadoras do Brasil (CTB), Rene Vicente, e o economista e ex-deputado federal Constituinte pelo PT, Virgílio Guimarães, pela Fundação Perseu Abramo.
JOSE LUÍS OREIRO
Ao destacar que a inflação no Brasil não foi causada por excesso de demanda, mas pela elevação dos preços dos alimentos, energia e insumos industriais, consequência dos eventos da pandemia de Covid-19 e da guerra entre Rússia e Ucrânia, o economista José Luís Oreiro afirmou que, diante destes eventos circunstanciais, já em meados de 2022 a inflação começou a cair no Brasil e no mundo, e agora em junho de 2023 a inflação fechou em 3,18%.
“Essa inflação foi um fenômeno transitório, é um fenômeno causado por um choque de oferta”. Os bancos centrais no mundo inteiro reagiram aumentando juros. Mas, o que chama a atenção, é que no caso brasileiro, é que nós fomos os primeiros a aumentar os juros e aumentamos muito, mais do que os outros bancos centrais. Agora que o Federal Reserve (FED), que é o Banco Central americano, elevou a taxa de juros para cinco e meio por cento. Que é menos da metade da taxa de juros brasileira. Eles [os EUA] estão com uma inflação bem maior do que nós”, lembrou o economista.
Assista a debate
“O que justifica essa persistência da Selic nos últimos 12 meses nesse patamar de 13,75%?, questionou. “Se o Banco Central não reduzir os juros esta semana nós vamos ter por mais de 12 meses consecutivos a Selic em 13,75%. Bom, certamente não a inflação. Se havia receio de que haveria algum repique inflacionário, de que a inflação pudesse estar fora do controle no Brasil, os dados estão mostrando de maneira inequívoca que isso não é o caso. A inflação brasileira, ela não só está sob controle, mas como ela está caindo, mês após mês, inclusive devido à queda do dólar, olha o IGPM, por exemplo”, já está dois ou três meses com deflação”, citou o economista.
“Então, o mais provável fator que explica a relutância irracional do Banco Central de manter a taxa de juros em 13,75% ao ano, ao longo dos últimos seis meses, é o fato de que o presidente do Banco Central quer fazer tudo que estiver ao alcance dele para atrapalhar o governo Lula. Nós sabemos que a taxa de juros tem um impacto muito relevante sobre o nível de atividade econômica. Ela impacta as decisões de investimento do setor privado, ela impacta as decisões de consumo, e se ela for mantida alta muito tempo vai gerar uma enorme sobrevalorização do câmbio que gera desindustrialização prematura. Então, ele está fazendo o que pode para estragar o governo, ou pelo menos para não viabilizar o governo Lula do ponto de vista econômico”, denunciou Oreiro.
NILSON ARAÚJO
O economista e professor Nilson Araújo de Souza ressaltou que neste momento o principal obstáculo conjuntural à retomada sustentável do crescimento econômico é a elevada taxa de juros.
“As pessoas ficam imaginando que a taxa de juros está estacionada em 13,75%. Ela não está estacionada, há um ano está estacionada em termos nominais, só que nesse período a inflação caiu de 9,67% para 3,16%. Então, o que ocorreu, em termos reais, é que antes estava perto de 4%, e agora está em 10%. Além da violência e da rapidez com que foi feito isso, aumentou violentamente em termos reais”, criticou.
“Se a taxa de juros está alta, eu não vou aplicar na minha empresa, vou aplicar no mercado financeiro. Aí a atividade produtiva é sacrificada. O consumidor é igual. Tem mais de 6 milhões de empresas, micro, pequenas e médias empresas, que estão com problema de dívida. Isso arrasa a economia e impede a economia de crescer”, denunciou.
Nilson ressaltou também que o governo Lula tem tomado algumas medidas para reativar a economia que “estão na direção correta”. “Mas tem uma pedra no meio do caminho que pode complicar isso. Economia nenhuma se sustenta com a taxa de juros nessa proporção. O pessoal do BC diz que a causa é a inflação. A inflação não é de demanda”, argumentou.
A inflação é de oferta, explica o economista. “Problema que ocorreu nas redes mundiais de suprimento e por conta dos produtos agrícolas exportados, porque não tem mais estoque regulador aqui e depois tivemos que comprar pelo preço internacional. A política de reajuste dos combustíveis da Petrobrás baseada em parâmetros internacionais, criada só para aumentar os lucros dos acionistas minoritários [da estatal], também elevou a inflação”, lembrou o professor Nilson.
“A explicação dada por eles para manter a taxa de juros elevada não tem fundamento”, criticou. “Tornar o BC independente, tornou ele independente do governo. E mais dependente ainda do sistema e do capital financeiro. Campos Neto é um bolsonarista convicto, que veste a camisa. E ele está aí para sabotar o governo Lula”, denunciou. “Esse é o entrave. Se depender dele, ele vai diminuir [a Selic] em doses homeopáticas”.
“Reduzir o juro é uma decisão política, não técnica. Isso está apertando o trabalhador que perde o emprego, o empresário, aperta a classe média. Pasmem, até banqueiro está propondo a diminuição da taxa de juros. Por que estão quebrando, os seus clientes não conseguem pagar os empréstimos como ocorreu nos Estados Unidos. Então dá para formar uma frente nacional mais ampla do que a que elegeu o Lula para derrubar os juros”, afirmou Nilson Araújo.
RENE VICENTE
Rene Vicente, vice-presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), ressaltou que as centrais sindicais estão trabalhando de maneira unitária na batalha pela redução dos juros e pela derrubada de Campos Neto do comando do Banco Central.
“Uma batalha que nós das centrais sindicais temos travado de maneira unitária é a batalha pela redução dos juros. O principal desafio é explicar para a população, para os trabalhadores e trabalhadoras, o que significa uma taxa de juros de 13,75% ao ano”, disse Vicente, que também é presidente da CTB de São Paulo e diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema).
“O lema da nossa campanha é: poucos lucram e muitos perdem. Os exemplos estão aí: o gasto do governo com a dívida mais que dobrou, só no ano passado foram 617 bilhões de reais, dinheiro que era para ser investido em saúde, educação, moradia”, disse Rene Vicente, apontando que, neste quadro de usura que o país vive, os mais pobres e a classe média são os que mais sofrem.
“Vai comprar um carro, compra um gol e paga por dois e meio. O parcelamento é cada vez mais caro, a taxa de juros do cartão de crédito, do cheque especial. O quanto tudo isso não prejudica o consumo? Uma pessoa vai comprar uma geladeira, compra uma e paga duas: uma para a loja e outra para o banco. A indústria deixa de produzir, o dono da loja vende menos, causa desemprego. Vão comprando menos, com medo de endividamento, olha o nível de inadimplência. É uma bola de neve”, denunciou.
VIRGÍIO GUIMARÃES
O economista Virgílio Guimarães, da Fundação Perseu Abramo, classificou as taxas de juros do BC como “imorais”. Guimarães citou que, para a taxa de investimentos, por exemplo, é indispensável uma taxa de juros civilizada, que deem condições de subir a taxa de investimentos acima do nível atual. “Não podemos ficar nos 18%”.
“Nós temos que chegar a uma taxa de juro substancialmente menor. Precisamos colocar no seu devido lugar a taxa de juros, vamos corrigir esse absurdo”, defendeu.
A. ROSA, P. CASALE E J.AMARO