Juros de Galípolo põem Brasil com o maior gasto de dívida pública do mundo

Nos 12 meses encerrados em outubro, as despesas líquidas com juros somaram R$ 987,2 bilhões, o equivalente a 7,88% do PIB (Foto: José Cruz - Agência Brasil)

Na lista de 153 países, Brasil foi o país que teve os maiores gastos com juros pagos sobre a dívida pública em 2024, atingindo 8,28% do PIB

O Brasil, de uma lista de 153 países, foi o país que teve os maiores gastos com juros pagos sobre a dívida pública em 2024, atingindo 8,28% do PIB.

Nos 12 meses encerrados em outubro, as despesas líquidas com juros somaram R$ 987,2 bilhões, o equivalente a 7,88% do PIB. Para o fechamento do ano, a expectativa é que esse montante supere R$ 1 trilhão, atingindo novamente o patamar alcançando no ano passado, em torno, mais provável, acima de 8% do PIB.

Os números são do Fundo Monetário Internacional (FMI), compilados na Base de Dados das Finanças Públicas na História Moderna, atualizada neste mês. A avaliação consta de análise publicada pelo Valor Econômico em 22/12.

O ponto mais perverso nesse trilhão é que ele não está pagando juros sobre um dinheiro que “entrou no caixa” e foi utilizado para uma nova escola, para melhoria do salário do professor, para construção de uma nova estrada. Nada disso, mais de 95% dos juros pagos, são juros sobre juros.

Em outros termos, conforme os números e projeções da Instituição Fiscal Independente (IFI), o rombo nominal deve ficar (2025) em 8,5% do PIB, composto por despesas financeiras (juros) de 8% do PIB e um déficit primário (que não inclui gastos com juros) de 0,5% do PIB.

Não há nada mais explosivo em termos do aumento de qualquer dívida financeira, pública ou privada, do que a combinação de altas taxas de juros, volumes altos de dívida e longos prazos.

Dados de dívidas públicas no Brasil dão a pista de que foi no emaranhado desses fatores que chegamos aos números do endividamento a nossa frente, neste final de 2025.

A média aritmética das taxas Selic fixadas pelo Copom desde junho em 1996 é superior a 10%. Situando-se aproximadamente 13,2% ao ano.  Com base nos dados do Histórico de Taxas de Juros do Banco Central, o cálculo para as 275ª reuniões do Copom de junho de 1996 a dezembro de 2025.

Se a média nominal de juros é 13,2%, a taxa real de juros é mais assustadora ainda. Média Estimada: De julho de 1994 até o final de 2025, a taxa de juros real média no Brasil situa-se em torno de 8% a 9% ao ano.

O fato é que a taxa de juros básica da nossa economia, a Selic, remunera as aplicações sobre o Tesouro Nacional em 15% ao ano, mais do que a maioria do retorno de capital das indústrias, do comércio e até mesmo do setor de serviço. Descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses, próxima de 4,3%, o juro real atual é de mais do que de 10%.

Acorre que as taxas Selic praticadas há décadas, em média, considerando-se a taxa Selic fixada a cada reunião do Copom e a inflação dos doze meses futuro, não foram, como regra, muito menores dos 10% de juros reais explosivos da conjuntura atual.

Os juros da dívida do setor público, nessas condições foram gerando uma verdadeira “bola de neve”. A combinação de altas taxas de juro e elevado nível do estoque da dívida aconteceu sem peias.

No ranking de quem paga mais juros, atrás do Brasil vem o Sri Lanka, com 7,81% do PIB, Paquistão, com 7,76% do PIB, e Bahrein, com 6,54% do PIB. Entre países emergentes de maior peso com despesas financeiras elevadas, a lista tem o México, com 6,48% do PIB, a África do Sul, com 5,26% do PIB, e a Índia, com 5,11% do PIB.

Esses percentuais em relação ao PIB, antes de normalizar os prováveis altíssimos juros reais pagos por esses países, são mais indicadores de como o sistema financeiro internacional atua em moldes parecidos como os praticados no Brasil. As dívidas públicas são financiadas a juros escorchantes abastecendo a riqueza de uma reduzida quantidade biliardários em detrimento das nações.

Nossa dívida bruta, que terminou 2022 em 71,7% do PIB, deve encerrar 2025 em 77,6% do PIB e 2026 em 82,4% do PIB, estima a Instituição Fiscal Independente (IFI). De longe o crescimento ocorre, não por déficits primários, mas inflados pelos juros do serviço da dívida.

A MoneYou, consultoria especializada em economia e macroeconomia, publica periodicamente um Ranking Mundial das taxas de juros reais, ou seja, descontadas a inflação projetada para os próximos 12 meses (EX ANTE), do total das 40 maiores economias do mundo. Naquela divulgada em novembro deste ano podemos observar as seguintes posições, que lançam inevitáveis comparações com nossas taxas de juros.

Desse total, 36 países fazem a rolagem de suas dívidas com taxas básicas inferiores a 5% ao ano. A taxa média geral fica em 1,77% ao ano. Oito países fazem essa rolagem a taxas de juros negativas. Ou seja, aqueles que compram títulos das dívidas nesses países não conseguem uma remuneração maior do que a inflação em suas aplicações.

É o caso de Portugal -0,17% ao ano; Espanha -1,08% ao ano; Alemanha -0,40%; Japão -1,35%, mais outros quatro. Não se sabe que não consigam vender seus títulos. Na quadragésima colocação desse ranking, que quanto mais distante do topo é melhor, temos a Holanda com uma taxa negativa de -3,05%.

Países emergentes ou do Sul global são muitos com taxas de juros civilizadas. Aquelas que permitam que o endividamento dos Estados seja compatível com os benefícios que o investimento das quantias aplicadas obtém.

Temos o caso do México (3,54%); África do Sul (3,31%); Coreia do Sul (0,31%); Tailândia (2,77%); Indonésia (2,41%); Filipinas (2,09%); Colombia (3,66%), entre outros. Até a Argentina pendurada no FMI tem uma taxa básica de juros muito mais decente (5,16%).

De preferência com títulos a vencer para mais de cinco anos. Investimento de longo prazo. Que permitam com que os “lucros” das melhores condições educacionais nos cinco níveis de graduação, ou os resultados dos melhores serviços da saúde, os investimentos em infraestrutura e inovação, etc., etc., promovendo a prosperidade geral, impulsione crescimento econômico que vai gerar os recursos para pagar os juros e amortizar o principal das dívidas.

Há pelo menos 26 anos que a política econômica vigente no país obedece o chamado “Tripé” econômico e o plano de metas. Entre outros, o eixo crucial dessas políticas são os cortes de gastos. Desde o final do século passado até hoje é uma “tecla” tocada à exaustão e como se vê continua na “ordem do dia” mais uma vez. É o também conhecido arrocho fiscal.

O que os “mãos de tesoura” não dizem, apesar de desejarem, é que os orçamentos do setor público, especialmente os da União cortassem centenas de bilhões na execução do orçamento anual para que o superávit aí obtido fosse transferido para suas contas bancárias.

“Tudo bem”, se o SUS ficasse à míngua, se os professores tivessem seus salários arrochados, se a ciência e tecnologia ficasse pra trás, se o investimento público fosse a zero. De preferência que novas contra reformas trabalhistas e previdenciárias fosse feitas, que no futuro próximo todos se aposentassem pelo salário mínimo e de quebra a Petrobrás fosse privatizada.

Como tirar centenas de bilhões do orçamento e submeter a maioria da nação a um sacrifício extremo para quitar uma dívida cujo principal foi inflado pela soma por anos a fio de juros sobre juros, sem que nada concreto resultasse em efetivos benefícios? Ainda que insistam nessa senda, cobrando juros cada vez mais altos, a probabilidade de impor suas condições por muito mais tempo é improvável.

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